Nome Completo: Nílton de Albuquerque Cerqueira
Tipo: BIOGRAFICO
Texto Completo:
CERQUEIRA, Nílton
*militar; dep. fed. RJ 1995, 1997, 1998-1999
Nílton de Albuquerque Cerqueira nasceu em Maceió no dia 6 de junho de 1930, filho de Nélson de Albuquerque Cerqueira e de Elita de Albuquerque Cerqueira.
Estudou num colégio de irmãos maristas em Fortaleza e ainda criança mudou-se para o Rio de Janeiro. Ingressou em 1952 na Academia Militar das Agulhas Negras, em Resende (RJ), saindo aspirante em 8 de maio de 1954. Declarado segundo-tenente em 25 de dezembro desse ano, foi promovido a primeiro-tenente em 25 de dezembro de 1956, a capitão em 25 de dezembro de 1959 e a major em 25 de agosto de 1967. Cursou, de 1967 a 1969, a Escola de Comando e Estado-Maior do Exército (ECEME), no Rio de Janeiro.
Comandava em 1971 o Destacamento de Operações de Informações do Centro de Operações de Defesa Interna (DOI-CODI) de Salvador quando chefiou a Operação Pajussara, que resultou na morte de vários militantes de esquerda, inclusive do ex-capitão do Exército Carlos Lamarca, então líder do Movimento Revolucionário 8 de Outubro (MR-8), organização clandestina que fazia oposição ao regime militar instalado no país em abril de 1964. Recebeu, por isso, a Medalha do Pacificador com Palma, do Ministério do Exército, atribuída a muitos participantes da repressão política.
Teve também participação destacada na repressão ao movimento guerrilheiro desencadeado pelo Partido Comunista do Brasil (PCdoB) na região do Araguaia entre 1972 e 1975. Em operação realizada sob seu comando, foi morto, em dezembro de 1973, o grupo dirigente do movimento. Durante o governo do general Ernesto Geisel (1974-1979), foi condecorado, em 1974, pelo Ministério da Aeronáutica, com a medalha do mérito Santos Dumont, e pelo Ministério da Marinha, com a medalha do mérito Tamandaré. Em 25 de dezembro desse mesmo ano foi promovido a tenente-coronel e, no ano seguinte, recebeu do Ministério das Relações Exteriores a Ordem do Rio Branco.
De 1977 a 1980 comandou o Regimento Sampaio, no Rio de Janeiro. Em 31 de agosto desse último ano foi promovido a coronel, e em 1981 assumiu o comando da Polícia Militar fluminense, durante o governo de Antônio de Pádua Chagas Freitas (1979-1983). Medidas assistenciais a viúvas de policiais mortos, bem como as premiações por “bravura” marcaram sua passagem no comando da PMERJ. Notabilizou-se também pelo grande número de oficiais que puniu por envolvimento em corrupção, alguns dos quais foram submetidos à execração pública. Episódios como os casos de tortura no presídio da Ilha Grande denunciados pelo cardeal dom Eugênio Sales e a revista constante de freiras da Pastoral Penal, entre outros, levaram a gestão de Cerqueira à crise.
Em fins de abril de 1981, negou-se a enviar tropas para garantir a segurança do show comemorativo do Dia do Trabalho que se realizaria no Riocentro sob o patrocínio do Centro Brasil Democrático (Cebrade), entidade de oposição ao governo militar. Os organizadores esperavam uma platéia de mais de 20 mil pessoas, que de fato compareceram ao evento, na noite de 30 de abril. Durante o espetáculo, uma bomba explodiu no interior de um automóvel parado no estacionamento, matando um de seus ocupantes e ferindo gravemente o outro. Como ambos eram militares e estavam fora de serviço e à paisana, estabeleceu-se a suspeita de que estavam envolvidos numa tentativa de atentado à platéia. Inquirido a respeito das razões de sua recusa em enviar policiamento, Cerqueira disse ter considerado que não valia a pena deslocar soldados da PM para a festa, “ainda mais porque o espetáculo tinha o patrocínio de um organismo de tendências marxistas”. Foi aberto um inquérito sobre o caso, que seguiu um rumo tortuoso. Ao final, ninguém foi responsabilizado.
Divergências com as autoridades de segurança do estado em relação ao jogo do bicho, para o qual defendia uma ação repressiva mais rigorosa, resultaram na sua exoneração em 1982.
Adido militar na Embaixada do Brasil em Quito de 1983 a 1985, foi promovido a general-de-brigada em março de 1987 e assumiu então o comando da Brigada Escola, no Rio de Janeiro, que exerceu até 1990. Já na reserva, foi presidente do Clube Militar, no Rio de Janeiro, por dois períodos, de 1990 a 1994. Nessa condição, proclamou a legitimidade dos manifestos divulgados em meados de 1993 por grupos de oficiais — em sua maioria da reserva —, em protesto contra o governo federal, a corrupção política e o caos social. Observando que muitos desses oficiais eram membros do Clube Militar, considerou as críticas válidas, democráticas e inspiradas no patriotismo, e afirmou que sua divulgação era um exercício do direito de expressão dos militares da reserva sobre assuntos políticos.
