Félix Maier (*)
Pessoas importantes, ou que se julgam como tais, dão um jeito de morrer em uma data especial. Foi assim que ocorreu com o imperador Constantino, que se converteu ao cristianismo e possibilitou a rápida expansão da nova religião por todo o Império Romano: deu um jeito de morrer num glorioso dia de Páscoa. Com Tancredo Neves não foi diferente: marcou encontro com São Pedro justo no dia 21 de abril, data da morte de seu conterrâneo mais famoso, Tiradentes. Dizem que Tancredo já havia morrido dias antes, apenas se escolheu uma data cívica melhor para avisar a imprensa – mas isso é outra história. O certo é que Tancredo virou santo sem precisar apresentar milagres, como Santa Paulina, romarias levam as massas a seu túmulo em São João del Rey a cada feriado da Inconfidência. Já Leonel Brizola, o último dos maragatos, não escolheu nenhuma data significativa para ser levado pela Senhora da Gadanha. Foi acariciado pelas parcas, de supetão, no dia 21 de junho deste ano [2004]. Do jeito que imaginava, ainda em atividade política, pois havia profetizado “serei como um cavalo inglês: só vou morrer na cancha”. O certo é que, se tivesse que escolher uma data para chegar às canhadas do purgatório, Brizola ficaria em dúvida - 7 de setembro ou 15 de novembro? -, pois, mais nacionalista do que ele, impossível.
Quem foi, afinal, Leonel Brizola, por quem muitos brasileiros, com um lenço vermelho no pescoço, bem à moda maragata, verteram compungidas lágrimas durante o velório e promoveram uma vaia fenomenal ao “traidor” Lula da Silva quando este tentou se aproximar do defunto no Rio de Janeiro?
Antes de mais nada, Brizola simbolizava como ninguém o protótipo do anarquista espanhol, Don Pepe, que vagueia na trilogia O Tempo e o Vento, de Érico Veríssimo: “se há governo, sou contra!”. Prova disso foi o seu rápido afastamento de Lula quando este, enfim, se tornou presidente do Brasil. Não havia ninguém que fazia críticas tão ácidas quanto Brizola. Mas, afinal, o que queria o último dos maragatos? O que queria o maior de todos os nossos carbonários? Enfim, qual era o tipo de Brasil que existia na imaginação do ultranacionalista Leonel de Moura Brizola, o antiamericano número um do continente?
Brizola teve uma carreira política meteórica. Nasceu em 22 de janeiro de 1922 com o nome de Itagiba, no povoado de Cruzinha, RS, que pertenceu a Passo Fundo até 1931, quando passou à jurisdição de Carazinho. Adotou o nome do chefe maragato Leonel Rocha, passando a ser conhecido como Leonel Brizola. Em 1939, formou-se técnico agrícola no Instituto Agrícola de Viamão, próximo de Porto Alegre. Em 1945 começa a estudar engenharia civil na Universidade do Rio Grande do Sul, formando-se em 1949. Ainda em 1945, fundou o primeiro núcleo gaúcho do PTB. Um ano depois, foi eleito deputado estadual . Em 1950, Brizola foi reeleito deputado estadual do Rio Grande, e no dia 1º de março do mesmo ano casou-se com Neusa Goulart, irmã do então deputado estadual João Goulart, que viria mais tarde a ser presidente do Brasil. O padrinho foi Getúlio Vargas, que seria eleito presidente do País no dia 3 de outubro do mesmo ano. Em março de 1951, Brizola se torna líder do PTB na Assembléia Legislativa e se candidata a prefeito de Porto Alegre, porém perde por um diferença de apenas 1%, no pleito de 1º de novembro. Em 1952, foi secretário estadual de Obras Públicas do governo Ernesto Dornelles (PTB) e em 1954 elegeu-se deputado federal, com a maior votação da história gaúcha até então. Em 1955 foi eleito prefeito de Porto Alegre e, em 1958, governador do Rio Grande do Sul.
No período de 1959 a 1963, Brizola governa o Rio Grande do Sul, época em que começa a desempenhar um papel “nacionalista” de repercussão nacional. “Empossado em janeiro de 1959, criou a Caixa Econômica Estadual e adquiriu o controle acionário do Banco do Rio Grande do Sul. Criou a Aços Finos Piratini e a Companhia Riograndense de Telecomunicações e pressionou o governo federal a instalar uma refinaria no Estado. Encampou a Companhia Telefônica Rio-Grandense, uma subsidiária da ITT. No setor de educação, construiu 5.902 escolas primárias, 278 escolas técnicas e 131 ginásios e escolas normais” (http://www1.folha.uol.com.br/folha/brasil/ult96u61836.shtml).
O presidente Jânio Quadros havia entrado em atrito com os chefes militares, ao conceder a Medalha do Cruzeiro do Sul a Ernesto “Che” Guevara, em solenidade na capital brasileira. A divisão nas Forças Armadas aumentou após a renúncia de Jânio, em 1961, pois muitas autoridades militares não aceitavam a posse do vice, João Goulart, o “Jango”, visto como “comunista”. Na ocasião, “Jango” estava em viagem à China comunista, acompanhado de “líderes trabalhistas, convocados para observação e estudo das comunas populares daquele país” (AUGUSTO, 2001: 70). Na China, “Jango” fez “um pronunciamento radical, em que revelou sua intenção de estabelecer também no Brasil uma república popular, acrescentando que, para tanto, seria necessário contar com as praças para esmagar o quadro de oficiais reacionários” (AUGUSTO, 2001: 71) – prenúncio da Revolta dos Sargentos, em Brasília, em 1963, e da Revolta dos Marinheiros, no Rio de Janeiro, em 1964.
Em manifesto à nação, os ministros militares afirmaram o perigo que representaria um governo chefiado por Goulart: “As próprias Forças Armadas, infiltradas e domesticadas, transformar-se-iam, como tem acontecido noutros países, em simples milícias comunistas” (TAVARES, 1977: 65). Porém, o Marechal Henrique Teixeira Lott, “candidato derrotado à presidência da República, tendo Goulart como companheiro de chapa, lançou um manifesto exigindo que a presidência fosse assegurada ao vice-presidente eleito, conforme previa a Constituição” (AUGUSTO, 2001: 71). A candidatura Lott havia surgido da “Novembrada” (11/11/1956), durante o Governo Juscelino Kubitschek, quando o vice João Goulart entregou uma “espada de ouro” ao Marechal Lott, em uma homenagem que seria, aparentemente, o de “promover um grande movimento de caráter populista de solidariedade ao Exército, embora com o propósito oculto de sensibilizar, apenas, uma parte dele” (TAVARES, 1977: 31). Ou seja, criar a figura do “general do povo”, que durante o Governo Goulart teve outros adeptos fervorosos.
Para defender a posse de João Goulart, Brizola criou a Rede da Legalidade. “No Rio Grande do Sul, o Governador Leonel Brizola, cunhado de Goulart, mobilizou a Brigada Militar, ganhou o apoio do comandante do III Exército, General Machado Lopes, e lançou um movimento legalista pela posse de Jango, que se estendeu a todo o País” (AUGUSTO, 2001: 71). Como recentemente se pôde observar, tanto nos jornais como na TV, durante os funerais de Brizola, comentaristas consideram essa ação do maragato como o de mais alto prestígio em toda sua carreira política.
A solução encontrada para o impasse foi o parlamentarismo, aceito por Jango. Porém, o seu Partido Trabalhista, com a força de Leonel Brizola e a mobilização do Comando Geral dos Trabalhadores (CGT) e do Partido Comunista Brasileiro (PCB), consegue reverter a situação, e a 6 de janeiro de 1963 é restabelecido, por plebiscito popular, o sistema presidencialista.
Um mês após a posse de Jango, que ocorreu no dia 7 de setembro de 1961, Leonel Brizola e Mauro Borges, governador de Goiás, lançam a Frente de Libertação Nacional (FLN). A Frente enfatizava a ação exploradora dos capitais estrangeiros e a necessidade de nacionalização de empresas e efetivação da reforma agrária. Nacionalista, o “Manifesto de Goiânia” proclamava que “não seremos colônia dos EUA, nem satélite da URSS”. Compareceram ao ato o Prefeito de Recife, Miguel Arraes, os deputados Francisco Julião, Barbosa Lima Sobrinho e outros esquerdistas. Brizola, com anseios de se tornar o Fidel Castro sul-americano, pretendia criar um grupo armado, o que levou o jornal New York Time a considerá-lo a maior ameaça aos interesses dos EUA depois da Revolução Cubana. Com o major do Exército (cassado), Joaquim Pires Cerveira, durante o período de governo militar, a Frente agregou remanescentes do Movimento Revolucionário 26 de Março (MR-26) - que viria a ser extinto em 1969 -, promovendo ações terroristas no Rio Grande do Sul e no Rio de Janeiro, em conjunto com a Ação Libertadora Nacional (ALN), de Carlos Marighela, e a Vanguarda Popular Revolucionária (VPR), de Carlos Lamarca. A Frente brizolista foi extinta em 1970, com a prisão de Cerveira.
Durante sua gestão no Rio Grande do Sul, além do nacionalismo xenófobo demonstrado na encampação da ITT americana, Brizola investe no populismo a la Getúlio Vargas, vergastando as elites rurais e endossando as ações do Movimento dos Agricultores Sem-Terra (Master), criado por Rui Ramos - uma aclimatação das Ligas Camponesas de Francisco Julião nos pampas gaúchos.
O “general do povo” Osvimo Ferreira Alves, comandante do I Exército, é simpático ao PCB e às idéias nacionalistas de Brizola. Este, populista de feições caudilhescas, encorajado pelo abrigo à sombra do quepe do general, reúne-se com 150 sargentos e realiza uma mobilização popular para fechar o Congresso; Goulart seria afastado, caso se opusesse. O presidente, porém, consegue evitar o golpe do carbonário gaúcho, que sonhava ser o Fidel Castro brasileiro, e começa o desmonte do esquema dos militares ligados a Brizola.
Como se pode comprovar, o “legalista” de véspera, que havia defendido a posse de Jango, deixou de sê-lo repentinamente, para se converter em um fanático golpista pronto a derrubar o próprio cunhado. (“Cunhado não é parente” era um dos muitos motes repetidos por Brizola.)
Eram tumultuados aqueles anos em que o carbonário Leonel “Don Pepe” Brizola se especializou em apagar incêndios com gasolina. Os agora chamados “anos de chumbo” dos governos militares foram precedidos por uma febril convulsão política e social. Em 24 de novembro de 1961, são restabelecidas relações diplomáticas com a URSS. Há uma aproximação de Jango com os comunistas, e o PCB conquista a presidência da poderosa Confederação Nacional dos Trabalhadores na Indústria (CNTI). Vale a pena lembrar o que ocorreu em 1963 e 1964, antes de os militares darem um fim à dupla baderneira Jango-Brizola.
Com o restabelecimento do presidencialismo, em 1963, cresce a subversão comunista no Brasil, com a infiltração de militantes nos ministérios. Há propaganda soviética generalizada nos jornais e livrarias. As invasões de terra aumentam no Brasil, fomentadas pelas Ligas Camponesas, que abatem gado e incendeiam canaviais em Pernambuco, com o apoio tácito do Governador Miguel Arraes. Greves políticas começam a pipocar por todos os cantos, há desabastecimento de gêneros de primeira necessidade, agravado por uma terrível seca. Míngua a entrada de capital estrangeiro no País. O Comando dos Trabalhadores Intelectuais congrega nomes da cultura nacional, como Barbosa Lima Sobrinho, Dias Gomes, Enio Silveira, Jorge Amado.
Em fevereiro de 1963, cerca de 6.000 sargentos, cabos e soldados realizam passeata em São Paulo, em apoio à posse dos companheiros de farda eleitos. Em março, é realizado em Niterói, RJ, o Encontro de Solidariedade a Cuba, pois o Governador da Guanabara, Carlos Lacerda, havia proibido o encontro no seu Estado, antigo Distrito Federal.
O Instituto Superior de Estudos Brasileiros (ISEB), dominado por intelectuais marxistas, atrai subtenentes e sargentos, apresentando cursos e palestras de doutrinação comunista. “... o trabalho de aliciamento nas Forças Armadas se concentraria sobre os graduados, por serem em maior número e, na sua maioria, menos preparados para resistir ao assédio dos profissionais do Partido Comunista. (...) O jornal esquerdista ‘O Semanário’ dava cobertura a essas atividades, vinculando os subtenentes e sargentos à campanha nacionalista” (AUGUSTO, 2001: 103).
