Sonho de Uma Tarde de Outono
Félix Maier
03/04/2007
Maneco das Dores trabalhou a manhã toda no computador,
tentando mais uma vez dar um fecho interessante em sua obra de auto-ajuda,
“Homem é Fusca, Mulher é Porsche”.
Depois do almoço, Maneco foi assistir o noticiário da TV
Globo, que ninguém é de ferro, e acabou cochilando depois de ver uma entrevista
com Romário, “o cara”, em busca do milésimo gol.
No sonho, finalmente Maneco entregou os originais de seu
trabalho à Companhia das Letras, que em pouco tempo distribuía o Fusca e o
Porsche a todas as livrarias do Brasil.
O sucesso da obra de Maneco foi instantâneo. Não havia mais
tempo para ele conceder tanta entrevista aos jornais, tevês, rádio, Orkut e
blogs de cronistas famosos. Em poucas semanas, “Homem é Fusca, Mulher é
Porsche” atingiu o topo da lista dos mais vendidos da revista Veja. Não havia
caderno C de jornal que não comentasse o livro de Maneco.
José Saramago pediu que editores portugueses publicassem
imediatamente a obra de Maneco. O Nobel de Literatura disse que aquele era “o”
livro que gostaria de ter escrito. Xanana Gusmão, presidente do Timor Leste,
também soube do sucesso literário e pediu um exemplar a um amigo da embaixada
brasileira, com dedicatória, que se virasse!
Maneco foi convidado para tomar o chá das cinco no Petit
Trianon, no Rio, onde Ivo Pitanguy sugeriu que o mais novo escritor de sucesso
fosse escolhido como futuro membro da confraria – obviamente, depois que alguém
batesse as botas. Concordaram com a idéia os simpáticos velhinhos e velhinhas
presentes ao chá-com-torradas da Academia Brasileira de Letras. A propósito,
louve-se a ABL por convidar favelados e rappers para o chazinho das cinco.
Obras como as do “sensível” rapper carioca Mr. Catra, do CD pirata “Proibidão”,
tocada com sucesso na Rádio Comunitária do Morro Azul, Jacarezinho, não podem
ficar fora da antologia brasileira de letras:
“Cachorro (PM),
Se quer ganhar um dindim (dinheiro),
Vende o X-9 (delator) pra mim.
O patrão (chefe do tráfico) tava preso,
Mas mandou avisar
Que a sua sentença nós vamos executar,
E com bala HK (fuzil)”.
Ou ainda:
“Não corre
Não treme,
Mete bala na PM”.
A maratona de Maneco estava apenas começando. Ele era
solicitado para autografar em muitas feiras do livro, nas mais diferentes
cidades brasileiras. Colégios e universidades eram instados pela mídia a
participar dos eventos literários em que Maneco aparecia. Na Festa Literária
Internacional de Paraty, cidade histórica do Estado do Rio de Janeiro, Maneco
encontrou-se com Paulo Coelho, que lhe deu de presente uma espada de cossaco,
que havia adquirido na Rússia durante a viagem que fizera pela Transiberiana em
companhia de Glória Maria, da TV Globo. Era para dar sorte – disse o alquimista
brasileiro -, para abrir caminho no meio dos inimigos, que sempre aparecem
quando alguém faz sucesso.
Até Lula, o Erótico, que falou em etanol e ponto “G” com
Bush, quando este veio ao Brasil, chamou Maneco para tomar uma branquinha no
Palácio do Planalto, trazida das Alterosas pelo vice, Zeca Alencar. Alencar foi
aquele que disse que dona Matilde, ministra da Desigualdade Racial, não é
racista, por ter afirmado que não é racismo negro ter preconceito contra
branco, já que foi “açoitado a vida inteira”. O bloco Siri na Lata, de Recife,
convidou dona Matilde a açoitar cinco brancos no próximo carnaval. Para isso,
vai alugar um Porsche para dona Matilde e um Fusca conversível para cinco
brancos.
Maneco estava autografando mais um livro com sua frase
preferida, extraída do livro, quando foi subitamente acordado pela mulher:
- Maneco, deixa de ser preguiçoso, pára de dormir e vá lavar
a louça! Já!
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