MEMORIAL 31 DE MARÇO DE 1964

MEMORIAL 31 DE MARÇO DE 1964
Avião que passou no dia 31 de março de 2014 pela orla carioca, com a seguinte mensagem: "PARABÉNS MILITARES: 31/MARÇO/64. GRAÇAS A VOCÊS, O BRASIL NÃO É CUBA." Clique na imagem para abrir MEMORIAL 31 DE MARÇO DE 1964.

quinta-feira, 30 de abril de 2020

2008: 40 anos do AI-5

O Jornal da Câmara apresentou a opinião de outros palestrantes, além de Passarinho, que participaram do seminário "Brasil: 1968-2008", ocorrido no Interlegis/Senado Federal, no dia 26 de agosto, como os historiadores Carlos Fico, da UFRJ, e Estevão de Rezende Martins, da UnB. (Participaram do seminário, ainda, os cientistas políticos Paulo Kramer e David Fleischer, da UnB, e o jornalista José Nêumanne Pinto, do Estadão; o cineasta Wladimir de Carvalho não pôde comparecer ao evento, por estar sofrendo de forte dor de coluna.) 
Invertendo fatos históricos, Carlos Fico afirmou em sua palestra (a qual eu assisti) que a ditadura militar foi quem promoveu a violência em 1968, não os terroristas, ao invadir a UnB e censurar a peça "Roda Viva" de Chico Buarque, e que a fala de Moreira Alves foi apenas uma deixa para fechar ainda mais o regime. Como se pode deduzir, Carlos Fico, à moda de Habsbawm, analisa a História apenas sob a ótica marxista, pinçando fatos a seu favor.

O ano de 1968 contém uma agenda muito mais ampla e macabra do que a apresentada pelo Jornal da Câmara, que lista apenas 7 datas (a conta do mentiroso...), muito bem escolhidas, ideologicamente falando. Foi um ano em que começaram a proliferar muitos grupos terroristas, especialmente no Rio e em São Paulo, sob as ordens de Cuba, de acordo com o que foi deliberado pela OLAS, em 1966, fundada sob inspiração de Salvador Allende, para "criar vários Vietnãs na América Latina", segundo afirmou Fidel Castro na ocasião. Com a morte de Che Guevara na Bolívia, em 1967, muitos estudantes latino-americanos queriam ser iguais ao guapo jovem de boina vermelha, que havia se tornado um mito entre a estudantada.

Carlos Fico afirmou, ainda, que não havia necessidade de implantar uma ditadura para combater os grupos terroristas. Que isso poderia ter sido feito dentro do regime democrático. Jarbas Passarinho rebateu o historiador relativista no seminário aludido, afirmando que o habeas corpus, p. ex., mandava soltar terroristas sanguinários, como Carlos Marighela, e que havia, sim, necessidade de endurecimento do governo, com leis especiais, afirmando que a Colômbia “nunca editou seu AI-5” e o resultado aí está: as FARC já aterrorizam toda a nação há 44 anos.

Vejamos quais foram os principais acontecimentos de 1968, que justificaram a criação do AI-5:

No dia 1º de maio, em um comício na Praça da Sé, em São Paulo, o Governador Abreu Sodré e sua comitiva foram expulsos da tribuna, a qual foi utilizada por agitadores para ataques violentos ao Governo militar.

No dia 26 de junho, o soldado do Exército, Mário Kosel Filho, foi explodido pela VPR de Carlos Lamarca em uma guarita do QG do então II Exército, onde tirava serviço de sentinela. Nesse mesmo dia (mera coincidência?), realizava- se no Rio a "passeata dos 100 mil", reunindo estudantes, padres, artistas, "intelectuais" e outros.

No dia 22 de julho, a VPR rouba 9 FAL do Hospital Militar do Cambuci, em São Paulo. 