Em julho de 1963, nas comemorações do aniversário do general Osvino, então comandante do III Exército, reuniram-se em Porto Alegre cerca de 800 subtenentes e sargentos das Forças Armadas e da Brigada Militar do Rio Grande do Sul, para fazer afagos ao velho “general do povo”.
Em 6 de março de 1963, houve uma passeata de militares em São Paulo, exigindo a posse dos sargentos eleitos. Militares da Aeronáutica e da Força Pública compareceram fardados. “À mesa diretora sentaram-se os comunistas Rio Branco Paranhos, Geraldo Rodrigues dos Santos, José da Rocha Mendes Filho, Mário Schemberg, Luiz Tenório de Lima, Oswaldo Lourenço e o General reformado Gonzaga Leite, um dos organizadores do Congresso Continental de Solidariedade a Cuba” (AUGUSTO, 2001: 104).
As críticas e reivindicações populares dos militares de baixa patente aumentam de tom. “Em Fortaleza, o sargento-deputado Garcia Filho afirmou que, se não houvesse uma decisão favorável à posse dos eleitos, a Justiça Eleitoral seria ‘fechada’. Pregou ‘o enforcamento dos responsáveis pela tirania dos poderes econômicos’ e rotulou a instituição militar de ‘nazista’ ” (AUGUSTO, 2001: 105).
A 12 de setembro de 1963, há uma rebelião de sargentos em Brasília: sargentos da Marinha e da Força Aérea, liderados pelo sargento da Força Aérea, Antonio Prestes de Paula, “apossam-se sucessivamente do Ministério da Marinha, da Base Aérea, da Área Alfa (da Companhia de Fuzileiros Navais), do Aeroporto Civil, da Estação Rodoviária e da Rádio Nacional” (AUGUSTO, 2001: 106). Os revoltosos prenderam um ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) e o presidente da Câmara Federal. Na tentativa de invasão do Ministério da Aeronáutica, um marinheiro foi morto a tiro. À tarde os revoltosos já haviam sido presos.
No dia 4 de outubro de 1963, Castello Branco, Chefe do Estado-Maior do Exército (EME), enviou documento ao Ministro da Guerra, assinalando a necessidade de providências sobre “a ação ilegal, inclusive subversiva, do Comando Geral dos Trabalhadores, a agitação insurrecional promovida pelo Deputado Leonel Brizola, a conexão de atividades de políticos com o motim de Brasília e os abusos do poder econômico” (TAVARES, 1977: 76). Na mesma ocasião, Castello mostrou-se contrário ao Estado de Sítio pleiteado por Goulart, para implantação de suas “reformas de base”.
Sua experiência no Comando do Exército no Nordeste – onde teve atritos com o governador Miguel Arraes – deu a Castello “visão segura de como as injustiças sociais, crônicas e chocantes, eram premeditadamente agravadas para fins políticos. Em vez de medidas construtivas, para proteger os interesses dos homens da lavoura contra a exploração dos senhores de engenho, o caminho adotado foi de mobilizá-los como agentes da subversão, alguns treinados em Cuba, para a agitação na área rural, a depredação de propriedades e os incêndios de canaviais. (...) Em Anápolis (Goiás) já funcionava, a essas alturas, um centro de treinamento para guerrilhas rurais” (TAVARES, 1977: 80).
O lado subversivo tinha uma “frente” bastante ampla para subversão das “massas”, além do PCB e da dupla Jango-Brizola: a Ação Popular (AP) atuava por meio do Movimento de Educação de Base (MEB); a União Nacional de Estudantes (UNE), por meio de seu Centro Popular de Cultura; a União dos Lavradores e Trabalhadores Agrícolas do Brasil (ULTAB), com atuação em vários Estados; e o próprio Ministério da Educação e Cultura (MEC), com as Secretarias de Educação dos Estados, por intermédio da Comissão de Cultura Popular.
Para a formação do “homem novo”, a história também deve ser “nova”. A Coleção História Nova surgiu durante o governo Goulart, na “Campanha de assistência ao estudante”, do MEC, em que os livros tradicionais de história foram reformulados e os fatos interpretados sob a ótica marxista. O MEC editou também a cartilha “Viver é lutar”, reconhecida pela Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB), para a alfabetização rural – ou seja, alfabetização marxista. A Rádio Ministério da Educação (Rádio da Verdade) era utilizada para propaganda comunista. Nada mais que o Pravda (“Verdade”, em russo) em ação.
Além dessas organizações, havia a disseminação no Brasil dos chamados “folhetos cubanos”, distribuídos pelo Movimento de Educação Popular (MEP), que serviam de inspiração às ações revolucionárias das Ligas Camponesas, de Francisco Julião, e aos Grupos dos Onze, de Brizola. Em tudo havia o dedo de Fidel Castro e sua Revolução Cubana: “As tentativas revolucionárias de inspiração cubana em vários países da América Latina – contrárias à linha política do PCB –, iniciadas na década de 1960 em Honduras, Guatemala, Nicarágua, Venezuela, Peru, Colômbia, Argentina e Equador, se haviam esgotado no nascedouro ou estavam derrotadas no final de 1963” (AUGUSTO, 2001: 121). Com exceção, sabe-se hoje, da Colômbia, onde as Forças Armadas Revolucionárias da Colômbia (FARC) já atuam por mais de 40 anos e acarretaram a morte de dezenas de milhares de patrícios.
A reação ao estado de desordem que prosperava no País, com a complacência do presidente da República, começou a surgir de todos os lados. O apoio à democracia era exigido pela imprensa: os principais jornais do Brasil pediam o fim dos movimentos baderneiros, como os Diários Associados, O Estado de S. Paulo, Jornal da Tarde, Tribuna da Imprensa, O Globo, Jornal do Brasil. Organizações civis, encabeçadas por empresários e intelectuais, passaram a promover encontros, desde o final do Governo Kubitschek, para combater a infiltração comunista, que pregava propaganda esquerdista e a estatização da economia. Assim, no final de 1961, foi criado o Instituto de Pesquisa e Estudos Sociais (IPES). Têm ainda grande influência na reação à progressão comunista o Instituto Brasileiro de Ação Democrática (IBAD), formado também por empresários e intelectuais, e a Campanha da Mulher pela Democracia (CAMDE), que surge no Rio de Janeiro em 1962, reunindo donas de casa e esposas de líderes sindicais, funcionários públicos e militares. Essas organizações produziam literatura própria e tinham ramificações em várias cidades do País. A “cruzada democrática” se amplia: no movimento sindical, com a atuação do Movimento Sindical Democrático (MSD); no campo, com o Serviço de Orientação Rural de Pernambuco (SORPE) que, junto com o IBAD, “atuava naquela área, contrapondo-se ao método de alfabetização de Paulo Freire” (AUGUSTO, 2001: 118).
O IPES, o IBAD, a CAMDE e as Forças Armadas formaram a base quadrangular decisiva para o desencadeamento da Contrarrevolução de 31 de março de 1964, contra Jango e Brizola, em sua política de implantar a “República Sindicalista” no Brasil.
Em janeiro de 1964, Luiz Carlos Prestes viajou a Moscou para prestar contas dos últimos trabalhos do PCB, desenvolvidos à luz da estratégia traçada por ele e Kruschev em novembro de 1961. Nesse encontro, participaram, além de Kruschev, Mikhail Suslov (ideólogo de Kruschev), Leonid Brejnev (Secretário do Comitê Central do Partido), Iuri Andropov e Boris Ponomariov (Chefe do Departamento de Relações Internacionais). Naquela ocasião, Prestes afirmou: “A escalada pacífica dos comunistas no Brasil para o poder abrindo a possibilidade de um novo caminho para a América Latina. (...) ... oficiais nacionalistas e comunistas dispostos a garantir pela força, se necessário, um governo nacionalista e anti-imperialista. Implantaremos um capitalismo de Estado, nacional e progressista, que será a antessala do socialismo. (...) ... uma vez a cavaleiro do aparelho do estado, converter rapidamente, a exemplo de Cuba de Fidel, ou do Egito de Nasser, a revolução nacional-democrática em socialista” (AUGUSTO, 2001: 121-2).
Em fevereiro de 1964, foi realizada em Belo Horizonte a “Marcha do Terço”, pelos padres Peyton e Botelho e por várias organizações femininas patrocinadas pelo IPES. A Marcha condenou Leonel Brizola publicamente como “Anticristo”. Também havia condenado o Governo de João Goulart e pedido uma intervenção militar.
No dia 13 de março de 1964, há um comício das esquerdas na Praça da República, ao lado da estação ferroviária da Central do Brasil e do próprio Ministério da Guerra. Como se sabe, a capital da República havia sido transferida para Brasília, em 1960, porém muitos ministérios ainda permaneciam na antiga capital, Rio de Janeiro. Esse o motivo, também, dos vários comícios das esquerdas no Rio, com a presença do presidente Goulart e do deputado Brizola. “Dezenas de faixas e cartazes conclamavam às reformas, à legalização do Partido Comunista e à entrega ao povo de armas para a luta. No palanque, ao lado dos principais líderes sindicais e comunistas, alguns deles membros do Comitê Central do PCB, alinhavam-se Jango, Arraes e Brizola. Emissoras de rádio e televisão transmitiam para todo o País os inflamados discursos que se sucediam, preparatórios da fala do presidente” (AUGUSTO, 2001: 125-6).
A 25 de março, ocorre a rebelião dos marinheiros no Rio de Janeiro, que “foi a gota d’água que congregou os militares e os levou à decisão de partirem para a ação” (AUGUSTO, 2001: 128). Na mesma data, ocorre a reunião festiva do 2º aniversário da Associação de Marinheiros e Fuzileiros Navais do Brasil (AMFNB), uma entidade criada à revelia dos regulamentos militares. O marinheiro Anselmo critica as autoridades navais e conclama o povo a derrubar a “estrutura anacrônica do País, onde apenas os grupos privilegiados absorvem a riqueza que por direito pertence ao povo” (AUGUSTO, 2001: 128-9). Na mesma ocasião, foi aprovada uma proposta para que todos permanecessem no local até que fossem canceladas punições disciplinares contra militares e que os “almirantes gorilas” fossem substituídos por “almirantes do povo”. A indisciplina chegou ao ápice quando os marinheiros amotinados, desuniformizados, exibindo faixas de apoio do CGT, da Liga Feminina e dos Trabalhadores Intelectuais, saíram em passeata pela Avenida Presidente Vargas até a Igreja da Candelária, levando nos ombros os almirantes Aragão e Suzano.
No dia 30 de março, ocorre uma reunião na sede do Automóvel Clube, em comemoração do aniversário da Associação dos Subtenentes e Sargentos da Polícia Militar do Rio de Janeiro. “A reunião contou com a presença de centenas de sargentos da polícia e também de graduados recrutados nas Forças Armadas. Compareceram ainda diversos oficiais e ministros, entre eles o Almirante Paulo Mário, recém-empossado como Ministro da Marinha. Dezenas de comunistas confraternizaram-se com os militares. A manifestação atingiu o seu clímax no momento em que se abraçaram, sob os aplausos gerais, o Almirante Aragão e o cabo Anselmo” (AUGUSTO, 2001: 132). Jango, falando em nome do povo e das Forças Armadas e “incentivado pelos constantes aplausos, fez um dos discursos mais inflamados de sua vida pública” (AUGUSTO, 2001: 132) – na verdade, o último como presidente da República. Segundo Luís Mir, em “A Revolução Impossível”, “a exemplo de 1935, a revolução deveria começar, novamente, pelos quartéis.” (cfr. AUGUSTO, 2001: 121).
No dia 31 de março, as Forças Armadas brasileiras, com o Exército à frente, colocaram uma pá de cal no sonho dos comunistas de implantar uma “ditadura do proletariado” no País. A Contrarrevolução teria cinco generais-presidentes e se estendeu até 1985, quando o senador José Sarney assumiu a presidência da República devido à morte de Tancredo Neves, eleito presidente em eleição indireta.
Com altos e baixos, o governo dos militares tirou o País da 46ª posição e o colocou entre as 8 primeiras economias do mundo. (Em 20 anos de “Nova República”, porém, caímos para a 15ª posição, e a Rússia deverá nos ultrapassar em 2005. Caímos três posições somente nos 12 meses de governo Lula da Silva e seu propalado “espetáculo do crescimento”). O “milagre brasileiro” foi detido pelas crises do petróleo de 1973 e 1979. Se não houvesse o monopólio da Petrobrás, fruto de nacionalismo estúpido, quem sabe, àquela época já seríamos autossuficientes, como a Argentina havia se tornado em apenas 5 anos, e a história econômica brasileira poderia ter tomado outro rumo. Outra grande obra dos militares foi a erradicação dos grupos terroristas que infernizavam o Brasil, os quais tinham orientação e apoio financeiro de Havana, Moscou e Pequim. Não fosse a enérgica ação das Forças Armadas, quem sabe, ainda hoje estaríamos, como a Colômbia, combatendo as Forças Armadas Revolucionárias Brasileiras (FARB) nas matas de Xambioá.