Filiado desde 1993 ao Partido Progressista (PP), em outubro de 1994, com o apoio da coligação entre o PP e o Partido da Social Democracia Brasileira (PSDB), candidatou-se a deputado federal pelo Rio de Janeiro, obtendo a primeira suplência. Anulada essa eleição por suspeita de fraude, elegeu-se na segunda votação, no mês seguinte, com o apoio de uma base eleitoral formada por companheiros de farda. Empossado em fevereiro de 1995, exerceu o mandato por três meses, durante os quais integrou as comissões de Defesa Nacional e do Interior. Licenciou-se em maio de 1995, ainda no início da gestão do governador do Rio de Janeiro, Marcelo Alencar (1995-1998), para assumir a Secretaria de Segurança do estado, em substituição ao general Euclimar Lima da Silva. Sua vaga na Câmara foi ocupada pelo suplente Airton Xerez, do PSDB. Ao tomar posse como secretário de Segurança, afirmou que iria ocupar as favelas do Rio para pôr fim à violência e acusou o Grupo Tortura Nunca Mais/RJ, entidade de defesa dos direitos humanos, de fazer “denúncias levianas, sem maiores responsabilidades”, e integrar “centrais de ódio”. Indignado com a sua nomeação, em 19 de maio de 1995 o Tortura Nunca Mais solicitou às entidades de direitos humanos que enviassem ao governador mensagens de repúdio a Cerqueira.
Incumbido pelo governador de restabelecer a ordem no estado, em meio a uma onda de sequestros e ações violentas de traficantes de drogas, anunciou, em agosto de 1995, um plano de moralização da Polícia Civil que despertou violentas resistências da corporação. Delegados e detetives boicotaram o trabalho, organizaram manifestações de protesto em frente à chefia da Polícia Civil, e Nílton Cerqueira chegou a sofrer ameaças de morte. Durante sua gestão na secretaria, a Polícia Militar adotou medidas que despertaram muita polêmica: a gratificação e a promoção por bravura, a licença para o uso de uma segunda arma pelos policiais em serviço, e a averiguação sumária, ao invés de inquérito policial completo, para apurar os casos de homicídios envolvendo policiais militares. Nesse período, os homicídios registraram o maior crescimento da década de 1990 no estado, graças à chamada “gratificação faroeste” – como ficou conhecida a gratificação incorporada ao salário de policiais, caso se destacassem em ações que demonstrassem “mérito especial”.
À frente da Secretaria de Segurança Pública, Cerqueira iniciou uma política de desmonte em relação a vários projetos anteriores ligados aos governos de Leonel Brizola. O programa de policiamento comunitário, em especial, sucumbiu antes mesmo de uma avaliação crítica dos resultados alcançados. Nilton Cerqueira, defendendo a bandeira do “endurecimento policial”, não teve grandes dificuldades em desmontar tal iniciativa em poucos meses. A patrulha comunitária implementada em Copacabana no ano de 1993 foi desativada sob pretexto da “urgência” de se “confrontar” o “crime organizado” no Rio de Janeiro. À época, Cerqueira afirmou: “imagine um cara lá, conversa com a vovó, ajuda o outro a atravessar a rua, isso não resolve, tem que ter um carro com um monte de gente, com cara feia, com umas metralhadoras saindo pela janela, tipo a ROTA, em São Paulo, que é isso que vai diminuir o roubo de bancos e o sequestro”.
Em novembro de 1996, o Tribunal Superior Eleitoral (TSE) decidiu anular a eleição de novembro de 1994 e restabelecer o resultado do pleito de outubro. Alegando falta de fundamentação nas denúncias de fraude, o tribunal deu ganho de causa aos recursos impetrados pelos candidatos prejudicados com a decisão de realizar nova votação. De acordo com o resultado da primeira eleição de 1994, Cerqueira voltou à condição de primeiro suplente. Continuou como secretário e só voltou ao Legislativo em abril de 1998, tornando-se membro da Comissão de Viação e Transportes da Câmara.
Em outubro desse ano, já filiado ao PSDB, tentou reeleger-se, mas não foi bem-sucedido. Em novembro, votou favoravelmente aos destaques da reforma da previdência que propunham o estabelecimento de um teto para as aposentadorias do funcionalismo público e a adoção dos critérios de idade mínima e de tempo de contribuição na concessão dos benefícios para o setor privado. Deixou a Câmara em janeiro de 1999, ao término da legislatura.
Em junho de 2007, Cerqueira se declarou contrário à indenização concedida pela Comissão de Anistia à viúva e aos filhos de Carlos Lamarca, que havia morrido durante a Operação Pajussara, por ele comandada. Em seu entender, Lamarca deveria ser considerado “um traidor, desertor, assaltante e assassino”. Esta comissão havia sido criada com o objetivo de analisar pedidos de indenização formulados por pessoas que foram impedidas de exercer atividades econômicas por motivação exclusivamente política de setembro de 1946 a outubro de 1988, e instalada pelo Ministério da Justiça, em agosto de 2001.