No dia 10 de agosto, a ALN de Carlos Marighela assalta o trem-pagador Santos-Jundiaí, ação que rendeu ao grupo NCr$ 108.000.000,00 e consolidou sua entrada na luta armada. O ministro da Justiça do governo Fernando Henrique Cardoso, Aloysio Nunes Ferreira, foi um dos que participaram daquele assalto, fugindo em seguida com a mulher para Paris, com documentos falsos. Em Paris, o "Ronald Biggs" caboclo viria a participar da Frente Brasileira de Informações (FBI), criada em 1968 em Argel, Argélia, sob inspiração de Miguel Arraes, ligada a organizações de esquerda, de oposição ao governo militar do Brasil, órgão que tinha por objetivo promover a desinformatsya, tanto no Brasil, quanto no exterior. "Marcito pinga-fogo" também foi um ativo militante da FBI, junto com Fernando Gabeira e Francisco Whitaker Ferreira, Frente essa que teve o apoio ostensivo do guru marxista francês Jean-Paul Sartre e as bênçãos do bispo vermelho D. Hélder Câmara. 

No dia 20 de agosto, foi morto por terroristas o soldado da Polícia Militar de São Paulo, Antônio Carlos Jeffery. 

No dia 12 de outubro, a VPR assassinou o capitão do Exército dos EUA, Charles Rodney Chandler, projetando-se perante as organizações terroristas nacionais e internacionais. 

No dia 7 de setembro, foi assassinado o soldado da PM de São Paulo, Eduardo Custódio de Souza, e

No dia 7 de novembro foi assassinado o Sr. Estanislau Ignácio Correa, ocasião em que os terroristas levaram seu automóvel.

Nesse mesmo ano de 1968, houve um crescendo na agitação estudantil de todo o País, fruto da "Revolução Cultural" implementada na China por Mao Tsé-Tung, com os famigerados "livros vermelhos", que atingiu também Paris, quase derrubando o Governo Charles de Gaulle, e pela OLAS de Cuba, como já foi citado acima. Em Paris, os estudantes eram influenciados pelas idéias neomarxistas de Marcuse e pelo líder estudantil Daniel Cohn Bendit, além de movimentos mundiais contra a Guerra do Vietnã, contestada principalmente pelos negros americanos.

Muitos estudantes, brasileiros ou não, queriam ser os "novos guevaras", após o "martírio" de Che na Bolívia, em 1967. A agitação estudantil era insuflada principalmente pela Ação Popular (AP), pela Dissidência da Guanabara (DI/GB), pelo Comando de Libertação Nacional (COLINA), pelo Partido Comunista Brasileiro Revolucionário (PCBR), pela Vanguarda Popular Revolucionária (VPR) e pela Ala Marighela (posterior Ação Libertadora Nacional - ALN). Os principais líderes estudantis eram Vladimir Palmeira e Franklin Martins, da DI/GB, e José Dirceu, da ALN.

No dia 28 de março de 1968 foi morto no Rio o estudante Edson Luís de Lima Souto, em um choque de estudantes contra a polícia. Durante seu enterro, foi depredado um carro da Embaixada americana e incendiado um carro da Aeronáutica.

No dia 31 de março, uma passeata de estudantes contra a Revolução deixou 1 pessoa morta e dezenas de policiais da PM feridos no Rio.
No dia 19 de junho, liderados por Vladimir Palmeira, presidente da UNE, 800 estudantes tentaram tomar o prédio do MEC no Rio, ocasião em que 3 veículos do Exército foram incendiados. 

No dia 21 de junho, no Rio, 10.000 estudantes incendiaram carros, saquearam lojas, atacaram a tiros a Embaixada Americana e as tropas da PM, resultando 10 mortos, incluindo o sargento da PM, Nélson de Barros, e centenas de feridos. 

No dia 22 de junho, estudantes tentaram tomar a Universidade de Brasília (UnB). 

No dia 24 de junho, estudantes depredaram a Farmácia do Exército, o City Bank e a sede do jornal O Estado de S. Paulo

No dia 26 de junho ocorreu a "passeata dos 100 mil", no Rio, e o assassinato do soldado Kozel Filho, como já afirmado acima. 

No dia 3 de julho, estudantes portando armas invadiram a USP, ameaçando colocar bombas e prender generais. 

No dia 4 de julho, a "passeata dos 50 mil" tinha como principal bordão "só o povo armado derruba a ditadura".