Os erros básicos dos militares foram: o gigantismo estatal; a tomada de dinheiro no exterior a juros flutuantes; o descuido com a educação básica – o que não ocorreu com os “tigres asiáticos”, como Coréia do Sul, Taiwan, Cingapura e Malásia -; a Lei da Reserva de Informática, que atrasou o ingresso brasileiro no mundo digital em pelo menos 20 anos; a não assinatura do Tratado de Não-Proliferação Nuclear (TNP) – nem fabricamos a bomba, nem recebemos o supercomputador dos yankees –; enfim, o nosso eterno nacionalismo burro e a xenofobia obsessiva atrasaram a entrada efetiva de nosso País no processo de globalização, iniciado tardiamente no governo Collor de Melo.
Mas esse é outro assunto, para os economistas dissecarem, não para a análise da trajetória de Don Pepe que estamos fazendo neste trabalho. Voltemos, pois, ao maragato dos pampas.
Quando estourou a Contrarrevolução de 31 de março de 1964, Brizola tentou comandar a resistência aos militares a partir do Rio Grande do Sul. Por rádio, incitou os sargentos das Forças Armadas a prender todos os oficiais nos quartéis e seqüestrar todo o armamento e munição. Se dependesse de Brizola, o Brasil teria iniciado uma guerra civil sangrenta. Jango, ao contrário, talvez demonstrando um gesto de grandeza, ou de simples realismo, ou ainda, quem sabe, em um raro momento de lucidez não-etílica, preferiu sair do País a ver um derramamento de sangue entre brasileiros. E tinha razão, pois não houve nenhum candidato a dar um tiro sequer para defender a insânia do carbonário gaúcho.
Até mesmo Márcio Moreira Alves, parlamentar de oposição ao novo Governo, foi a favor dos atos de Castello Branco, como afirma em seu livro "O Despertar da Revolução Brasileira", em que aborda o violento discurso que proferiu na Câmara dos Deputados contra os militares, que teria sido o estopim do Ato Institucional nº 5 (AI-5), em 13 de dezembro de 1968: “O protesto que escrevi era uma crítica por dentro. De um modo geral era eu simpático ao governo militar” (pg. 50). Para “Marcito”, foi um alívio ver a saída de Jango, pois 'achava-o oportunista, instável, politicamente desonesto... Aparecia bêbado em público, deixava-se manobrar por cupinchas corruptos... e tinha uma grande tendência gaúcha para putas e farras' "(op. cit., pg. 51 e 52).
Com a deposição de Jango, o Brasil passou a conhecer um pouco mais sobre Brizola. O maragato havia criado, em 1963, os Grupos dos Onze (G-11), ou Grupo dos Onze Companheiros, na verdade, “comandos nacionalistas”, que seriam o embrião de um futuro Exército Popular de Libertação (EPL). Um documento do Grupo afirmava que os G-11 seriam a “vanguarda do movimento revolucionário, a exemplo da Guarda Vermelha da Revolução Socialista de 1917 na União Soviética”. (Prova a ignorância de Brizola, pois em 1917 havia apenas a Rússia, não a URSS.) “... os reféns deverão ser sumária e imediatamente fuzilados, a fim de que não denunciem seus aprisionadores e não lutem, posteriormente, para sua condenação e destruição”. Havia centenas desses Grupos espalhados em todo o País e tinham como missão eliminar fisicamente todas as autoridades do Brasil – civis, militares e eclesiásticas, como se pode ler nas “Instruções secretas” do EPL e seus G-11, no item 8, “A guarda e o julgamento de prisioneiros”: “Esta é uma informação para uso somente de alguns companheiros de absoluta e máxima confiança, os reféns deverão ser sumária e imediatamente fuzilados, a fim de que não denunciem seus aprisionadores e não lutem, posteriormente, para sua condenação e destruição” (AUGUSTO, 2001: 112).
No site antiterrorista Ternuma (Terrorismo Nunca Mais), lê-se: “No início de 1964, Brizola lançou seu próprio semanário, ‘O Panfleto’, que veio se integrar à campanha agitativa já desenvolvida pela cadeia da Rádio Mairink Veiga.
Em seus sonhos quixotescos, distribuiu diversos outros documentos para a organização dos G-11, tais como as ‘Precauções’, os ‘Deveres dos Membros’, os ‘Deveres dos Dirigentes’, um ‘Código de Segurança’ e fichas de inscrição para seus integrantes.
Chegou a organizar 5.304 grupos, num total de 58.344 pessoas, distribuídas, particularmente, pelos Estados do Rio Grande do Sul, Guanabara, Rio de Janeiro, Minas Gerais e São Paulo” (http://www.ternuma.com.br/brizola.htm). [Atualmente, o site está inoperante.]
Sem ter ninguém para segui-lo no enfrentamento armado, Brizola fugiu para o Uruguai, dizem que vestido de mulher, onde ficou exilado até 1977, fugindo para Portugal depois que o país platino foi também tomado pelos militares.
No Uruguai, Brizola tentou criar vários movimentos de “libertação” do Brasil. Em janeiro de 1965, foi realizada no Uruguai a unificação de diversos grupos de esquerda, para formar uma “frente revolucionária”, que seria desencadeada no Brasil pelos “Grupos dos 5” (Comitês instalados nas empresas e comitês rurais). O chamado Pacto de Montevidéu foi assinado por Leonel Brizola, Max da Costa Santos, José Guimarães Neiva Moreira, Darcy Ribeiro e Paulo Schilling, além de representantes do Partido Comunista do Brasil (PC do B), da AP (Aldo Arantes), do PCB (Hércules Correia dos Reis) e do Partido Operário Revolucionário Trotskista (PORT) (Cláudio Antônio Vasconcelos Cavalcante). Denominada de Frente Popular de Libertação (FPL), os “atos de guerra” deveriam incluir sabotagem urbana e guerrilha no campo. A maioria dos integrantes da FPL era formada por ex-militares cassados das Forças Armadas e da Brigada Militar do Rio Grande do Sul. A única sabotagem, malsucedida, foi em um bueiro da antiga BR-2, próximo a Jaguarão, RS, com o apoio de um ex-soldado do 13º Regimento de Cavalaria, de nome Ponciano, que trabalhava com explosivos em uma firma de Jaguarão.
Brizola era o líder idealizado por Fidel Castro para a Revolução no Brasil, devido a seu “nacionalismo anti-imperialista”, ou seja, sentimento antiamericano. Após a Contra-revolução de 1964, por intermédio de Lélio Telmo de Carvalho, o grupo de Brizola no Uruguai obteve ajuda de Cuba: treinamento de guerrilha e auxílio financeiro de mais de 1 milhão de dólares. O primeiro “pombo-correio” enviado a Cuba foi Herbert José de Souza, o “Betinho”, seguido de Neiva Moreira e do ex-coronel do Exército, Dagoberto Rodrigues (na Tricontinental, Brizola havia enviado Aloísio Palhano, ex-membro do CGT). Pressionado por Cuba, para justificar os recursos financeiros, Brizola, João Goulart e outros exilados no Uruguai criaram em 1966 o Movimento Nacionalista Revolucionário (MNR), para implantar a guerrilha no campo. O MNR articulou a Guerrilha do Caparaó, na região do Pico da Bandeira, em Minas Gerais, onde todos os integrantes foram presos em 1967, depois de serem denunciados às autoridades, por abaterem reses, antes mesmo de desencadear qualquer tipo de ação terrorista. Brizola não contratou advogados para os presos e não prestou conta dos dólares cubanos. Os remanescentes desse grupo uniram-se à esquerda da Organização Revolucionária Marxista Política Operária (POLOP) para criar a Vanguarda Popular Revolucionária (VPR).
As Forças Armadas de Libertação Nacional (FALN) foram outro movimento criado pelo brancaleone dos pampas. O plano previa um movimento (coluna) que sairia do Rio Grande do Sul, sob comando do ex-coronel do Exército, Jefferson Cardim Osório, para juntar-se no Mato Grosso com outra coluna que viria da Bolívia, sob comando do ex-coronel da Aeronáutica, Emanuel Nicoll. Os comandados do Cel Jefferson assaltaram alguns postos policiais da Brigada Militar, levando um automóvel, fardamentos e munição, além de realizarem um assalto a um agência do Banco do Brasil. Atravessaram Santa Catarina e penetraram no Paraná; no município de Leônidas Marques, no dia 27 Mar 1965, os rebeldes prepararam uma emboscada a uma viatura do Exército, porém foram repelidos pelos militares, fugindo para o mato e depois capturados. Na operação, morreu o 3º sargento Carlos Argemiro Camargo. O ex-sargento da Brigada Militar, Albery Vieira dos Santos, um dos integrantes das FALN, declarou em 1978 que o dinheiro para financiar a operação – 1 milhão de dólares – havia sido conseguido em Cuba e levado a Brizola por Darcy Ribeiro e Paulo Schilling; em fevereiro de 1979, o ex-sargento Albery foi misteriosamente assassinado. O Cel Jefferson só veio a falecer em 1995, embora o livro “A Esquerda Armada no Brasil” (título original de “Los Subversivos”, editado pela Casa de las Americas, de Havana) afirme que o Cel Jefferson foi torturado até a morte em 1971. Como sempre, os comunistas - ou socialistas, se assim preferir o leitor, dá na mesma – são mestres na arte do assassinato, da desinformação e da mentira.
As ações quixotescas de “L’Armata Brizoleone” (uma alusão ao “Fantástico Exército de Brancaleone”, filme de Mario Monicelli, com Vittorio Gassman) e seu escudeiro Darcy “Sancho Pança” Ribeiro estão muito bem descritas por F. Dumont em https://felixmaier1950.blogspot.com/2022/02/os-incriveis-exercitos-de-brizoleone.html. Deve ser por isso que o líder do PSDB no Senado, Arthur Virgílio, afirmou que Brizola foi sempre seu “herói de capa e espada” (Correio Braziliense, 22/06/2004, seção “Política”, pg. 4). Sabia-se, pelos jornais, que Brizola teria desviado 100 mil dólares enviados por Cuba. Betinho, que mais tarde viria a ser a Madre Teresa dos coitadinhos do Brasil, porém, em depoimento ao Jornal do Brasil, em 17/07/1996, afirma que foram 200 mil. Ironicamente, Brizola, que tinha o hábito de colocar apelidos em seus adversários, como “sapo barbudo” para se referir a Lula, ou “filhote da ditadura” para atazanar Fernando Collor, recebeu o devastador apelido de “el ratón” de Fidel Castro. Está explicado por que, nestes anos todos, nunca se viu uma foto do Abutre do Caribe conversando com Don Pepe de los Pampas.
No início de 1979, o último dos maragatos lançou a Carta de Lisboa, base do futuro Partido Democrático Trabalhista (PDT). Brizola criou esse novo partido em 1981, depois de perder para Ivete Vargas, sobrinha de Getúlio, a sigla PTB. Depois da Lei da Anistia, em 1979, além da recriação do PTB e do nascimento do PDT, destaca-se a criação do PMDB (oriundo do antigo MDB, de oposição) e do PDS (substituto da Arena, partido de apoio aos governos militares).
Convém lembrar que o Projeto de Anistia, proposto pelo PMDB e PDS durante o Governo Figueiredo, era mais restrito do que o apresentado pelo próprio Governo, pois “deixara de fora importantes líderes como Prestes, Brizola e Arraes. Naturalmente, não desejavam a concorrência desses líderes na vida política do país” (AUGUSTO, 2001: 460 e 461).
De volta ao Brasil, Brizola recomeça sua vida política, em campanha para governador do Rio de Janeiro. São tempos ainda conturbados, com ações terroristas de direita, inconformada com a abertura política iniciada por Geisel. No dia 18 de janeiro de 1980, foi desativada uma bomba no Hotel Everest, no Rio de Janeiro, onde estava hospedado Leonel Brizola. “Na noite de 30 de abril de 1981, durante um show de música popular para 20 mil jovens, uma bomba explode dentro de um automóvel que manobrava no estacionamento do Riocentro, na Barra da Tijuca. Morto no seu interior o Sargento Guilherme Pereira do Rosário; gravemente ferido abandona o veículo semidestruído o Capitão Wilson Luís Chaves Machado, ambos do Destacamento de Operações de Informações do 1º Exército sediado no Rio de Janeiro. Minutos depois outra bomba, mais poderosa, é lançada e explode próximo à casa de força do Riocentro. Como não atinge o seu alvo, não provoca a escuridão geral que certamente ocasionaria o pânico no recinto fechado do show, com consequências fáceis de se imaginar” (GRAEL, 1985: 81).
