As ONGs do PT
Nos últimos anos, cada vez mais Organizações Não Governamentais, as chamadas ONGs, têm assumido funções do Estado, executando programas de assistência social ou de capacitação profissional. E quase sempre com recursos federais, obtidos através de convênios ? desde 2001, foram nada menos que R$ 13,4 bilhões. No governo Lula, que repassou R$ 8 bilhões às ONGs, esse fenômeno tem despertado uma nova preocupação: a de que as entidades seriam apenas fachada para o desvio puro e simples de recursos. Dois casos recentes levantaram essas suspeitas e envolvem petistas ligados ao escândalo da compra do dossiê contra os candidatos do PSDB. O primeiro diz respeito a Jorge Lorenzetti, churrasqueiro oficial do presidente Lula, que foi um dos criadores, em 1996, da Fundação Unitrabalho, voltada para capacitação técnica em universidades. Desde o início do mandato petista, a entidade ligada a Lorenzetti recebeu R$ 18,5 milhões. ?O Jorge já não faz parte do nosso quadro?, defende Nazem Nascimento, diretor da Unitrabalho. O outro caso é o de Hamilton Lacerda, ex-coordenador da campanha de Aloízio Mercadante ao governo de São Paulo e apontado como o homem que carregava a mala contendo R$ 1,7 milhão para a compra do dossiê. Lacerda era um dos colaboradores da ONG Politeuo, de São Caetano, que recebeu R$ 1,69 milhão do governo. A Politeuo também mantinha negócios com a Petrobras e a prefeitura de Santo André.
Em comum às ONGs de Lorenzetti e Lacerda está a relação com o programa Primeiro Emprego. Dos R$ 96,2 milhões repassados pelo governo federal para o programa, entre 2004 e 2006, 59% foram para entidades representadas por petistas. As 13 ONGs ligadas ao partido receberam R$ 56,6 milhões. Outras 16 entidades, em que petistas não estão como dirigentes, receberam R$ 39,6 milhões. O que impressiona ainda mais é que o programa, criado para inserir 260 mil jovens por ano no mercado de trabalho, chegou a capacitar apenas 62 mil. E mesmo assim não há qualquer prova de que isso foi feito, já que o Ministério do Trabalho se recusa a fornecer a lista com os beneficiados com o programa. ?Não existe transparência alguma?, diz o senador Heráclito Fortes (PFL-PI), que está recolhendo assinaturas para instalar uma CPI das ONGs ainda em 2006. ?Por trás de todo episódio escabroso, existe um petista financiado pelo Estado?. Além dos exemplos de Lorenzetti e Lacerda, o senador cita o caso do arruaceiro Bruno Maranhão, do MLST, que comandou a depredação do Congresso Nacional e também recebe recursos do governo federal por meio de ONGs.
Mas o valor entregue às entidades ligadas ao PT é ainda maior do que o que foi repassado às ONGs de Lorenzetti e Lacerda. Outra relação considerada suspeita é a da ONG Oxigênio, dirigida por Francisco Dias Barbosa, velho amigo do presidente Lula. Um dos 974 contribuintes do PT em cargos de confiança, Barbosa foi tesoureiro do Sindicato dos Metalúrgicos e assessor de Jair Meneghelli, presidente do Sesi, o serviço social da indústria. À frente da Oxigênio, Barbosa conseguiu R$ 7,4 milhões do governo. Nos convênios ? todos sem licitação ? a entidade propôs capacitar 4 mil jovens na região de Guarulhos para o Primeiro Emprego. O programa do Ministério do Trabalho, comandado por Luiz Marinho, amigo pessoal de Barbosa, não alçou vôo e foi abandonado pelo governo. Ainda assim, a Oxigênio foi a terceira ONG entre as que mais receberam recursos para o Primeiro Emprego.
Outra que certamente será alvo de investigação do Ministério Público é a Saber. Comandada por Raimundo Ferreira da Silva, vice-presidente do PT em Brasília, a ONG firmou convênios com a Secretaria de Trabalho do Estado do Rio de Janeiro, no governo de Benedita da Silva, Ministério do Trabalho, Banco do Brasil e Infraero, já no governo Lula. Os contratos chegaram a R$ 2,5 milhões. Raimundo Ferreira é personagem conhecido em Brasília. Ex-assessor do deputado Paulo Delgado, ele sacou R$ 200 mil das contas de Marcos Valério de Souza. Antes dele, no entanto, quem presidia a Saber e firmou a maioria dos convênios foi Ivan Guimarães, ex-presidente do Banco Popular do Brasil e auxiliar de Delúbio Soares na tesouraria do PT. Mais: o atual vice-presidente da ONG é Sidiclei Patrício. Ex-membro representante da CUT no Conselho Deliberativo do FAT, Sidiclei atuava nas duas pontas. Era membro do conselho do FAT e recebeu recursos do mesmo FAT em pelo menos um projeto onde a ONG Ágora, do amigo do presidente Lula, Mauro Dutra, o subcontratou através do consórcio Gente Estrela para o programa Primeiro Emprego. O Tribunal de Contas da União detectou irregularidades tanto no caso do Rio de Janeiro, em 1999, quanto no consórcio com a ONG de Mauro Dutra, em 2004. No convênio com a Infraero, realizado também em 2004, Sidiclei é apontado como o responsável pelo planejamento e acompanhamento de projetos para os moradores atingidos pelas desapropriações das áreas destinadas a ampliação dos aeroportos de Guarulhos e Viracopos, em Campinas. O contrato de R$ 806 mil está sendo analisado pelo TCU. ?Não há regras que regulem e cobrem efetivamente a correta aplicação do dinheiro?, analisa o cientista político Paulo Kramer. ?Não dá pra misturar tudo em um saco só, mas que existem ONGs suspeitas, isso não dá pra negar?.
Fonte:
https://www.istoedinheiro.com.br/noticias/economia/20061004/ongs/14717
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