Lembrar é preciso:
O primeiro assassinato a gente nunca esquece
Publicado por Félix Maier
Usina de Letras - 10/05/2001
Já repararam como a mídia não comenta nada sobre os crimes cometidos por Fernandinho Beira-Mar, recentemente entregue pela Colômbia à nossa Polícia Federal?
Inicialmente, ainda houve algumas manchetes, na chegada de Beira-Mar ao Brasil, quando as fotos deram destaque especial para sua mão enfaixada, resultado de troca de tiros nas selvas colombianas. Algumas notas também saíram nos jornais quando Beira-Mar teve um tratamento VIP no Hospital das Forças Armadas (HFA), onde foi operado, ocasião em que atendimentos urgentes de outros simples mortais foram totalmente suspensos, e uma centena de fuzileiros navais foram deslocados para o local para que o sujeito não fosse seqüestrado por comparsas.
A mídia nada diz sobre Beira-Mar e tudo o que representa o tráfico de drogas e as ondas de assassinatos que sempre seguem os passos dos traficantes. Porém, as "araponganews" se propagam em nossas emissoras de TV e em nossos jornais, todos incorporando o espírito da mais baixa arapongagem, com câmaras e microfones escondidos, cada dia apresentando mais uma denúncia de corrupção. Como já bem notou Olavo de Carvalho, o roubo hoje está sendo apresentado como um crime infinitamente maior que o assassinato. A vida humana nestas terras gramscianas não tem mais valor nenhum.
Ontem, dia 9 de maio, foi a 32ª "comemoração" do 1º assassinato de Carlos Lamarca, que matou o guarda-civil Orlando Pinto Saraiva, em assalto a um banco.
O 1º assassinato a gente nunca esquece. Por isso, mais do que nunca, lembrar é preciso.
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Texto publicado por TERNUMA:
"O 1º ASSASSINATO
Depois de um Congresso realizado em abril de 1969, numa casa em Mongaguá, cidade do litoral paulista, entre Praia Grande e Itanhaém, no qual Lamarca foi eleito um dos cinco membros do Comando Nacional (CN), a VPR reiniciou as ações armadas.
Na tarde de 09 de maio, Lamarca comandou o assalto simultâneo aos bancos Federal Itaú Sul-Americano e Mercantil de São Paulo, na Rua Piratininga, bairro da Moóca, cujo gerente, Norberto Draconetti, foi esfaqueado e o guarda-civil, Orlando Pinto Saraiva, morto com dois tiros, um na nuca e outro na testa, disparados por Lamarca, que se encontrava escondido atrás de uma banca de jornais. No final da ação, disparou uma rajada de metralhadora para o ar, como a marcar, ruidosa e pomposamente, o seu primeiro assalto a banco e o seu primeiro assassinato.
Os primeiros meses de 1969, entretanto, foram marcados pelas prisões de dezenas de militantes da VPR e do Comando de Libertação Nacional (COLINA), organização criada em junho do ano anterior por dissidentes da Política Operária (POLOP) em Minas Gerais e no Rio de Janeiro. Debilitadas, ambas buscaram, na fusão, um modo de rearticularem-se, formando uma única organização, mais poderosa e de âmbito quase nacional. Dessa forma, no início de julho de 1969, surgiu a Vanguarda Armada Revolucionária Palmares (VAR-P), com Lamarca integrando, com mais cinco membros, o seu Comando Nacional (CN).
Nessa época, Lamarca já era um dos comunistas mais procurados. O roubo das armas, a deserção e o primeiro assassinato levaram os órgãos de segurança a efetuarem esforços especiais para a sua captura. O Exército, particularmente, sentindo-se traído, colocara como ponto de honra o fim dos seus atos terroristas. No entanto, ele não era mais um subversivo desconhecido, que necessitava ser identificado. Sua fama e sua origem o qualificavam como extremamente perigoso e sua fotografia atualizada era guardada no bolso de muitos agentes. Sua aparência física e, principalmente, seu rosto cadavérico, tornavam-no um alvo fácil de ser reconhecido. Lamarca sabia disso e resolveu mudar.
