TRIBUNAL DELIVERY
Gen Ex Refm Rômulo Bini Pereira
Os constituintes de 1988 e os brasileiros que acompanharam os debates legislativos na elaboração da Constituição Federal estão, hoje, surpresos e totalmente decepcionados, pelo momento atual do nosso Poder Judiciário. Nos estudos e debates realizados, à época, dois temas constituíram os focos dos parlamentares: a necessidade de agilização dos processos jurídicos e o papel do Supremo Tribunal Federal. Com o objetivo de acelerar os trâmites judiciais, reformou-se a estrutura de nosso Judiciário. Substituiu-se o Tribunal Federal de Recursos (TFR) pelo Superior Tribunal de Justiça (STJ). Deu-se a este uma atuação jurídica mais ampla a fim de amparar os novos direitos estabelecidos pela Constituição Cidadã. Em seguida, foram criados, ainda, os Tribunais Regionais Federais (TRF), os quais, na visão dos constituintes, corresponderiam a uma instância de caráter finalístico (segunda instância). Esta nova situação desafogaria os tribunais superiores STJ e STF.
Tendo como objetivo maior a guarda da Constituição (Art 102 – CF), caberia, então, de forma precípua, ao Supremo Tribunal Federal – pilar do Estado Democrático de Direito – julgar os casos em que se verificassem afrontas ao texto constitucional. No presente, no entender de muitos brasileiros, inclusive juristas, esses objetivos não foram atingidos, e o pior, agravados e deteriorados. Data vênia, a justiça continua lenta e o STF com um acúmulo inimaginável e intolerável de processos, muitos dos quais, voltados para a satisfação de interesses personificados de entidades ou indivíduos e onde, nem sempre, a imparcialidade está presente.
Inúmeras razões levaram a justiça brasileira ao lamentável estado em que se encontra atualmente; e uma delas permite o esgotamento de recursos em todas as suas instâncias (trânsito em julgado). Trata-se de uma infeliz permissão do STF (votação em plenário 6X5), pois beneficia aqueles réus que podem contratar “bons” advogados. A imensa maioria dos brasileiros, todavia, não possui condições financeiras para esse acompanhamento advocatício. Assim, essa espécie de justiça favorece os interesses dos mais ricos em detrimento dos menos favorecidos. Há inúmeros casos que podem servir de exemplo. O rumoroso caso conhecido como Crime de Unaí (2004) e condenação em segunda instância de um político que chegou a ter assento na cadeira presidencial.
Deste modo, um ladrão de galináceo, condenado em primeira instância, poderá ter o seu processo conduzido até o STF. Já, em muitos casos de relevância, como, por exemplo, os processos da Operação Lava Jato, o povo brasileiro acompanha diuturnamente, estarrecido, os recursos e contrarrecursos proferidos pelo nosso Poder Judiciário em todas as suas instâncias. Essa profusão de recursos conduz a nossa mais Alta Corte a análises e decisões que não se enquadram em sua missão principal de guarda da Carta Magna.
Tendo como pano de fundo um comércio de mercadorias, a Corte Suprema deveria atuar no atacado e não no varejo. Não é um tribunal concebido para proferir decisões de pronta-entrega, como se fosse um “Tribunal Delivery”. E ainda, cabe destacar a contumaz e inexplicável protelação que conduz à prescrição de processos. Nesse norte, os escritórios de advocacia, cada vez mais especializados, optam, não por provar a inocência do julgado, mas sim pela prescrição do processo, pois provar a inocência seria impossível.
Não se compreende como nossos tribunais, com uma estrutura de apoio administrativo e equipes de assessores jurídicos – considerados os maiores do mundo –, permitem prescrições de processos judiciais de alto valor político e econômico para o nosso país. Nossos legisladores, caso tenham coragem, poderiam, em legislação específica, responsabilizar aqueles que permitem tais prescrições, sob a sua responsabilidade. A prescrição, principalmente nos casos envolvendo corrupção nos agentes públicos em todos níveis – matéria constante em todas as mídias –, é um crime de lesa-pátria contra o povo brasileiro.
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