Preâmbulo
24/02/2014
Durante o programa do "Fantástico", da TV Globo, levado ao ar no último 1º de maio [de 2005], houve uma rápida entrevista com o coronel Luís Antônio Ribeiro Prado, designado presidente do Inquérito Policial Militar(IPM) para apurar as explosões no Riocentro ocorridas na noite de 30 de abril para 1º de maio de 1981.
Visivelmente emocionado, o Cel Prado disse ao jornalista que inicialmente julgou que se tratava de um atentado promovido por algum grupo terrorista de esquerda contra os militares de Inteligência que faziam "campana" próximo ao show dos trabalhadores. Porém, à medida que os laudos apresentados foram elucidando o ocorrido, o Cel Prado não teve mais dúvidas de que a explosão dentro do Puma ocorreu devido à falha de manuseio da bomba que se encontrava no colo do sargento Rosário, ocupante do veículo ao lado do capitão Machado.
Pressionado pelas autoridades, que queriam incriminar as esquerdas com um IPM falso, o Cel Prado não se vergou às ameaças feitas e manteve a integridade moral que carregava desde o berço. Foi afastado do Inquérito e internado durante uma semana no Hospital Central do Exército (HCE), por "motivos de saúde". Não foi promovido a general, mas merece todo o reconhecimento da família militar brasileira por não ter traído a nação que um dia jurou defender, até com o risco da própria vida.
Ao Cel Prado os cumprimentos de todos os brasileiros, que também se emocionaram com o depoimento de um verdadeiro oficial do Exército brasileiro, que ainda hoje, já em idade bastante avançada, sente o corpo vibrar como nos tempos de cadete toda vez que ouve o Hino Nacional Brasileiro (F.M).
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O "atentado" do Riocentro
Félix Maier
“Na noite de 30 de abril de 1981, durante um show de música popular para 20 mil jovens, uma bomba explode dentro de um automóvel que manobrava no estacionamento do Riocentro, na Barra da Tijuca. Morto no seu interior o Sargento Guilherme Pereira do Rosário; gravemente ferido abandona o veículo semidestruído o Capitão Wilson Luís Chaves Machado, ambos do Destacamento de Operações de Informações do 1º Exército sediado no Rio de Janeiro. Minutos depois outra bomba, mais poderosa, é lançada e explode próximo à casa de força do Riocentro. Como não atinge o seu alvo, não provoca a escuridão geral que certamente ocasionaria o pânico no recinto fechado do show, com conseqüências fáceis de se imaginar” (Major do Exército Dickson Melges Grael, in “Aventura, Corrupção e Terrorismo – à sombra da impunidade”, pg. 81 e 82).
Vinte e cinco minutos depois da explosão, o Capitão Machado foi levado ao hospital pela neta do Senador Tancredo Neves, Andréa Neves da Cunha, que chegava ao show com o noivo Sérgio Valle. O Capitão é levado ao Hospital Lourenço Jorge, depois ao Hospital Miguel Couto. O perito Humberto Guimarães (“Cauby”) diz aos repórteres que foram recolhidas outras 2 bombas no interior do Puma (placa OT-0279), uma delas destruída pela polícia.
Já no dia 1º de maio, à 1 hora da madrugada, um homem dizendo pertencer ao “Comando Delta” telefona para vários jornais, assumindo a autoria das explosões no Riocentro.
Às 2 horas da madrugada, o corpo do Sargento Rosário é levado para o IML e em seu corpo são encontradas peças de um mecanismo de relógio. Fotos mostrando o estado do Puma e o arrancamento das vísceras do Sargento comprovam que o mesmo manuseava uma bomba por ocasião da explosão, provavelmente em cima da perna direita.
Pela manhã, o General Waldyr Muniz, Secretário de Segurança Pública fluminense, em entrevista, afirma que os 2 militares foram vítimas de atentado e que os “terroristas fugiram em três carros”.