Em julho de 1969, dois médicos militantes da Base Médica da VPR, Almir Dutton Ferreira ("Augusto", "Cesar", "Ivo", "João") e Germana Figueiredo ("Júlia"), incumbiram-se da tarefa.
Almir convocou seu amigo de infância, o dentista Rogério Iório, que, em quatro consultas em seu consultório na Avenida Nelson Cardoso, em Jacarepaguá, trocou todos os dentes superiores de Lamarca.
Quinze dias depois, já em agosto, Almir procurou um outro amigo, o médico Milton Nahon, que conseguiu os serviços do também militante comunista Afrânio Marciliano Freitas Azevedo, cirurgião mineiro do Hospital Gaffrée Guinle, que, com o auxílio do médico cearense Amauri Luzardo Santiago de Almeida e do anestesista Luiz Alves, realizou a operação plástica na Clínica São João de Deus, na Rua Almirante Alexandrino, em Santa Tereza.
Lamarca foi internado com o nome de "Paulo Cesar de Castro" e chegou na clínica estranhamente vestido de mulher, com trejeitos para se passar por cabelereiro e homossexual. Durante as 24 horas da cirurgia, dois militantes da VPR, Sonia Eliane Lafoz e Wellington Moreira Diniz - este escondido no armário, permaneceram no seu quarto, como seguranças armados.
Logo depois, já com o nariz reduzido e sem os marcantes sulcos da testa e da face, Lamarca tirou fotografias para a nova identidade e viajou para São Paulo, numa caravana composta por seguranças e pelo médico da VPR Luiz Roberto Tenório, que a capitaneava num Gordini.
Entretanto, se a cirurgia deu certo e tínhamos um novo Lamarca, o mesmo não ocorria com a fusão que dera origem à VAR-PALMARES. Se, por um lado, os "marxistas" oriundos do COLINA, melhor preparados politicamente, criticavam os "militaristas" da VPR pelo "imediatismo revolucionário", por outro, os oriundos da VPR sentiam-se moralmente fortalecidos pelo que levavam para a nova organização: 55 milhões de cruzeiros e um grande arsenal de armas, munições e explosivos.
Nem a "Grande Ação" -- assalto ao cofre de Anna Benchimol Capriglione, amante de Adhemar de Barros, ex-Governador de São Paulo, e que proporcionou à VAR-P cerca de 2 milhões e 800 mil dólares -- conseguiu acalmar os conflitos entre os dirigentes.
Entre agosto e setembro de 1969, uma casa em Teresópolis abrigou 33 militantes que, depois de 20 dias, transformaram aquilo que seria o I Congresso Nacional da VAR-P num festival de bebedeiras, drogas e sexo, recheado por acirradas discussões político-ideológicas que, por pouco, não degringolaram em agressões físicas e tiros.
Ao final, concretizou-se um "racha" na VAR-P, surgindo o "Grupo dos 7" -- dentre os quais, Lamarca -- que foi reestruturar a VPR.
No início de outubro, no bar do Hotel das Paineiras, na Floresta da Tijuca, representou a VPR num encontro com dirigentes da VAR-P para a partilha dos bens das duas organizações.
Apesar de ser membro do CN, ele delegou aos demais a burocrática tarefa de organizar o Congresso da nova VPR, realizada na Barra da Tijuca, e foi orientar seus militantes que se exercitavam no tiro e em marchas tipo guerrilha, num sítio em Jacupiranga, próximo ao Km 234 da BR-116. Observou, no entanto, que esse local, demasiado próximo de uma rodovia e de regiões urbanas, não oferecia boas condições de segurança.
Assim, já como Comandante-em-Chefe da VPR, Lamarca determinou a desmobilização dessa área e a ativação de uma outra, em Registro, no Vale do Ribeira/SP."
(Extraído de TERNUMA: www.ternuma.com.br)
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