Antes do Atentado do Riocentro, nos anos de 1980 e 1981, durante 16 meses, houve 40 atentados diversos contra Órgãos que faziam oposição ao governo Figueiredo – incluindo o atentado contra Brizola, citado acima. Nenhum desses atentados foi elucidado por Figueiredo, que passou a ser, desde o caso do Riocentro, um cadáver político.
Em 1982, Brizola elege-se governador do Estado do Rio de Janeiro, em disputa polêmica, só solucionada depois de ser descoberta a fraude: “um programa adulterado lançava parte de seus votos para os concorrentes” (Correio Braziliense, 22/06/2004, seção “Política”, pg. 5). O espalhafatoso maragato dos pampas estava de volta à luta para decepar as cabeças dos chimangos que existiam somente em sua imaginação.
Em seu primeiro governo fluminense, Brizola fez algumas coisas úteis, como a construção dos Centros Integrados de Educação Pública (CIEPs) e do “Sambódromo. O resto foi um desastre só, como a encampação de linhas de ônibus e a entrega dos morros cariocas aos traficantes de armas e drogas, know-how depois exportado para São Paulo e outras grandes cidades brasileiras com grande sucesso.
A idéia dos CIEPs era formidável. Nessa invenção de Darcy Ribeiro, concretizada por Oscar Niemayer, as crianças permaneceriam na escola em tempo integral. Além das disciplinas escolares, teriam tempo para usufruir da biblioteca local, para os “trabalhos de casa”, além de quadras para a prática de esportes. Coisa de primeiro mundo. Porém, a verba era curta e a construção dos prédios imponentes, muito cara. Da boa idéia brizolista nasceram uns poucos CIEPs, colocados estrategicamente à beira das avenidas mais conhecidas, como a Avenida Brasil, e na entrada de algumas favelas. Os adversários políticos tinham razão em afirmar que se tratava de uma mera jogada de marketing.
Não faltaram, nem faltam, imitadores de Brizola. Collor tentou dar continuidade aos CIEPs, porém chegou apenas a construir meia dúzia desses elefantes brancos, aos quais deu o nome de Centro Integrado de Apoio à Criança (CIAC). Itamar Franco, que o substituiu depois do impeachment, emplacou alguns Centros de Atendimento Integral à Criança (CAICs). E, hoje, Marta Suplicy impressiona os incautos com seus faraônicos Centros Educacionais Unificados (CEUs). Como se vê, ninguém neste País dá continuidade a um projeto iniciado por outro político. Se dá, logo muda de nome, como ocorre no momento com o “Fome Zero” de Lula da Silva, baseado em programa semelhante iniciado por Fernando Henrique Cardoso. É a síndrome de Macunaíma, a ética da esculhambação nesta Terra dos Papagaios. Infelizmente, não deu certo a idéia de Darcy Ribeiro em fazer avançar a educação brasileira, que continua a avançar como caranguejo.
O “Sambódromo” foi outra obra importante e necessária feita por Brizola. A cada carnaval, firmas contratadas levavam uns dois meses para montar a estrutura e outros dois meses para desmontar. Gastava-se uma fortuna e nada ficava no lugar. Com a construção do “Sambódromo”, a obra ficou perene e ainda abriga salas de aulas embaixo das arquibancadas, além de servir para shows diversos, especialmente na Praça da Apoteose.
Hoje, é ponto pacífico (exceto entre os pedetistas) que os dois governos Brizola favoreceram a propagação do tráfico de drogas e armas no Rio de Janeiro. A respeito do assunto, é importante transcrever o que Sebastião Nery escreveu em 1988:
“Noriega-Brizola
Sebastião Nery
Tribuna da Imprensa – Set 1988
1. SALVADOR. Na semana passada, em Brasília, fui jantar em casa de uns amigos e lá encontrei um grupo de importantes oficiais da ativa do Exército: generais, coronéis, majores. A conversa começou pelas eleições deste ano, passou para a sucessão presidencial e daí a pouco estava na gravíssima e dramática penetração do tráfico internacional de drogas no Brasil e sua ligação com políticos brasileiros. De repente me vi dentro de uma sabatina. Eles queriam saber qual a verdadeira medida da ligação de Brizola com o crime organizado no Rio: jogo do bicho, cocaína, ferro-velho, ouro fundido, prostituição, etc. Entrei na madrugada fazendo uma análise minuciosa, detalhada, do problema e mostrando como Brizola substituiu conscientemente, estratégicamente, a representação política nas favelas e subúrbios do Rio, tirando os velhos líderes tradicionais do fisiologismo chaguista, que trocavam votos por empregos, assistencialismo, força política e pondo no lugar deles os poderosos chefes do tráfico de drogas que Brizola chama de “cinturão popular para derrotar as elites urbanas”.
2. MILITARES – Os oficiais do Exército ficaram perplexos. Eles tinham dados, conheciam os fatos, estavam preocupados, mas ainda não tinham feito uma análise política e sociológica do processo. Mostrei-lhes que o poder político sempre foi uma transferência de representação. No interior, no Nordeste, os coronéis são o braço social e político do poder estadual. Os governadores governam ainda hoje através dos líderes do interior, muitos deles de tradicionais famílias. Comandam pelo assistencialismo, pelo fisiologismo, pela troca de voto por poder administrativo. É um velho vicio do concentrado poder político do país. Mas de qualquer forma esses “coronéis” são legais, representam suas comunidades, defendem a seu modo os interesses da população, conseguem estradas, escolas, melhorias e empregos públicos. Nas grandes cidades, os coronéis são de famílias ou líderes que dominam tradicionalmente os subúrbios, as favelas. No Rio, eram ou são os Mesquita em Jacarepaguá, os Fernandes em Santo Cristo, Jorge Leite em Madureira, Armando Fonseca na Rocinha, etc. Um método antigo e viciado de fazer política. Mas, de qualquer forma legal, eles se elegiam ou mandavam representantes para a Câmara de Vereadores, para a Assembléia, para a Câmara Federal.
3. BRIZOLA – Os oficiais do Exército tinham ouvido o galo cantar, mas não sabiam bem onde. Mostrei-lhes que, na medida em que Brizola substituiu esses “coronéis urbanos” tradicionais pelos chefes do tráfico de drogas nas 454 favelas do Rio, ele criou um “exército marginal” para comandar seu “cinturão popular” em torno da cidade. É que, no primeiro instante de uma convulsão social que não está longe de acontecer, não seriam os partidos políticos, a Igreja, ou quaisquer lideranças legais que iriam comandar ou controlar a explosão. Seriam inevitavelmente os chefes da droga, porque são eles que tem armas, dinheiro, ligações com autoridades, força, portanto poder sobre os mais de 2 milhões de favelados e mais de 2 milhões de moradores das periferias pobres, é o “exército brizolista”. Não é mais o ilegal “Clube dos Onze” de 1963. É o marginal “Clube dos 454” de hoje. E uma estrutura dessas não se monta trocando flores. É negociando poder ou dinheiro. Daí é que vem toda essa fantástica “caixinha” que Brizola faz em nome do PDT para tentar comprar a presidência da República. Até agora ele aplicou o dinheiro em terras no Uruguai e nas suas gordas contas bancárias de Montevidéu e Nova Iorque. Mas, na hora em que a campanha esquentar, ele vai “desovar” esse “dinheiro sujo”.
4. GABEIRA – Na saída do jantar, já madrugada, um dos oficiais me chamou a um canto e perguntou nervoso: “Nery, será que você não está exagerando? Será que o Brizola e o PDT do Rio têm mesmo esse acordo, essa associação, essa aliança com o tráfico de drogas e o crime organizado?” Eu lhe disse apenas duas coisas: “Coronel, ponho minha mão sobre a bíblia e lhe asseguro que, diante de Brizola, Maluf é uma menina de primeira comunhão. E mais. Lembre-se da declaração de Gabeira, poucos dias atrás. Gabeira é um dos intelectuais mais brilhantes, mais lúcidos, mais capazes e mais profundamente participantes que o país tem hoje. Ele disse que o poder militar do Comando Vermelho, da Falange Vermelha, do tráfico de drogas no Rio, é muito maior do que toda a luta armada dos anos 70 contra os governos militares. E este é um exército marginal à disposição de Brizola. O coronel me perguntou se eu estava disposto a discutir esse assunto mais profundamente, outra hora. Disse-lhe que estava, contanto que fosse em público, em um auditório. Não sei se ele dormiu aquela noite. Mas certamente acordou em pânico, Domingo, com a magnífica denuncia de Roni Lima, no Jornal do Brasil: “Comando Vermelho abre morros para Marcelo Alencar”.
5. JORNAL DO BRASIL – Logo no Domingo um dos oficiais presentes ao jantar telefona para minha casa em Brasília (eu já estava aqui em Salvador), não me encontra e depois diz a um amigo meu que não era possível que, no jantar de quarta-feira, eu já não soubesse da matéria que o Jornal do Brasil publicaria Domingo, porque antecipei todos os dados e fatos. O que me impressionou sobretudo foi os traficantes terem fechado as favelas para todos os outros candidatos, com exceção do candidato do PDT, terem recebido a bala e corrido do morro de São Carlos, no Catumbi, o candidato do PTB, deputado Roberto Jefersson, e todas as ordens estarem sendo dadas a partir dos presídios onde estão Escadinha e outros líderes do Comando Vermelho, da Falange Vermelha através de bilhetes de “torpedos”. E o oficial perguntou a este amigo meu: “Será que não vai ser feita uma Comissão Parlamentar de Inquérito na Câmara Federal ou Senado para apurar isso? Onde estão os partidos e seus líderes”?
6. ARTUR DA TÁVOLA – Foi perfeita a reação de Artur da Távola: “Marcello Alencar é o candidato dos bandidos. A notícia do Jornal do Brasil atesta a aliança entre o jogo do bicho, o tóxico e os pedetistas”. E Marcello Alencar, com aquela tremenda cara-de-pau tombando como garrafa vazia, passou recibo: “Vou ter os votos dos bandidos mas terei também votos das polícias civil e militar”. O Roni Lima, do JB, tem razão: “Essa aproximação de políticos com os cada vez mais armados e organizados traficantes dos morros é pelo oportunismo eleitoral. Não existe nenhuma favela do Rio se organizando sem o aval do tráfico, atesta o funcionário da prefeitura. Fingir que os caras não existem é chumbo grosso”.
7. NORIEGA – Quem assistiu o debate entre os dois candidatos a presidência dos EUA, Bush e Dukakis, ouviu bem quando Dukakis acusou o governo Reagan “por suas relações com o general Noriega, o ditador panamenho, traficante de droga”. Aqui no Brasil é muito pior. Um candidato a presidência da República é o próprio Noriega nacional, o Noriega Brizola que faz ele próprio o seu partido, aliança com o crime organizado. Engane-se quem quiser. Seja estúpido quem for. Mas a esta altura ninguém mais tem direito, no país, de dizer que não sabe, não viu, não lhe contaram, que os candidatos do PDT são os candidatos do tráfico de drogas, que Brizola é o candidato à presidência do “cartel Medelin” nacional, já está denunciado, mostrado, provado. Os ilustres oficiais da ativa do Exército do jantar da semana passada em Brasília já não tem o direito de se mostrarem surpresos, perplexos, com a audácia de Brizola, o único político brasileiro importante que já teve coragem de fazer alianças e engordar sua caixinha com o crime organizado todo. Até aqui, o mais que ousavam era fazer pactos com o jogo do bicho. Brizola joga pesado com os traficantes de drogas, como disse Artur da Távola, ele e o PDT foram os primeiros.
8. E O EXËRCITO – As Forças Armadas lutaram desde o primeiro dia da Constituinte para manterem, na Constituição, seu privilégio de responsáveis e fiadores da ordem interna. O que é ordem interna? Será que a ordem interna é apenas a greve dos trabalhadores empobrecidos e explorados por uma política econômico-financeira criminosa? Será que a ordem interna é apenas a luta do povo brasileiro em defesa dos interesses nacionais negociados, retalhados, vendidos nos açougues dos banqueiros internacionais pelos Mailson Nóbrega da vida? Será que a entrega do poder político a o tráfico de drogas nas favelas e periferias das grandes cidades não é problema de ordem interna? Como imaginar que possa chegar à presidência da República um Noriega nacional publicamente aliado, conluiado, associado, ele e seu partido, com os bandidos do tóxico? Não podemos entregar a Nação ao Noriega de Carazinho”.
