23 de Outubro de 2006 Filosofia política
A idiotia latino-americana
de Plínio Apuleyo Mendoza, Carlos Alberto Montaner e Álvaro Vargas Llosa
Diversos, 2005, 364 pp.
Acredita que somos pobres porque eles são ricos e vice-versa, que a história é uma bem-sucedida conspiração dos maus contra os bons, onde aqueles sempre ganham e nós sempre perdemos (em todos os casos, está entre as pobres vítimas e os bons perdedores), não se constrange em navegar no espaço cibernético, sentir-se online e (sem perceber a contradição) abominar o consumismo. Quando fala de cultura, ergue a seguinte bandeira: “O que sei, aprendi na vida, não em livros; por isso, minha cultura não é livresca, mas vital”. É o idiota latino-americano.
Eis a descrição do idiota na apresentação, redigida pelo escritor peruano Mário Vargas Llosa, a este libro. Intencionalmente polêmico, o livro traça, com humor ferino, o perfil do sujeito que freqüentou universidade e, depois, passou a militar nos sindicatos, nos partidos, nas ongs e outras associações que se dizem sociais. De quebra, destrói impiedosamente a galeria de mitos revolucionários e heróis populistas que infestaram a região.
A idiotia latino-americana, diz ainda o apresentador, é deliberada e de livre-escolha:
É adotada conscientemente por preguiça intelectual, apatia ética e oportunismo civil. É ideológica e política, mas acima de tudo frívola, pois revela uma abdicação da faculdade de pensar por conta própria, de cotejar as palavras com os fatos que pretendem descrever, de questionar a retórica que faz as vezes de pensamento.
Não parece uma descrição fiel da intelectualidade brasileira que se diz “esquerdista”?
O idiota latino tem sempre uma biblioteca política. Afinal, é bom leitor, ainda que só leia livros ruins. “Não lê da esquerda para a direita” — escarnecem os autores —, “como os ocidentais, nem da direita para esquerda, como os orientais. Dá um jeito para ler da esquerda para a esquerda. Pratica a endogamia e o incesto ideológico”.
Mas o que lê o nosso idiota? O livro cita algumas obras, considerando uma delas a bíblia da idiotia: As Veias Abertas da América Latina, do escritor uruguaio Eduardo Galeano, que tem devastado cabeças desde os anos 70. Ainda é levado a sério por muita gente e recomendado a alunos por professores idiotas. As outras obras são: A História me Absolverá, de Fidel Castro; Os Condenados da Terra, de Frantz Fanon; A Guerra de Guerrilhas, de Ernesto (Che) Guevara; o onipresente Os Conceitos Elementares do Materialismo Histórico, de Marta Harnecker; O Homem Unidimensional, de Herbert Marcuse (um ataque à “civilização industrial”); Para ler o Pato Donald, de Ariel Dorfman e Armand Mattelart (obrigatório nas escolinhas de comunicação nos anos 70); e Para uma Teologia da Libertação, de Gustavo Gutiérrez.
Dois brasileiros contribuem para a formação do idiota latino-americano: Fernando Henrique Cardoso que, com Enzo Faletto, escreveu Dependência e Desenvolvimento na América Latina (que dividiu o mundo entre “centro” e “periferia”), e Frei Betto, apóstolo da teologia da libertação no Brasil e “conselheiro espiritual” do presidente Lula. FHC, como se sabe, tomou o rumo da civilização; já o frei continua escrevendo bobagens nos jornais (exemplos: “Cuba é o único país onde a palavra “dignidade” tem sentido”; “Em nossos países se nasce para morrer. Em Cuba, não!”).
Manual do Perfeito Idiota Latino-Americano foi lançado em 1996 e traduzido pela Bertrand Brasil, do Rio de Janeiro (está na 5.ª edição, de 2005). Vale a pena a ler. Quem já foi idiota em outros tempos — como este escrevinhador — dará boas gargalhadas lembrando da juventude; outros, percebendo-se ainda na idiotia, poderão pelo menos começar a criticar-se a si próprios. Mas, não nos enganemos, há os irredutíveis, aqueles que jamais abandonarão a condição.
Orlando Tambosi
Fonte: https://criticanarede.com/leit_idiotice.html
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