No dia 29 de agosto, houve agitação no interior da UnB, ocasião em que foi preso o militante da AP, Honestino Guimarães, presidente da Federação de Estudantes Universtários de Brasília (FEUB), o qual, desde então, foi dado como desaparecido. O deputado Mário Covas foi à UnB para lhe prestar solidariedade. 
No dia 3 de outubro, choques entre estudantes da USP e do Mackenzie ocasionaram a morte de um deles, baleado na cabeça.

No dia 12 de outubro, realizou-se o XXX Congresso da UNE, em Ibiúna, SP. A polícia prendeu os participantes, entre os quais Vladimir Palmeira, José Dirceu e Franklin Martins. Nesse Woodstock tupiniquim, foram encontradas drogas, bebidas alcoólicas e uma infinidade de preservativos usados. Havia até uma "escala de serviço" de moças para atendimento sexual. Os líderes estudantis, em acordo com Marighela e com o governo de Cuba, haviam chegado à conclusão de que o estopim para a luta armada viria de uma prisão em massa de estudantes, envolvendo comunistas e inocentes úteis, e jogaria essa massa nos braços da luta armada. 

No dia 15 de outubro, estudantes tentaram tomar o prédio da UNE, queimando carros oficiais. Fernando Gabeira participou do ato terrorista.

Para analisar aqueles "anos da matraca", especialmente o quentíssimo ano de 1968, convém lembrar duas passagens de José Antonio Giusti Tavares, em seu livro Totalitarismo Tardio - O caso do PT

"Juízos de valor acerca de condutas do passado devem ser feitos não a partir de parâmetros éticos do presente, mas da contextualização da conduta na sua própria época, e nela, por comparação com condutas diferentes".

"Os historiadores e os cientistas sociais devem cumprir pelo menos dois requisitos básicos da epistemologia e da ética das ciências humanas:

1) evitar tanto quanto possível qualquer restrição ou seleção dos fatos brutos e, 
2) ao apresentá-los, distinguir sempre, tanto quanto possível, entre fatos e interpretações".

Seria importante o Jornal da Câmara difundir todos esses fatos ocorridos ao longo de 1968, não apenas aqueles que atendam a algum propósito ideológico. No entanto, tenho que concordar com o Jornal em pelo menos um aspecto: "a verdadeira história ainda não foi contada".

Por que a Câmara não começa, enfim, a contar toda essa história, de verdade, ao invés de contá-la pela metade, sonegando informações históricas importantes ao povo brasileiro?




quarta-feira, 29 de abril de 2020

ORVIL - Segundo Elio "Parmegiani" Gaspari

O Globo - 11/11/2012

ELIO GASPARI

ORVIL

Chegou às livrarias a edição impressa de "Orvil - Tentativas de tomada do poder". O título significa "livro", escrito ao contrário. Trata-se de um compêndio organizado em 1985 no falecido Centro de Informações do Exército. Destinou-se a contar a história do combate a grupos esquerdistas durante os anos 60 e 70 sob a ótica dos agentes
de uma política de Estado que patrocinou, estimulou e encobriu torturas, assassinatos e extermínios.


Quando o livro ficou pronto, o governo Sarney resolveu arquivá-lo, para não reabrir feridas que nunca cicatrizaram. O texto foi para a internet e agora tem 922 páginas.

Foi organizado pelo tenente-coronel Lício Maciel (veterano do Araguaia, onde foi ferido no rosto) e pelo tenente José Conegundes do Nascimento.


É uma árvore sem tronco. Omite os crimes do Estado, mas é um relato informativo das ações, dos assaltos e dos assassinatos praticados durante o surto terrorista.

Quando trata da guerrilha do Araguaia, informa que no final de 1973 os efetivos do PCdoB "haviam se reduzido a um terço do existente em abril de 1972", quando o foco foi descoberto. Aceitando-se esse cálculo, eles seriam pelo menos 20.


É aí que entra uma pergunta que poderá ser respondida por veteranos da "tigrada" e pelos atuais comandantes militares à Comissão da Verdade. Se o Exército estava lá para capturá-los, como se explica uma operação militar que não conseguiu pegar um só? Sumiram todos. Foram-se embora num disco voador albanês?