À tarde, o General Gentil Marcondes Filho, Comandante do I Exército, e o Coronel Job Lorena de Sant’Anna comparecem ao enterro do Sargento Rosário – com honras de herói – e ajudam a carregar o ataúde.
O General Gentil nomeia o Coronel Luís Antônio Ribeiro Prado presidente do IPM, para apurar as explosões no Riocentro. Cinco dias antes do prazo para conclusão do IPM, o Cel Prado renuncia por “motivos de saúde” e é substituído pelo Cel Job.
No dia 30 de junho, o Cel Job apresenta o resultado de suas investigações à imprensa, afirmando que os militares “foram vítimas de um atentado e a bomba havia sido feita com um quinto de uma lata de 2,5 litros de óleo Havoline e colocada entre a porta e o banco direito do Puma”.
“O problema do DOI-CODI, da sua sobrevivência, da sua missão especial, das suas prerrogativas – ele mantém prerrogativas que foram negadas ao Congresso Nacional – e que é crucial dentro do processo de democratização a que se devota o Presidente da República. Organismos de emergência, criados para articular as diversas forças empenhadas na repressão à subversão esquerdista e unificar o seu comando, eles sobreviveram à subversão a ponto de abrigar em seus quadros agentes de uma nova subversão, a que pretende impugnar a democratização do país e criar problemas ao Presidente da República e à nação” (Jornalista Carlos Castello Branco, em sua coluna no “Jornal do Brasil” – 6 Jun 1981).
No dia 30 de abril de 2001, 20 anos após o “acidente de trabalho”, o crime prescreveu e nenhum dos envolvidos poderá ser processado.
“ENTENDA O CASO RIOCENTRO
30 de abril de 1981
Duas bombas explodem no Riocentro, centro de eventos no Rio, durante show comemorativo do Dia do Trabalho. Uma das bombas explode dentro de um Puma no estacionamento do Riocentro. O sargento Guilherme Pereira do Rosário morre. O capitão Wilson Luiz Chaves Machado tem o abdome dilacerado
Jun/81
Relatório sobre o atentado inocenta o sargento e o capitão. O inquérito sobre o caso é arquivado
Nov/96
João Baptista Figueiredo, presidente na época das explosões, admite que houve participação de militares no atentado
Jun/99
A procuradora da República Gilda Berger afirma, em parecer, que o caso não está prescrito, e o Ministério Público Militar estuda a reabertura do inquérito
Jul/99
O Exército abre novo IPM (Inquérito Policial Militar) para apurar a responsabilidade pelas explosões
Out/99
O IPM indicia quatro pessoas: o general reformado Newton Cruz, ex-chefe da Agência Central do SNI (Serviço Nacional de Informações), Wilson Machado, o sargento Guilherme Pereira do Rosário e o coronel Freddie Perdigão
Mar/2000
Cruz é acusado de falso testemunho sobre o caso. O STM (Superior Tribunal Militar) aceita a denúncia e marca o depoimento de Cruz
Abril/2000
O STF (Supremo Tribunal Federal) concede liminar suspendendo o depoimento e suspende a tramitação do processo
Maio/2000
O Supremo decide manter arquivado o processo contra Cruz”
(Folha de S. Paulo – 16/04/2001)
Antecendentes
Antes do Atentado do Riocentro, nos anos de 1980 e 1981, durante 16 meses, houve 40 atentados diversos contra Órgãos que faziam oposição ao Governo Figueiredo. Nenhum desses atentados foi elucidado.
“1980:
18/01 – desativada bomba no Hotel Everest, no Rio, onde estava hospedado Leonel Brizola.
27/01 – bomba explode na quadra da Escola de Samba Acadêmicos do Salgueiro, no Rio, durante comício do PMDB.
26/04 – show 1º de maio – 1980 – bomba explode em uma loja do Rio que vendia ingressos para o show.
30/04 – em Brasília, Rio, Porto Alegre, Curitiba, Belo Horizonte, Belém e São Paulo, bancas de jornal começam a ser atacadas, numa ação que durou até setembro.
23/05 – bomba destrói a redação do jornal ‘Em Tempo’, em Belo Horizonte.