Nem por nada que cocaína, durante o governo do maragato, era sinônimo de “brizola”, também abreviado para “briza” na gíria carioca. Nada mais esclarecedor. A trouxinha de “briza” custava na época, segundo os jornais, “1 quina” – uma alusão ao número 5 seguido de não me lembro quantos zeros. Afinal, a inflação naqueles tempos galopava mais rápido que a egüinha pocotó de Figueiredo na Granja do Torto. Vez por outra, Neusinha, filha de Brizola, se via envolvida com traficantes de drogas nos morros, onde ia renovar seu “abastececimento”.
Brizola proibiu a polícia de subir os morros cariocas. Dizia que a medida era para evitar o “constrangimento” dos cidadãos, de serem revistados, como se todos fossem bandidos. Dentro dessa lógica, Brizola deveria ter abolido a própria Polícia Militar, porque, se o “cidadão do morro” não pode se sentir constrangido, por que o “cidadão do asfalto” deveria ser nas blitzen da polícia?
Além do aumento do tráfico de armas e drogas, os dois governos Brizola permitiram a proliferação desenfreada de favelas. Praças públicas foram invadidas para a construção de barracos e até casas de alvenaria, principalmente no subúrbio carioca. Revistas importantes, como Veja, sempre deram destaque a esse assunto, como em seu número 1860, de 30/05/2004, pg. 54, no texto “As mortes de Brizola”, de Mario Sabino: “O antibrizolista ressente-se de um fato inconteste: a alastramento das favelas, inclusive no cartão-postal da Zona Sul, e a ascensão dos traficantes de drogas durante o governo de Brizola. Não se trata de coincidência. O brizolismo nutriu-se diretamente dos bolsões de pobreza cariocas, por meio de duas medidas: o fim das remoções de favelas e a proibição de que a polícia fizesse incursões nos morros favelizados, sob a alegação de que os seus habitantes sofriam muito com a violência policial. Pois os pobres favelados deixaram de ser atormentados pela polícia, para penar sob os traficantes. Sem repressão, em pouco tempo, os traficantes armaram-se pesadamente e os morros se transformaram em fortalezas. Sem ameaça de remoção, as favelas incorporaram construções de alvenaria e multiplicaram-se. Quando Brizola assumiu o governo, em 1983, havia 377 favelas no Rio de Janeiro – número que pulou para 520 ao fim do seu primeiro mandato. O brizolismo matou o urbanismo, para ganhar a simpatia imediata dos humildes”.
Os bandidos, até hoje, agradecem. Passaram a ter um campo fértil para prosperar na capital fluminense, sem restrição séria das autoridades, a exemplo do Comando Vermelho (CV) e Terceiro Comando (TC). Só podia dar no que deu. O CV foi criado em 1979 no Presídio Cândido Mendes, na Ilha Grande, RJ. Nasceu da promiscuidade entre criminosos comuns e presos políticos – um grave erro cometido pelos governos militares pós-1964. Seu principal fundador foi William da Silva Lima, o “Professor”, que pregava teses marxistas em sua “luta pelos direitos dos presos”. O CV virou um poder paralelo e passou a controlar o sistema penitenciário fluminense desde o início da década de 1980. O Primeiro Comando da Capital (PCC), inicialmente denominado de “Serpentes Negras” na Penitenciária do Estado (SP), onde era atuante desde 1983, passou a ter essa denominação em 1993, na Casa de Custódia de Taubaté, SP. O PCC seria uma ramificação do Terceiro Comando, organização que se rebelou na década de 1990 de sua matriz, o Comando Vermelho.
“O Haiti é aqui” – diz uma conhecida canção brasileira. Para que, então, enviar tropas àquele outro Haiti, o do Caribe? “Segundo a PF, há pontos de tóxicos de morros cariocas com 300 fuzis, ou seja: um poder de fogo superior ao de duas companhias de fuzileiros de um batalhão de infantaria do Exército. É esse arsenal, sobre o qual as Forças Armadas e a Polícia Federal não têm nenhum controle, que torna o tráfico do Rio peculiar e mais assustador do que qualquer outra grande cidade no mundo” (revista Istoé nº 1707, de 19/06/2002, pg. 27, in “No front inimigo”, de Francisco Alves Filho e Marcos Pernambuco). Trata-se de fato consumado: a bandidagem tomou conta das cidades do Rio de Janeiro e de São Paulo. São seus verdadeiros prefeitos. Não existe nada de mais preciso e cruel do que aquela letra de rap, que diz: “Dominado! Tá tudo dominado!” Por isso, são sucesso nos bailes funks dos morros CDs como “Proibidão”, que faz apologia ao tráfico de drogas e à morte de policiais: “Cheiro de pneu queimado/ Carburador furado/ Um X-9 foi queimado” (Istoé, nº cit., pg. 29).
Brizola, como todo gaúcho “de dentro” (do interior) que se preza, sempre foi um pai e um avô atento com a família, exercendo um poder patriarcal que não admitia contestação. Quando Neusinha quis tirar a roupa para um revista masculina, o velho maragato foi energicamente contra, impedindo que a prostituição impressa se consumasse, alegando que tinha que resguardar a vida de sua netinha, que merecia um melhor exemplo de sua mãe. Nada mais correto.
Sobre o “Governo Paralelo”, inventado pelo PT após a vitória de Fernando Collor de Melo, Ipojuca Pontes tem uma premonição, ao escrever, em “Estratégia terrorista”, publicada em O Estado de S. Paulo, em 1989: “O projeto de Lula, a ser discutido e provavelmente acatado por Brizola e Arraes, mais do que criar condições estratégicas para firmar uma posição intransigente, tem por objetivo claro desestabilizar o futuro governo Collor de Melo e, se possível, depois, pela radicalização, levá-lo ao impeachment” (PONTES, 2003: 117). Collor foi afastado do governo, acusado de ser conivente com a corrupção conduzida por seu tesoureiro de campanha política, Paulo César Farias. Posteriormente, Collor foi absolvido pelo STF e isso comprova que tudo não passou de um mero golpe de Estado de Lula e seus “companheiros de viagem”. Deve-se frisar aqui a firme posição de Brizola: ele não apoiou a malandragem petista e foi um dos últimos políticos a apoiar o afastamento de Collor. Afinal, corrupção por corrupção, ela foi muito maior no governo FHC e nestes 18 meses da República dos Companheiros, que instalou um mafioso na ante-sala do Palácio do Planalto, Waldomiro Diniz, braço direito do Rasputin da República dos Companheiros, José Dirceu.
O autoproclamado esperto povo carioca e fluminense ficou hipnotizado pela conversa mole daquele maragato que sempre repetia “eu venho de longe, tás me compreendendo?” e o elegeu pela segunda vez, em 1991. Desgraça pouca é bobagem. Dizia-se, à época, que Brizola era o maior latifundiário do planeta: criava gado no Uruguai, cangurus na Austrália e burros no Rio de Janeiro. Meu compadre, de Bangu, então brizolista doente (hoje arrependido), quase brigou comigo quando contei a anedota...
Sobre uma coisa Brizola sempre teve razão: as críticas que fazia contra as Organizações Globo, especialmente a TV Globo. Nascida à sombra dos quepes dos militares, a TV Globo sempre se mancomunou com o poder. Impôs quem devia ser eleito, como Collor em 1989, para depois arruiná-lo e pavimentar o seu caminho até o cadafalso. Da mesma forma, a TV Globo colocou Lula da Silva em uma bolha de vidro, na campanha de 2002, isolando-o de qualquer tipo de crítica ou ataque, como as suspeitas de ter recebido dinheiro do propinoduto de Santo André e das FARC. Quando Bóris Casoy inquiriu sobre as ligações do PT com as FARC, Lula ameaçou: “Nunca mais faça esse tipo de pergunta!”. Hoje, é corriqueira a versão de que as Organizações Globo quiseram tê-lo à mão no futuro, como presidente, quem sabe quando precisarem do estratégico dinheiro do BNDES para tirar algumas de suas empresas do buraco, onde se encontram há algum tempo. Uma ameaça ao governo Lula já veio de uma empresa dos Marinhos, a revista Época, que mostrou ao País as íntimas ligações do principal assessor de José Dirceu, Waldomiro Diniz, com um bicheiro, de quem exigia gorda propina. Brizola, mais uma vez, tinha toda a razão em criticar o Polvo Global.
O maior erro de Brizola, depois do desastre carioca, foi seu nacionalismo pueril e sua xenofobia obsessiva. Nesse sentido, tem razão a revista Veja nº 1860, de 30/06/2004, pg. 52, ao colocar em manchete: “Caudilhismo, populismo, nacionalismo: as idéias e os conceitos em que acreditava o político foram sepultados antes dele”. Brizola sempre falava a favor dos “interésses” (sic!) do Brasil, porém agia de modo a prejudicar nosso País, na medida em que tinha ódio infantil aos EUA e restrições à entrada de capital estrangeiro. Brizola era um dos principais integrantes da monocórdia batucada cabocla, que prega a estatização da economia e a perseguição aos empresários, especialmente estrangeiros. A prova mais veemente desse erro de interpretação pode ser facilmente constatada com um exemplo simples. A cidade de São Bernardo do Campo, SP, hoje, ocupa no Brasil a primeira posição de Índice de Desenvolvimento Humano (IDH). Foi a entrada de capital estrangeiro, erguendo inúmeras indústrias, especialmente a automotiva, que desenvolveu a cidade e deu emprego a milhares de pessoas, inclusive Lula. Riqueza sempre gera mais riqueza, não importa se o capital é nacional ou estrangeiro. Miséria só traz miséria. Não fossem as empresas estrangeiras terem se instalado na região da Grande São Paulo, Lula hoje, provavelmente, estaria colhendo xique-xique e caçando calango em Garanhuns para sobreviver.
“Corção estabelece a distinção para destacar que o patriotismo é o aspecto positivo do nacionalismo. O nacionalismo, porém, é o aspecto negativo do patriotismo. O que há de reprovável no nacionalismo é o exclusivismo, a agressividade, a xenofobia... No nacionalismo sempre há bodes expiatórios e a crença em secretas conspirações maléficas” (MEIRA PENNA, 1992: 176).
“Um antigo e esquecido exemplo de nacionalismo xenófobo a que se refere Meira Penna – e burro, como são todos os nacionalismos xenófobos – vale ser lembrado. Em 1918, o empresário americano Percival Farquhar pretendia instalar uma siderurgia no Brasil, ao mesmo tempo em que exploraria a mineração de ferro, para exportação de 3 milhões de toneladas. Farquhar era chamado de ‘trustman’ pelos ‘nacionalisteiros’, por ser controlador de várias empresas no Brasil – ferrovias, portos, energia elétrica, frigoríficos, a Amazon Land Colonisation. A sua Brazil Railway Company em 1916 dominava quase a metade das ferrovias nacionais: 11.064 km do total de 23.491 km – posteriormente encampadas pelo Governo Federal.
Pois bem: a competente xenofobia brasileira na época se opôs ao projeto de Farquhar, atrasando nossa arrancada industrial por três décadas. Foi preciso haver uma II Guerra Mundial e os americanos utilizarem bases militares no Nordeste brasileiro e na Amazônia para que nos presenteassem a Companhia Sicerúrgica Nacional (CSN), construída em Volta Redonda, RJ, que veio a operar em 1946. A então estatal Vale do Rio Doce pretendia exportar 3 milhões de toneladas de minério de ferro, em 1955, quando 30 anos antes era essa a quantidade do projeto de Farquhar. O mais grave é que, na época, provavelmente não havia ainda o conluio comunista para tal nacionalismo terceiro-mundista, tão em voga nos tempos atuais de ‘Paz no Iraque’, ‘fora ALCA’, ‘fora EUA’, ‘A Amazônia é nossa’, ‘O Pantanal é nosso’ e ‘Alcântara é nossa’. Enquanto inflamos nosso ego, com orgulho nacionalista tolo, deixamos de ocupar a Amazônia, onde transitam traficantes de drogas, traficantes de minerais raros e contrabandistas que levam nossa rica biodiversidadel para patenteação no exterior. Enquanto gritamos irados slogans antiamericanos a respeito de Alcântara, deixamos de faturar 30 milhões de dólares anuais” (MAIER, 2003).