Nota:

Para conhecer a história do terrorismo esquerdista no Brasil, faça o download do ORVIL clicando em 

A Parcialidade Escancarada


A Parcialidade Escancarada


Carlos Ilich Santos Azambuja (*)


MÍDIA SEM MÁSCARA, ANO 1, NÚMERO 6, 12 DE DEZEMBRO DE 2002


Acabei de ler os dois volumes escritos por Elio Gaspari (A Ditadura Envergonhada e A Ditadura Escancarada) nos quais ele se propôs reconstituir cerca de dez anos da História do Brasil, desde o governo João Goulart até o final da Guerrilha do Araguaia, em 1974. Analisou a área política dos governos militares, a chamada “repressão” e as esquerdas de todos os matizes, dando ênfase à esquerda armada dos “anos de chumbo”, conforme ele diz.

Valeu-se de arquivos pessoais de diversas personalidades, fundamentalmente dos arquivos do general Golbery e de seu secretário, capitão Heitor (1). Entrevistou dezenas de pessoas, da direita, do centro, da esquerda e da extrema esquerda. Quando da Revolução de março de 1964, Elio Gaspari, aluno da Faculdade Nacional de Filosofia, no Rio de Janeiro, era membro do PCB, conhecido como “Elio Parmegiani”.

Em seu livro, narra em detalhes a morte do estudante Edson Luiz, no restaurante do Calabouço, ocorrida em 27 de março de 1964. Detalhes tão precisos como se ele estivesse lá, assistindo a tudo. Não estava. Tanto não estava que escreveu que o fato ocorreu “a três quarteirões do hospital da Santa Casa”. Outra inverdade. Do restaurante ao hospital bastava atravessar a rua Santa Luzia. Eu estava lá e vi.

No entanto, na Faculdade Nacional de Filosofia, Rio de Janeiro, de onde era aluno, narra a morte, a tiro de revólver disparado por um seu colega, de um estudante da mesma Faculdade. E só. Por que Gaspari, um historiador, evita dizer o nome desse seu colega, de Faculdade e de partido, que disparou a arma? Esse é um segredo de polichinelo, embora jamais o autor da morte tenha sido processado por esse crime. Seu nome? Apenas as iniciais, pois não desejo prejudicá-lo, onde quer que esteja. Assim, aquilo que ele julga que ninguém sabe, ele vai saber que eu sei: ACFPP.

Essa foi a primeira parcialidade encontrada em seus livros. Mas há outras, tão ou mais graves, pois distorcem a História ou evitam contá-la como ela foi. Na página 146 do segundo de seus livros escreveu que o Cônsul dos EUA em São Paulo, na segunda metade de 1968, dispunha de contatos que lhe permitiram estabelecer a conexão entre Marighela e os dominicanos, mas que na cópia de um documento da época, liberada pelo Departamento de Estado dos EUA, “a identidade desse interlocutor está protegida por um trecho censurado que equivale a vinte batidas de telex”. Não acredito que o autor desconheça que essas vinte batidas de telex escondam o nome de Hans Rudolph Jacob Mans, terrorista da ALN treinado em Cuba e que usava os codinomes de “Flores”, “Juvêncio”, “Osvaldo” e “Suíço”

Escreveu ele nas fls 286 de “A Ditadura Envergonhada” que, “por ordem do chefe do gabinete do ministro da Aeronáutica - João Paulo Burnier -, três oficiais e oito graduados da 1ª Esquadrilha de Salvamento e Resgate da FAB, o Parasar, foram colocados sob o comando de um general, municiados com armas cuja numeração estava raspada, equipados com documentos falsos e enviados em trajes civis para patrulhas de ruas”.

Duas mentiras em um trecho de três linhas: o brigadeiro João Paulo Burnier não era, ainda, chefe do gabinete do ministro da Aeronáutica (basta consultar os diários oficiais da época, o que seria muito mais fácil que destrinchar os quilos de papéis dos arquivos do general Golbery). Viria a sê-lo, algum tempo depois. E quem colocou os oficiais e graduados à disposição do general Ramiro Tavares foi o comandante da então Terceira Zona Aérea, ao qual o Parasar era subordinado para fins de emprego na Segurança Interna. Apenas operacionalmente subordinava-se à Diretoria de Rotas Aéreas.