29/05 – bomba explode na sede da Convergência Socialista, no Rio.
30/05 – explodem duas bombas na sede do jornal ‘Hora do Povo’, no Rio.
27/06 – bomba danifica a sede da Casa do Jornalista, em Belo Horizonte.
11/08 – bomba é encontrada em Santa Teresa, no Rio, num local conhecido por Chororó. Em São Paulo, localizada uma bomba no Tuca, horas antes da realização de um ato público.
12/08 – bomba fere a estudante Rosane Mendes e mais dez estudantes na cantina do Colégio Social da Bahia, em Salvador.
27/08 – no Rio, explode bomba-carta enviada ao jornal ‘Tribuna Operária’. Outra bomba-carta é enviada à sede da OAB, no Rio, e na explosão morre a secretária da ordem, Lyda Monteiro. Ainda nesta data explode outra bomba-carta, desta vez no prédio da Câmara Municipal do Rio.
04/09 – desarmada bomba no Largo da Lapa, no Rio.
08/09 – explode bomba-relógio na garagem do prédio do Banco do Estado do Rio Grande do Sul, em Viamão (RS).
12/09 – duas bombas em São Paulo: uma fere duas pessoas em um bar em Pinheiros e a outra danifica automóveis no pátio da 2ª Cia. De Policiamento de Trânsito no Tucuruvi.
14/09 – bomba explode no prédio da Receita Federal em Niterói.
14/11 – três bombas explodem em dois supermercados do Rio.
18/11 – bomba explode e danifica a Livraria Jinkings em Belém.
08/12 – o carro do filho do deputado Jinkings é destruído por uma bomba incendiária em Belém.
1981:
05/01 – outro atentado a bomba em supermercado do Rio.
07/01 – na Cidade Universitária, no Rio, uma bomba explode em ônibus a serviço da Petrobrás.
16/01 – bomba danifica relógio público instalado no Humaitá, no Rio.
02/02 – é encontrada, antes de explodir, bomba colocada no aeroporto de Brasília.
26/03 – atentado às oficinas do jornal ‘Tribuna da Imprensa’, no Rio.
31/03 – bomba explode no posto do INPS, em Niterói.
02/04 – atentado a bomba na residência do deputado Marcelo Cerqueira, no Rio.
03/04 – parcialmente destruída, com a explosão de uma bomba, a Gráfica Americana, no Rio.
28/04 – o grupo Falange Pátria Nova destrói, com bombas, bancas de jornais de Belém.” (Dickson M. Grael, op. cit., pg. 79 a 81)
Devido ao embuste que foi o Inquérito – que tentou encobrir um “acidente de trabalho” dos militares, colocando a culpa em militantes da esquerda –, o General Golbery do Couto e Silva, devido às resistências dentro do próprio SNI para punir os responsáveis pelo atentado terrorista, afirmou que havia criado um “monstro” (o SNI), e entregou o cargo de Chefe do Gabinete Civil. Golbery criou o SNI em 1964 e foi o seu primeiro Chefe (1964-67).
Todos são unânimes em afirmar que, devido à falta de vontade do Governo Federal em punir os militares responsáveis pelo ato terrorista, o Governo Figueiredo acabou prematuramente junto com o atentado do Riocentro.
Aliás, devido a esse episódio e, especialmente, pela falta de interesse de Figueiredo em exercer a Presidência, melhor fora se nunca tivesse assumido tão elevado cargo público. Para toda a nação brasileira, melhor fora se o general de cavalaria nunca tivesse deixado o padoque, local em que o perfume do esterco da cavalhada lhe era mais agradável do que o cheiro do povo.
Por isso, mais do que nunca, lembrar é preciso, de modo que não se repitam no futuro atentados como este e outros tantos, que sacudiram o Brasil durante aqueles tristes “anos de dinamite”.
Nota:
Publicado originalmente no site Usina de Letras - Artigos-->O atentado do Riocentro -- 02/05/2005 - 10:21 (Félix Maier)
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