A culpa pelos nossos fracassos, segundo os nacionalistas brasileiros, são os EUA. Tanto essa moda caipira foi cantada pelos violeiros esquerdosos que 66% dos brasileiros passaram a acreditar no sofisma, conforme pesquisa feita pela BBC e publicada na revista Veja nº 1815, de 13/08/2003, pg. 59, sob o título “Aversão ao Tio Sam”. Na referida pesquisa, somente a Jordânia ultrapassou o Brasil em sentimento anti-ianqui. Hoje, somos mais antiamericanos do que a Rússia (28%), que, teoricamente, teria muito mais motivo para ter ódio dos americanos; a França (51%), carro-chefe da esquerda mundial; e a própria Indonésia (58%), que tem a maior população muçulmana do mundo. E olha que ainda não se tem notícia do desembarque de nenhum marine na Amazônia. Inveja do progresso americano, aliada ao saudosismo stalinista - essas são as reais causas, nada mais, deste tipo de ódio visto em várias partes do mundo, inclusive nesta Terra dos Papagaios, como bem provou Jean-François Revel em seu magistral livro “A obsessão antiamericana”.
A mesma virose nacionalisteira, que também infectou Brizola, pode ser comprovada no antigo slogan “O petróleo é nosso”. Devido a essa estupidez, o País criou uma empresa estatal para monopolizar a extração, comércio e refino do petrólo, a Petrobrás, não permitindo a competição com empresas privadas, mesmo nacionais. Como resultado da burrice, ainda importamos, hoje, cerca de 15% do petróleo e temos uma das gasolinas mais caras do mundo. Nem é preciso dizer que a “Petrossauro” - um apelido preciso inventado por Roberto Campos -, como todo dinossauro estatal, é um formidável cabide de empregos, gerando corrupção e desvio de dinheiro, além de patrocinar um clube de futebol falido, o Flamengo, às custas do suado dinheiro do trabalhador brasileiro. Também não é preciso lembrar que, para comemorar o 50º aniversário de criação, ocorrido em 2003, a Petrobrás já desperdiçou centenas de milhões de reais em publicidade televisiva, para sua narcisista adoração do próprio umbigo refletido nas águas onde bóiam suas plataformas, no Atlântico.
Brizola era tido como um bom frasista. Quando surgiu o Viagra, o macho dos pampas garganteou: “Para gaúcho esse Viagra é overdose!”. Em 2002, ironiza o antigo afilhado político: “Garotinho é como uma bola, não tem lado e é oco por dentro”. Sobre o PT, saiu-se com esta frase lapidar em 2000: “O PT é como uma galinha que cacareja para a esquerda, mas põe ovos para a direita”. Quando o PT contratou um marqueteiro para Lula, em 2001, Brizola profetizou: “O Lula, que veio para reformar, está sendo reformado”. Após fechar apoio a Lula contra Collor no segundo turno das eleições presidenciais de 1989, o rico fazendeiro, com terras no Uruguai, destilou veneno contra a burguesia: “Não seria fascinante fazer agora a elite brasileira engolir o Lula, sapo barbudo?” Nestes anos todos, entre tapas e beijos com o PT, já em 1990 Brizola mordia bonito: “O PT é a UDN de tamanco e macacão”.
O que será do PDT e do trabalhismo defendido por Brizola, de inspiração getulista? Há ainda nomes de expressão no partido, como o do senador Jefferson Perez. Só não se sabe por quanto tempo Perez se manterá fiel ao partido do último maragato, se já não está “costeando o alambrado” antes de “pular a cerca”, no linguajar gauchesco de Brizola, como fizeram tantos políticos, a exemplo de Saturnino Braga, Jamil Haddad, Marcello Alencar, César Maia e Miro Teixeira. Porém, longe vai o tempo em que o PDT era um partido de expressão nacional, fazendo governadores como Jaime Lerner, no Paraná, e Antony Garotinho, no Rio de Janeiro. Mais longe ainda ficou o tempo em que o centro do Rio de Janeiro era tomado diariamente por brizolistas, que vendiam camisas, flâmulas e chaveirinhos, cuja área se chamava “Brizolândia”, famosa calçada da Cinelândia, cercada pelo Cine Odeon, Teatro Municipal, Câmara Municipal e pela choperia O Amarelinho. “O herdeiro, de fato, do trabalhismo, ainda que não se defina como tal, é o PT. Esse fato se evidencia até no caráter nacional e popular do governo Lula, que alia a classe trabalhadora ao empresariado nacionalista e ao estamento militar” (Moniz Bandeira, cientista político, in “PT herda o trabalhismo”, Correio Braziliense, 27/06/2004, seção “Política”, pg. 8).
Há três anos, José Vicente Brizola, filho do último maragato, havia rompido relações com o pai e se bandeado de guaiaca, cuia, poncho e bombacha para o PT. Deve ter-se arrependido muito, pois logo depois denunciou à imprensa as falcatruas existentes dentro do Partido de Lula. Ao jornalista Plínio Fraga, da Folha de S. Paulo, durante o sepultamento do pai em São Borja, ocorrido no dia 24 de junho de 2004, José Vicente disse que havia se reconciliado com o pai, apenas não havia comunicado ainda o fato à imprensa. Leonel Brizola foi enterrado no mausoléu que já continha os restos mortais de Getúlio Vargas, João Goulart e de sua mulher Neusa Brizola.
“A última vontade do meu avô era te capar” – disse Leonel Neto, neto de Leonel Brizola, ao deputado Pompeo de Matos, acusado de assediar Juliana, neta de Brizola, quando Pompeu pediu para “esquecer tudo isso” (Cfr. revista Veja nº 1861, pg. 40). Pelo visto, não sobrou tempo para o maragato dos pampas puxar sua “prateada” da guaiaca e cumprir a ameaça.
Hoje, ao ouvirmos os imponentes acordes iniciais da “Grande Fantasia Triunfal com Variações sobre o Hino Nacional Brasileiro” nas propagandas televisivas do PDT, logo nos vem à mente a figura do ultranacionalista Leonel de Moura Brizola, o último dos maragatos. Ironicamente, a bela música da “Fantasia” foi escrita por um inspirado yankee (Louis Moreau Gottschalk), povo declarado por Brizola como sendo o inimigo número um da humanidade.
Bibliografia:
1. ALVES, Márcio Moreira. “O Despertar da Revolução Brasileira”. Seara Nova, Lisboa, 1974.
2. AUGUSTO, Agnaldo Del Nero. “A Grande Mentira”. Biblioteca do Exército Editora, Rio de Janeiro, 2001.
3. GRAEL, Dickson Melges. “Aventura, Corrupção e Terrorismo – à sombra da impunidade”. Editora Vozes, Petrópolis, RJ, 2ª edição, 1985.
4. MAIER, Félix. “Nacionalismo e esquerdismo nas Forças Armadas”. Usina de Letras (www.usinadeletras.com.br), 2003.
5. MEIRA PENNA, José Osvaldo de. “Decência Já”. Instituo Liberal e Nórdica, Rio de Janeiro, 1992.
6. PONTES, Ipojuca. “Politicamente Corretíssimos”. Topbooks, Rio de Janeiro, 2003.
7. REVEL, Jean-François. “A Obsessão Antiamericana – causas e inconseqüencias”. UniverCidade, Rio de Janeiro, 2003.
8. TAVARES, Aurélio de Lyra. “O Brasil de Minha Geração – Mais dois decênios de lutas – 1956/1976”. Biblioteca do Exército Editora, Rio de Janeiro, 1977.
Anexo: Pequeno glossário retirado de “Arquivos I – uma história da intolerância”, de Félix Maier:
CAMDE - A CAMDE foi criada pouco antes das eleições de 1962, sob orientação de Leovigildo Balestieri (vigário franciscano de Ipanema, Rio de Janeiro), Glycon de Paiva e o general Golbery do Couto e Silva. “Eles convincentemente argumentavam que o Exército fora minado pelo ‘vício do legalismo’, que só mudaria se ‘legitimado’ por alguma força civil, e que as mulheres da classe média e alta representavam o mais facilmente mobilizado e interessado grupo de civis” (P. Schmitter, in “Interest, Conflict and Political Change in Brazil”, Stanford, California University Press, 1971, pg. 447). A CAMDE era uma organização feminina anticomunista, promoveu a “Marcha da Família com Deus pela Liberdade”, no dia 19 de março de 1964, em São Paulo (19 de março, Dia de São José, Padroeiro da Família), reunindo 500.000 pessoas, protesto que exigia o fim da balbúrdia e da carestia durante o Governo Goulart, e que antecedeu à revolução de 31 Mar 1964. No dia 2 de abril, a CAMDE reuniu 1 milhão de manifestantes no Rio de Janeiro para agradecer a interferência dos militares nos destinos do país, ocasião em que Aurélia Molina Bastos encerrou seu discurso dizendo: “Nós louvamos, nós bendizemos, nós glorificamos a Deus e o soldado do Brasil”.
As mulheres do CAMDE de Minas Gerais ofereceram a Castello Branco, ainda antes de sua eleição, uma nova faixa presidencial, para que não usasse a tradicional, “já conspurcada pelos maus presidentes que o precederam” (O Estado de S. Paulo, 12/04/1964). Outras organizações femininas e grupos católicos atuantes em 1964, além da CAMDE, foram: Liga de Mulheres Democráticas (LIMDE), (MG); União Cívica Feminina (UCF), organizada em 1962 (SP); Campanha para Educação Cívica (CEC); Movimento de Arregimentação Feminina (MAF), teve início em 1954, foi liderado por Antonieta Pellegrini, irmã de Júlio de Mesquita Filho, proprietário de “O Estado de S. Paulo”; Liga Independente para a Liberdade, dirigida por Maria Pacheco Chaves; Movimento Familiar Cristão (MFC); Confederação das Famílias Cristãs (CFC); Liga Cristã contra o Comunismo; Cruzada do Rosário em Família (CRF); Legião de Defesa Social; Cruzada Democrática Feminina do Recife (CDFR); Ação Democrática Feminina (ADF), Porto Alegre, RS.
Foquismo - Teoria revolucionária, em que a revolução seria iniciada em pequenos núcleos (focos), para começar a guerrilha rural, com objetivo de dominar a nação. O foquismo foi sistematizado pelo revolucionário comunista francês Jules Debray, e defendida por Fidel Castro e Che Guevara. O PC do B tentou colocar em prática essa teoria na região do Araguaia. “O treinamento a brasileiros em Cuba continua até os dias atuais, embora somente no terreno político-ideológico, na Escola Superior Nico Lopez, do PC cubano, Escola Sindical Lázaro Peña, Escola de Periodismo José Martí, Escola da Federação de Mulheres Cubanas, Escola da Federação Democrática Internacional de Mulheres e Escola Nacional Julio Antonio Mella, da União da Juventude Comunista. Por essas escolas já passaram mais de 100 brasileiros. Todavia, o mais importante em tudo isso, é que a ida de qualquer brasileiro para fazer cursos em Cuba depende do aval do Partido Comunista Cubano, após entendimentos anteriores, de partido para partido. Atualmente, existem diversos brasileiros, militantes do Movimento dos Trabalhadores Sem Terra vêm recebendo, em Havana, treinamento em técnicas agrícolas, e outros matriculados na Faculdade Latino-Americana de Ciências Médicas. O site do Partido dos Trabalhadores oferece vagas e publica as condições definidas por Cuba para matrícula nessa Faculdade” (Huascar Terra do Valle, in “Histórias quase esquecidas”, site Mídia Sem Máscara, 10/2/2003). Veja OLAS.
IPES - O IPES passou a existir oficialmente no dia 29 de novembro de 1961 (Jânio Quadros havia renunciado em agosto do mesmo ano). O lançamento do IPES foi recebido favoravelmente por diversos órgãos da imprensa e contou com a aprovação do Arcebispo do Rio de Janeiro, Dom Jayme de Barros Câmara. Além do Rio e de São Paulo, o IPES rapidamente se expandiu até Porto Alegre, Santos, Belo Horizonte, Curitiba, Manaus e outros centos menores.
O IPES foi formado pelo trabalho do empresário de origem americana, Gilbert Huber Jr., do empresário multinacional Antônio Gallotti, dos empresários Glycon de Paiva, José Garrido Torres, Augusto Trajano Azevedo Antunes, além de serviços especiais de oficiais da reserva, como o general Golbery do Couto e Silva. Sandra Cavalcanti era uma das mais famosas conferencistas do IPES. As sementes do IPES, assim como do IBAD e do Conselho Superior das Classes Produtoras (CONCLAP) haviam sido lançadas no final do Governo JK, cujos excessos inflacionários geraram descontentamento entre os membros das classes produtoras do país, e durante a Presidência de Jânio Quadros, em cujo zelo moralista eles depositaram grandes esperanças.