Anos mais tarde, em maio de 2012, foi instituída a Comissão Nacional da Verdade (CNV), criada pela Lei 12528/2011, criada com a finalidade de examinar e esclarecer casos de violação de direitos humanos ocorridos também entre os anos de 1946 e de 1988. A proposta, parte do Programa Nacional de Direitos Humanos, gerou críticas de diversos setores, principalmente nas Forças Armadas. Alguns dos pontos mais polêmicos do programa encontravam-se no chamado Eixo Orientador VI, que propunha medidas sobre o “Direito à Memória e à Verdade” em relação ao período da ditadura militar. Ao longo de seus trabalhos, a CNV, em novembro de 2013, convocou o general Nilton Cerqueira a fim de prestar esclarecimentos. Para a comissão teriam surgido novos indícios de que o Exército executara presos políticos na Guerrilha do Araguaia. Questionado sobre os combatentes que foram capturados com vida e desapareceram, Cerqueira afirmou, em depoimento “reservado”, que “prender os terroristas não era uma opção”.
Em fevereiro do ano seguinte, o Ministério Público Federal (MPF) responsabilizou Nilton Cerqueira pelo atentado no Riocentro no ano de 1981, além de outros oficiais reformados. No mês seguinte, cerca de cinquenta pessoas realizaram um protesto em frente à casa de Cerqueira, em Copacabana. O grupo gritou palavras de ordem, além de encenar uma cena de tortura com afogamento. O protesto foi motivado pela aproximação do aniversário de 50 anos do golpe civil-militar de 1964.
Nilton Cerqueira reuniu-se, novamente, com membros da Comissão Nacional da Verdade em julho de 2014. Os integrantes da comissão fizeram dez perguntas, abordando sua participação na repressão durante a ditadura. A expectativa era de que o militar falasse sobre o episódio do Riocentro e também sobre a Operação Pajussara. Acompanhado de seu advogado, o general se manteve calado, vetou a participação da imprensa e, por fim, garantiu que nada tinha a declarar sobre tais episódios. Cerqueira teria se pronunciado apenas em duas ocasiões: quando exigiu que a imprensa se retirasse pois, segundo ele, a mídia estaria distorcendo os fatos, e, em outro momento, ao qualificar de absurda a investigação de episódios cerca de 30 anos depois. O general também lamentou a ação do MPF movida contra ele com base no seu depoimento prestado a CNV no ano anterior.
Casou-se com Ionete Milesi de Albuquerque Cerqueira, com quem teve quatro filhos.
Renato Lemos/Márcia de Sousa/Bruno Marques
FONTES: CÂM. DEP. Deputados brasileiros. Repertório (1995-1999); CARVALHO, L.M. O coronel rompe o silêncio; DOSSIÊ; Estado de S. Paulo (15/4/87); Folha de S. Paulo (31/1/95, 29/9, 10/10 e 11/11/98); Globo (11/6/93, 20/3/96, 5/2/97 e 7/10/98); Jornal do Brasil (18, 21/5 e 4/8/95); TRIB. SUP. ELEIT. Candidatos (1998); WALLACE DE ALMEIDA; MINC, Carlos. “Crime organizado e política de segurança pública no Rio de Janeiro”. In Revista Arché, Rio de Janeiro: Faculdade de Direito Candido Mendes, ano VII, n° 9, 1998, p. 188; Jornal O Globo – edições de 10 de fevereiro de 1982 (p. 11), de 11 de fevereiro de 1982 (p. 11), de 12 de fevereiro de 1982 (p. 13) e na de 19 de fevereiro de 1982 (p. 12). Disponível em: http://acervo.oglobo.globo.com. Acesso em: 20/06/13; http://oglobo.globo.com/rio/ancelmo/posts/2012/04/08/o-outro-lado-da-batalha-do-clube-militar-439255.asp. Acesso em: 5 e 6/09/14; http://biblioteca.clacso.edu.ar/gsdl/collect/clacso/index/assoc/D3089.dir/12caldeira.pdf. Acesso em: 5 e 6/09/14; http://odia.ig.com.br/noticia/rio-de-janeiro/2014-03-25/grupo-realiza-protesto-em-frente-a-casa-do-general-nilton-cerqueira.html. Acesso em: 5 e 6/09/14; http://www.mancheteusa.com/imprensa-silenciada-em-depoimento-do-general-nilton-cerqueira. Acesso em: 5 e 6/09/14; http://politica.estadao.com.br/noticias/geral,general-nilton-cerqueira-veta-imprensa-em-depoimento,1535586. Acesso em: 5 e 6/09/14; http://jornalggn.com.br/noticia/procuradores-pedem-36-anos-de-prisao-para-newton-cruz. Acesso em: 5 e 6/09/14; http://www.redebrasilatual.com.br/cidadania/2014/02/ministerio-publico-denuncia-tres-generais-por-atentado-do-riocentro-1981-1246.html Acesso em: 5 e 6/09/14; e http://noticias.terra.com.br/brasil/noticias/0,,OI1692327-EI306,00-Indenizacao+a+viuva+de+Lamarca+revolta+militares.html Acesso em: 5 e 6/09/14.
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