O caso Rosenberg 50 anos depois
Carlos I. S. Azambuja
22/04/2004
(Nikita Kruschev, “As Fitas da Glasnost”, página 253, Edições Siciliano, 1991)
Igor Gussenko, funcionário encarregado da criptografia da Inteligência Militar soviética (GRU) na embaixada da URSS no Canadá, com sua deserção, em setembro de 1945, foi o estopim que desencadeou a caça aos espiões atômicos nos EUA e Grã-Bretanha.
Durante décadas a inocência do casal Rosenberg foi uma crença generalizada. Sustentando que eles haviam sido vítimas de uma farsa judicial, as esquerdas americanas, como as de todo o mundo, apresentaram os Rosenberg como mártires, sacrificados no altar da intolerância ideológica.
O caso Rosenberg tem todos os ingredientes de um thriller: espionagem, política e politicagem, perseguição, amor, ideologia, mentiras, traição, maquinações e, finalmente, um final trágico para Julius e Ethel Rosenberg, na cadeira elétrica, em 19 de junho de 1953, uma sexta-feira, no presídio de Sing-Sing, nas cercanias de Nova York.
Escreveu William Douglas, um dos juízes que atuou no caso Rosenberg, em seu livro de memórias “The Court Years” (“Os Anos de Tribunal”), que Emanuel Bloch (Manny Bloch), principal advogado de defesa – também judeu e também membro do Partido Comunista americano – deixou-lhe a impressão de que, conforme o consenso comunista da época entendia ser melhor para a causa, se os Rosenberg pagassem o preço mais alto, preferindo ver seus clientes mortos. Ainda hoje, 50 anos após os fatos, a atuação de Emanuel Bloch – às vezes tímida e sem criatividade, outras vezes vacilante, subserviente a promotores e juízes – é motivo de conjecturas, uma das quais é a de que fosse um instrumento dissimulado do FBI!
A descoberta dos Rosenberg e de David Greenglass decorreu após os britânicos terem prendido o físico Klaus Fuchs sob a acusação de passar segredos atômicos à URSS. Pressionado, Klaus Fuchs entregou Harry Gold que havia mantido contatos com Greenglass e Julius nos EUA. No dia seguinte à prisão de Harry Gold, Moscou autorizou à rezidentura entregar 10 mil dólares a Julius e David, instruindo-os a que viajassem para o México, onde receberiam novos documentos, e daí para a Suécia. Essa viagem nunca se concretizou.
Os Rosenberg escreveram 568 cartas na prisão, as quais foram reunidas no livro “The Rosenberg Letters”, editado por Michael Meeropol, o filho mais velho do casal. Os textos dessas cartas são infectados de retórica ideológica. Eles escreveram como quem discursa, como quem se dirige aos pósteros, à eternidade.
A vasta documentação disponibilizada pela abertura dos arquivos da ex-União Soviética, as mensagens Venona, tornadas públicas pelo governo americano quatro décadas após a sua decodificação, e as revelações feitas pelo espião russo Aleksandr Feklissov em sua recente autobiografia, jogaram uma luz definitiva sobre o caso.
O mais bem guardado segredo militar norte-americano – a bomba atômica (Projeto Manhattan) - teve o mesmo destino. Através de Julius Rosenberg os soviéticos obtiveram dados preciosos que lhes permitiram saltar etapas, avançar em suas próprias pesquisas e detonar seu primeiro artefato nuclear já em 1949, apenas 4 anos depois das bombas americanas em Hiroshima e Nagasaki.
Ao lhes ser aplicada a sentença da pena de morte, em 1951, Julius tinha 35 anos Ethel, 37. A última pessoa a ver os Rosenberg antes da execução foi o rabino Irving Koslowe, que lhes levou um recado do Secretário de Justiça, Herbert Brownel Jr: se dessem um único nome de seus parceiros na espionagem, a execução seria suspensa pelo presidente. Julius Rosenberg e Ethel Rosenberg não deram nenhum nome.
No final do verão de 1996, Aleksandr Feklissov retornou a Nova York a fim de participar de um documentário sobre os Rosenberg produzido pelo canal Discovery. Depois dirigiu-se ao cemitério Wellwood e, em frente ao túmulo de Julius e Ethel, em posição de sentido, disse, em voz alta: “Julius e Ethel, aqui estou eu diante de suas sepulturas para prestar meus respeitos. Vocês nos ajudaram fielmente, com devoção e bravura, durante a guerra sangrenta contra nosso inimigo, a Alemanha nazista. Seremos eternamente gratos a vocês! Perdoem-nos por não termos sabido salvar suas vidas. Que a glória e a paz estejam com vocês para sempre”.
Fonte: https://www.usinadeletras.com.br/exibelotexto.php?cod=68267&cat=Ensaios&vinda=S
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