O IPES produziu em torno de 8 filmes, para alertar os desmandos do Governo Goulart, como a ameaça comunista; os cineastas eram Jean Mazon e Carlos Niemeyer. Um escritor de peso do IPES foi José Rubem Fonseca, autor de “Feliz Ano Novo”; segundo Fonseca, o “IPES buscava mobilizar a opinião pública no sentido do fortalecimento dos valores democráticos” (Cfr. AUGUSTO 2001). O IPES chegou a promover, mais tarde, Estudos de Problemas Brasileiros para os Governos Militares pós-1964.
O IPES participou também de operações internacionais, que ajudaram a derrubada de Salvador Allende, no Chile, e do general Juan Torres, na Bolívia (em Ago 1971, o general Hugo Banzer tomou o poder). Entidades congêneres do “Complexo IPES/IBAD”: 1) México: Centro de Estudios Monetarios Latinoamericanos – CEMLA; Centro Nacional de Estudios Sociales - CNES; Instituto de Investigaciones Sociales y Económicas – IISE; 2) Guatemala: Centro de Estudios Económico-Sociales – CEES; 3) Colômbia: Centro de Estudios y Acción Social – CEAS; 4) Equador: Centro de Estudios y Reformas Económico-Sociales – CERES; 5) Chile: Instituto Privado de Investigaciones Económico-Sociales – IPIES; 6) Brasil: Sociedade de Estudos Interamericanos – SEI; Fundação Aliança para o Progresso; 7) Argentina: Foro de la Libre Empresa; Acción Coordinadora de las Instituciones Empresariales Libres. “Em 64, quando Castelo Branco organizou o Governo, a maioria dos cargos foi entregue a quem tinha ensinado ou feito cursinho no IPES. A começar por Golbery e Roberto Campos” (Sebastião Nery, in “Os filhos de 64”, Jornal Popular, Belém, PA, 6 Out 1995).
Ligas Camponesas - As origens da organização dos camponeses datam da década de 1940, no trabalho do PCB, que estabeleceu as Ligas Camponesas. Essa atividade ressurgiu na década de 1950, em Galiléia, com a criação da Sociedade Agricultural de Plantadores e Criadores de Gado de Pernambuco, assistida por um ex-membro do PCB, José dos Prazeres, e depois com a formação de sociedades de direito civis e legais, que rapidamente se espalharam por todo o Nordeste, passando a uma rede de Ligas Camponesas – como eram chamadas pelos proprietários de terras, devido à sua origem da década de 1940. Francisco Julião foi o principal líder das Ligas, com atuação, especialmente, em Pernambuco, do então Governador Miguel Arraes, onde as Ligas colocavam fogo em canaviais e depredavam fazendas. No dia 27 Nov 1962, na queda de um Boeing 707 da Varig, quando se preparava para pousar em Lima, Peru, estava entre os passageiros o Presidente do Banco Central de Cuba, em cujo poder foram encontrados relatórios de Carlos Franklin Paixão de Araújo, filho do advogado comunista Afrânio Araújo, o responsável pela compra de armas para as Ligas Camponesas. Os relatórios detalhavam os atrasos dos preparativos para a luta no campo, acusava Francisco Julião e Clodomir Morais de corrupção e malversação de recursos recebidos. Esses documentos chegaram às mãos do Governador Carlos Lacerda, da Guanabara, que fez vigorosa campanha na imprensa, denunciando a interferência cubana em nosso País. No Brasil, antes de 1964, Cuba financiou ainda as Ligas Camponesas para comprar fazendas que serviram de campos de treinamento de guerrilha. A revista Veja, de 24 Jan 2001, sob o título 'Qué pasa compañero?', faz uma análise centrada na tese de doutorado da pesquisadora Denise Rollemberg, da UFRJ, a qual afirma que 'o primeiro auxílio de Fidel foi no Governo João Goulart, por intermédio do apoio às Ligas Camponesas, lendário movimento rural chefiado por Francisco Julião. (...) O apoio cubano concretizou-se no fornecimento de armas e dinheiro, além da compra de fazendas em Goiás, Acre, Bahia e Pernambuco, para funcionar como campos de treinamento”. Após a Contra-revolução de 1964, as Ligas Camponesas, de inspiração comunista, foram dissolvidas, e Julião obteve asilo no México.
OLAS - Organización Latinoamericana de Solidaridad: no dia 16 Jan 1966, 1 dia após o término da Tricontinental, em Havana, Cuba, as 27 delegações latino-americanas reuniram-se para a criação da OLAS, proposta por Salvador Allende. O terrorista brasileiro Carlos Marighella foi convidado oficial para a Conferência da OLAS em 1967. Ola, em espanhol, significa “onda”, seriam, pois, ondas, vagalhões de focos guerrilheiros espalhados por toda a América Latina, como disse o próprio Fidel Castro: “Faremos um Vietnã em cada país da América Latina”. Após a Conferência, começam a surgir movimentos guerrilheiros em vários países da América Latina, principalmente no Chile, Peru, Colômbia, Bolívia, Brasil, Argentina, Uruguai e Venezuela. A OLAS, substituída pela JCR, tem sua continuidade no Foro de São Paulo (FSP) e no Fórum Social Mundial (FSM).
Pinar del Río - Província de Cuba, onde havia cursos para terroristas brasileiros nas décadas de 1960 e 1970. O “currículo” incluía: 1) Tática guerrilheira – o observador, o mensageiro, a coluna guerrilheira, o acampamento, a marcha, sobrevivência na selva (montanhas de Escambray), o ataque, a emboscada; 2) Tiro – limpeza e conservação do armamento, fuzis: AD, FAL, AK, Garand; metralhadoras: MG52, Uzi; bazuca, morteiro e canhão 152 mm; 3) Comunicações; 4) Topografia – leitura de mapas, uso de bússola e do binóculo, orientação; 5) Organização do terreno – construção de abrigos individuais e coletivos, espaldões para metralhadoras e morteiros; 6) Higiene e primeiros socorros – fraturas, hemorragias, imobilizações, transporte de feridos; 7) Política – o comissário político, semanalmente, fazia uma palestra. No regresso, o terrorista brasileiro recebia de volta os documentos verdadeiros, nova documentação com nome falso, cerca de 1.500 dólares, itinerário até o Chile de Salvador Allende, antes de chegar ao Brasil. Quando preso, o terrorista era instruído para utilizar algumas artimanhas, para ser levado ao hospital e, assim, prejudicar o interrogatório: 1) colocar fumo na água e bebê-la, provocando crise de vômitos; 2) usar uma dose mínima de estriquinina para provocar convulsões; 3) “tentar” o suicídio; 4) simular grande descontrole nervoso; 6) bater com a cabeça nas paredes.
Hoje, Pinar del Río se destaca pela produção de tabaco, matéria-prima dos charutos cubanos de prestígio internacional, como o Cohiba esplendido (R$ 180,00 a unidade) que Lula da Silva gosta de saborear em 18 cm do mais puro prazer.
Tricontinental - Criada durante a OSPAAAL, que se realizou em Havana, Cuba, de 3 a 15 Jan 1966 – juntamente com o XXIII Congresso do PCUS. (Em 1965, em Gana, ficou decidido que a OSPAA realizaria seu próximo encontro em Cuba, no ano seguinte, para integrar também a América Latina – daí OSPAAAL). “Consiste no princípio de que a coexistência pacífica não se pode estender às chamadas ‘guerras de libertação nacional’, isto é, às guerras ‘entre oprimidos e opressores, entre os povos coloniais explorados e seus exploradores colonialistas e imperialistas’ ” (Meira Penna, in “Política Externa”, pg. 133). À Tricontinental compareceram representantes de 82 países, dos quais 27 latino-americanos. A delegação brasileira foi composta por Aluísio Palhano e Excelso Rideau Barcelos (indicados por Brizola), Ivan Ribeiro e José Bastos (do PCB), Vinícius Caldeira Brandt (da AP) e Félix Ataíde da Silva, ex-assessor de Miguel Arraes, na época residindo em Cuba. A tônica do encontro foi a defesa da luta armada. No encerramento, Fidel Castro afirmou que a “luta revolucionária deve estender-se a todos os países latino-americanos”. A Tricontinental foi a estratégia que desencadeou a Guerra do Vietnã e guerras civis como em Angola e Moçambique, e os grupos terroristas que surgiram na América Latina a partir de 1967/68, especialmente no Brasil, Argentina e Chile. No campo cultural, a Declaração da Tricontinental recomendava a “publicação de obras clássicas e modernas, a fim de romper o monopólio cultural da chamada civilização ocidental cristã, cuja derrocada deve ser o objetivo de todas as organizações envolvidas nessa verdadeira guerra”. Nesse encontro, o Senador Salvador Allende (futuro Presidente do Chile) faria uma proposta aprovada por unanimidade pelas 27 delegações: a criação da OLAS. Assim, no dia 16 Jan 1966, um dia após o término da Tricontinental, as 27 delegações latino-americanas reuniram-se para a criação da OLAS, que passou a ser dirigida pelo Comitê de Organização, constituído de representantes de Cuba, Brasil, Colômbia, Peru, Uruguai, Venezuela, Guatemala, Guiana e México. A Secretaria-geral foi entregue à cubana Haydee Santamaria, e o representante brasileiro era Aluísio Palhano.
ULTAB - União dos Lavradores e Trabalhadores Agrícolas do Brasil: fundada em 1957 pelo PCB, teve suas principais bases em São Paulo, Rio de Janeiro e Minas Gerais. Porém, obteve seu maior sucesso em Goiás, onde o movimento tomou as cidades de Trombas e Formoso, e só foi desmobilizado em 1964 pelos militares.
(*) O autor é ensaísta e militar da reserva. Articulista de Mídia Sem Máscara, publicou “Egito – uma viagem ao berço de nossa civilização”, Thesaurus, Brasília, 1995.
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De: Carmen Fagundes
Enviado: sexta-feira, 30 de julho de 2004 10:42:40
Para:
Assunto: RES: Mensagem para o Senador
Prezado senhor
O senador Arthur Virgílio recebeu sua mensagem e pediu-me que lhe parabenizasse pelo excelente texto.
Carmen Fagundes
Assistente Parlamentar
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De: Saul Cardoso
Enviado: Enviado: segunda-feira, 2 de agosto de 2004 18:58:21
Para:
Assunto: A propósito de Brizola & maragatos
Prezado Senhor Felix Maier,
Breve comentário ao artigo: Brizola o útimo dos maragatos, publicado no Usina de Letras de 27/07/04
Em relação à observação quanto ao comparecimento de pessoas portando lenço vermelho ao velório do finado Leonel Brizola, nada a discordar. Entretanto, inferir, a partir daí ou das convicções revolucionárias do pai do ex-Governador, qualquer identificação entre a trajetória política do Sr. Brizola e a visão político-ideológica dos maragatos (entendendo-se aí a linha doutrinária do antigo Partido Libertador) não constitui a meu ver uma ilação historicamente defensável. Entendo que não há nada mais distante das convicções políticas dos maragatos que o trabalhismo, principalmente se considerarmos que o trabalhismo do ponto de vista da seqüência de lideranças foi uma espécie de continuação do Castilhismo passando pelo Borgismo (Partido Republicano Riograndense). Apenas na aliança havida no episódio da Revolução de 30 os maragatos marcharam juntos com Getúlio, Flores da Cunha, Osvaldo Aranha e outros aos quais haviam combatido de armas na mão na então recente Revolução de 23. De qualquer forma, pode-se considerar que essa proximidade a rigor acabou em 37. Daí para diante nada mais antagônico que maragatos e seguidores de Getulio Vargas. Ressalte-se que Leonel Brizola foi até a morte um fiel e ferrenho defensor de Vargas.
Minha observação não tem nenhuma pretensão de restringir os méritos do Sr. Brizola ou do seu artigo, uma compilação preciosa e rica em dados da nossa história política recente. A preocupação foi apenas no sentido de evitar que pesquisadores jovens, interessados nesse capítulo da história do Brasil, possam fazer confusão a respeito do que defendiam os maragatos pertencentes ao partido fundado por J. F. Assis Brasil e Raul Pilla em Pedras Altas, e que teve nos Senadores Paulo Brossard e Mem de Sá algumas de suas últimas lideranças destacadas, e supor que o brizolismo fosse algo remotamente assemelhado.
Para estabelecer com nititez as diferenças, basta observar que a principal 'bandeira' dos libertadores (maragatos) foi sempre a adoção do parlamentarismo e o Sr. Brizola, junto com Tancredo Neves et caterva, tudo fez para acabar com esse regime, como de fato conseguiu na manobra do Plebiscito em 1963. E aí, como sabemos, deu no que deu.
Atenciosamente,
Saul O. G. Cardoso
saulgil@sulconsult.com.br
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Brasília, 03/08/2004.
Caro Saul,
Obrigado pelas considerações apresentadas, especialmente a rápida definição histórica e política dos maragatos, que enriquecem o conhecimento de todos nós, leitores e escritores de Usina de Letras.
Ocorre que em nenhum momento do presente trabalho fiz um paralelo entre a obra de Leonel Brizola e o credo político de Gaspar da Silveira Martins. Para isso, eu deveria ter explicado, inicialmente, o pensamento político dos maragatos e tirado a devida conclusão, depois de analisar a trajetória política de Brizola. Em nenhum parágrafo foi dito que Brizola é o herdeiro de Martins, Castilhos ou Borges de Medeiros.
O termo maragato (*), empregado por mim tanto no título quanto no corpo do texto, é nada mais do que uma licença literária para exprimir o modo “revolucionário” de Brizola se apresentar ao público, muitas vezes com um espalhafatoso lenço vermelho no pescoço, exatamente como os maragatos se vestiam. Uma “licença” muito mais forçada do que a minha foi a da TV Globo, ao apresentar os farroupilhas de “A Casa das Sete Mulheres” (**) com lenços vermelhos no pescoço. Garibaldi e Bento Gonçalves nunca usaram lenços vermelhos, como sugere a minissérie. A respeito do assunto, vejamos o que diz o presidente da Academia de História Militar Terrestre do Brasil e do Instituto de História e Tradições do Rio Grande do Sul, coronel (do Exército) Cláudio Moreira Bento, em seu elucidativo artigo “A Casa das Sete Mulheres”:
“Mas como disse seu diretor Jaime Monjardin ‘ela possui 40% de História e 60% de fantasia’. E aproveitou um tema histórico e o vestiu de gala com toda a pompa e circunstância, e de forma notável.
No tocante a fantasia como elemento notável para atrair os tele espectadores e passar-lhes o essencial da História, usou recursos inexistentes na época, e tudo por conta da citada e louvável fantasia.
Exemplos: O uso de lenços vermelhos e brancos pelos farrapos e imperiais, um costume que remonta a Guerra Civil na Região do Sul 1893-95. O cenário lindíssimo dos Aparados da Serra onde a revolução não chegou. Luxo nas estâncias, casas e igrejas incompatível com aspecto espartano das mesmas, do que a estância de Bento Gonçalves em Cristal-RS, hoje Parque Histórico em sua memória é um exemplo. Imperiais entrando a cavalo dentro de uma igreja quando os santos no Império eram mais respeitados que os próprios generais e a canção do Exército era a de N. S. da Conceição a sua padroeira. Era raro o uso de carroças e sim carretas. E não existiam carruagens, que só aparecem em Pelotas por volta de 1865”.
Já que Maomé, quero dizer, Bento Gonçalves e Garibaldi não foram até as montanhas dos Aparados da Serra, com suas lindas cachoeiras, os Aparados desceram até a campanha gaúcha – pelo menos na novela global. Um golpe de mestre para embelezar a peça histórica que tanto nos encantou e que, com certeza, encantou também milhões de pessoas em outros países.
Aliada à liberdade literária por mim usada no texto acima, convém repetir que o nome “Leonel” foi tirado do chefe maragato Leonel Rocha. Não importa se o nome foi imposto pelo pai de Leonel Brizola ou se este assim se autobatizou. O que importa é como Leonel Brizola se comportava e se assumia em público.
Hoje, não há como, rigorosamente, denominar alguém de chimango ou maragato, a não ser em liberdades poéticas. Chimangos e maragatos não existem mais, assim como não existem mais socialistas depois que Lula afirmou nunca ter sido socialista... Mesmo se ainda existissem maragatos, estes não pautariam mais sua política sobre os antigos caudilhos gaúchos, como Castilhos e Medeiros. 'History is again on the move' – definiu magistralmente Arnold Toynbee. Exceto para Leonel Brizola, que não percebeu a mudança da História e morreu congelado no tempo d’antanho.
Cordialmente,
Félix Maier
Obs.:
(*) Maragatos - Federalistas que em fevereiro de 1893, ano da campanha eleitoral para o governo estadual do Rio Grande do Sul, iniciam sangrento conflito com os Republicanos, apelidados de “Chimangos” ou “Pica-paus”, ocasionando milhares de vítimas (normalmente degoladas). Entre fins de 1893 e início de 1894, os “Maragatos” avançam sobre Santa Catarina e unem-se à Revolta da Armada, ocupam a cidade de Desterro (atual Florianópolis) e, depois, a cidade de Curitiba. Sem recursos, os Maragatos recuam até o território gaúcho, onde lutam até meados de 1895. O novo Presidente, Prudente de Morais, consegue um acordo de paz e anistia os revolucionários.
(**) “A Casa das Sete Mulheres” foi baseada no best-seller de mesmo nome escrito pela gaúcha Leticia Wierzchowski (Editora Record, Rio e São Paulo, 5ª Edição, 2003).
***
De: Saul Cardoso
Enviado: terça-feira, 3 de agosto de 2004 19:14:04
Para: Félix Maier
Assunto: Re: A propósito de Brizola & maragatos - Mais algumas linhas
Prezado Sr. Felix,
Senti-me muito lisonjeado com a atenção dada às minhas despretensiosas observações e agradecido pela análise histórico-cultural complementar com que me obsequiou. Na realidade não quis, na mensagem anterior, estabelecer qualquer nexo ideológico necessário entre Vargas/Brizola (trabalhismo) e os antecessores Castilhos/Borges de Medeiros. O meu nexo foi em relação à cadeia de próceres políticos que foram influenciando de alguma forma seus sucessores que, por sua vez, foram adiante criando rumos políticos próprios consentâneos com as épocas em que viveram. Neste sentido é que considero que há uma linhagem Castilhos/Borges/Getúlio/Brizola. É interessante levar-se em conta que o menino Brizola, certamente marcado pelo sacrifício político-revolucionário do pai, identificou-se de início com as lideranças maragatas como Leonel Rocha, Felipe Portinho e outros que haviam lutado contra Borges de Medeiros, Flores da Cunha etc. em 23. Entretanto, ele como muitos outros e recebendo outras influências, não tiveram suficiente robustez e nitidez nas convicções para entender o momento de não mais aceitar o Vargas de 30 como alguém confiável aos maragatos, após 37. Certamente ficou fascinado pelo inegável carisma de Vargas e preferiu bandear-se de vez para o aliado transitório dos maragatos e para o que ele era politicamente no mais profundo de suas convicções.
Sobre a não mais existência de chimangos e maragatos, nos dias de hoje, não tenho a sua certeza. Vou relatar um pequeno episódio para justificar a minha dúvida, ainda que decorridos já trinta anos do acontecido. Foi no ano de 1973 quando no R. G. do Sul estruturou-se um movimento para comemorar o cinqüentenário da revolução de 23. Na oportunidade foi constituída uma comissão para percorrer o Estado e organizar os vários eventos nos municípios que haviam se destacado na contenda. Ao chegar a comissão a S. Francisco de Assis e informar às lideranças locais o intento, foram por estas desaconselhados de levar a idéia adiante, dado que os ânimos ainda não eram considerados suficientemente serenados para uma confraternização isenta de riscos de reabertura das hostilidades!
Um abraço,
Saul Cardoso (filho, neto e bisneto de maragatos e federalistas e apreciador de história política do Brasil pós-independência)
***
Brasília, 04/08/2004.
Caro Saul,
Claro que ainda existem maragatos e chimangos, assim como existem socialistas, ainda que Lula tenha dito nunca ter sido um deles. Naquela minha afirmação, coloquei uma dose de ironia, pois todos sabemos que o socialismo está mais forte do que nunca nesta Terra dos Papagaios. Da mesma forma, ainda há chimangos e maragatos, embora hoje sejam mais figuras folclóricas do que políticas. Espero que S. Francisco de Assis, nos dias atuais, esteja mais pacificada...
Foi um prazer ter trocado algumas palavras com o Sr., as quais acrescentarei no texto escrito em Usina de Letras
(www.usinadeletras.com.br/exibelotexto.php?cod=4886&cat=Ensaios).
Cordialmente,
Félix Maier
Usina de Letras -- Contato do Leitor
De: | andregbrizola@hotmail.com |
Enviada: | segunda-feira, 15 de agosto de 2011 21:06:26 |
Para: | ttacitus@hotmail.com |
Mensagem referente ao texto Internet revela novos escritores - Ensaios.
Mail enviado para: Félix Maier
Enviado Por: Andre Brizola - andregbrizola@hotmail.com
Da cidade : Carazinho
Jamais poderiam escrever tamanhas blásfemias sobre Brizola, de onde foi tirado tamanhas mentiras. Olhem a quantidade de obras que Brizola fez para o seu povo. Já o exército, além de matar milhões de inocentes ainda deixou uma divída enorme aos cofres púlicos. Também não há o que discutir, quem decidiu pelo presidencialismo foi o povo. Então pessoas como Felix Maier são uns derrotados que não tem respaldo nenhum, e ficam tentando criar um bicho Papão de uma pessoa que tanto fez por esse Brasil
Caro André,
Você deve estar se referindo a meu texto Brizola, o último dos maragatos. Nesse texto não existe nada inventado, apenas o currículo de Brizola:
- que foi o criador do G-11 (que, se tivesse êxito, seria um grupo de extermínio);
- que acabou com a cidade do Rio de Janeiro nos dois mandatos de governador, com a multiplicação de favelas, onde a polícia foi proibida de subir o morro para prender traficante;
- que não passou de um político populista e embusteiro.
Aliás, Brizola foi chamado por Fidel Castro de el ratón, por não explicar o sumiço de 200 mil dólares enviados a ele pelo Abutre do Caribe, no Uruguai, via pombo-correio Betinho, o santo de pau oco. A única obra de relevo foi o sambódromo na Sapucaí, no Rio, evitando o monta-desmonta de arquibancadas todo ano, com custo altíssimo. O projeto das escolas de tempo integral também foi bom - pena que só no papel, pois os "brizolões" foram obras faraônicas plantadas em locais estratégicos, para turista ver, especialmente os gringos.
O Exército não matou milhões de pessoas. Apenas defendeu o País contra grupos criminosos, que se intitulam "militantes políticos" mas que não passam de terroristas, assassinos, que queriam implantar aqui uma ditadura cubana. Os militares deixaram dívidas, sim, mas fizeram obras excepcionais de infraestrutura, que levou o Brasil, da 46ª para a 8ª economia mundial. Que obras foram essas? A TV colorida PAL-M, a Embratel, o sistema Telebrás, a Portobrás, as usinas de Itaipu, Tucuruí, Sobradinho e tantas outras, o Banco Central, os primeiros metrôs, a ponte Rio-Niterói etc. As dívidas de FHC e Lula foram muito superiores às dos militares, e o que estes fizeram de excepcional, além de doar um Paraná inteiro ao messetê e conceder bolsas-famílias a quem não precisa, mas que se revelou esperto sistema de voto de cabresto para o petismo? Você por acaso sabe qual a dívida atual do Brasil, tanto a externa (que Lula disse que tinha pago) e a interna?
Deixa de ser embusteiro, André Brizola. Não há como você brigar contra os fatos. O currículo de Brizola está aí abaixo. Não há chororô que modifique isso!
Att,
F. Maier
G-11- Grupo dos Onze, ou Grupo dos Onze Companheiros: “comandos nacionalistas”, que foram formados em todo o Brasil em 1963, a mando do ex-governador gaúcho Leonel Brizola. Os G-11 seriam o embrião do Exército Popular de Libertação (EPL). Um documento do Grupo afirmava que os G-11 seriam a “vanguarda do movimento revolucionário, a exemplo da Guarda Vermelha da Revolução Socialista de 1917 na União Soviética”. (Prova a ignorância de Brizola, pois em 1917 havia apenas a Rússia, não a URSS.) Quando ocorreu a Contrarrevolução de 1964, havia centenas desses Grupos espalhados em todo o País e tinham como missão eliminar fisicamente todas as autoridades do Brasil – civis, militares e eclesiásticas, como se pode ler nas “Instruções secretas” do EPL e seus G-11, no item 8, “A guarda e o julgamento de prisioneiros”: “Esta é uma informação para uso somente de alguns companheiros de absoluta e máxima confiança, os reféns deverão ser sumária e imediatamente fuzilados, a fim de que não denunciem seus aprisionadores e não lutem, posteriormente, para sua condenação e destruição” (AUGUSTO, 2001: 112).
BIBLIOGRAFIA:
AUGUSTO, Agnaldo Del Nero. A Grande Mentira. Biblioteca do Exército Editora, Rio de Janeiro, 2001.
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