Outra parcialidade escancarada, ou melhor, mentira escancarada, ainda sobre o mesmo assunto, está logo a seguir, na página 303. Escreveu ele que “baseado numa sindicância que Burnier mandara fazer Souza e Mello saiu em sua defesa. Mentira. Quem fez a sindicância foi o brigadeiro Sousa e Silva, chefe do gabinete do ministro Souza Mello. Burnier foi, sim, um dos objetos da sindicância.

Elio Gaspari, que por várias vezes citou o site do grupo Terrorismo Nunca Mais para respaldar algumas afirmações, ignorou a matéria “A Verdade sobre o Caso Parasar” que está lá, no Ternuma. Se não o tivesse ignorado saberia que o brigadeiro Burnier nunca teve atrás de si nenhum movimento político, nem a mídia, e muito menos foi candidato a nada, o que não aconteceu com o capitão “Sérgio Macaco”, acolitado por políticos da esquerda do então MDB e da Frente Ampla, com toda a mídia a seu lado e, graças à notoriedade ganha com o escândalo por ele construído, eleito deputado federal.

Julgo que entre as funções mais nobres dos jornalistas e escritores estão as de investigar e procurar atingir a verdade antes de informar. Gaspari não fez isso. Limitou-se a transcrever versões parciais extraídas de notícias de jornais, bem como declarações de pessoas – inclusive militares – que “ouviram dizer”. Exemplos: ordens para explodir o Gasômetro e assassinar políticos. Isso em uma reunião, de portas abertas, com oficiais, cabos e soldados!

O jornalista, tão minucioso em seus relatos do 31 de março, como os tanques que saíram do Laranjeiras e vieram para o Guanabara, evitou dizer que quem organizou a defesa do Palácio Guanabara, onde se encontrava o governador Carlos Lacerda, foi o então major Burnier. Evitou fazer referência a tudo o que foi narrado sobre o Caso Parasar, minudentemente, pelo jornal O Estado de São Paulo nas edições de 5 de outubro de 1968 e 12 de março de 1978, relatos nunca, por ninguém, contestados. Em 6 de outubro de 1968, editorial escrito por Julio de Mesquita Filho assinalava: “Estamos, portanto, diante de um novo episódio da campanha sub-reptícia que os derrotados de março de 1964 desenvolvem na área militar, para quebrar, primeiro a unidade de cada Arma e, depois, a união das três Forças Armadas”.

O jornalista ignorou também os despachos de três sucessivos ministros da Aeronáutica – publicados pela imprensa – aos requerimentos feitos pelo brigadeiro Burnier pedindo a instauração de um Conselho de Justificação para julgar seus atos à vista dessas acusações que lhe vinham sendo feitas por Sérgio Macaco, especialmente através da imprensa. Um desses três ministros proferiu, a respeito, em 19 de maio de 1980, um despacho concluindo que “as acusações relacionadas com o Caso Parasar eram inadmissíveis” e, ademais, contém o seguinte trecho, que transcrevo: “Oficial vibrante, de extrema dedicação à carreira, patriota sobejamente comprovado, de conduta digna, notável responsabilidade no cumprimento do dever e possuidor de elevado conceito entre superiores, pares e subordinados”. Esse é o conceito do brigadeiro Burnier junto a seus chefes, muito diferente do construído pela esquerda de então.

Entre os diagnósticos de Julio Mesquita Filho e de três ministros de Estado e opiniões outras, encampadas irresponsavelmente pelo autor, fico com os fatos e não com as versões escancaradas da parcialidade. Finalmente, uma outra notória parcialidade está nas páginas 392 e 393, onde faz referência à “fase pistoleira dos terroristas”, alinhando os nomes de três militantes “justiçados” por seus próprios companheiros, alguns, como Marcio Leite Toledo, por terem ousado começar a pensar com a própria cabeça...

Não foram três – o que é mais uma parcialidade descarada. Foram nove. Seus nomes estão lá, no site do Ternuma, tão citado por Gaspari: Geraldo Ferreira (Dissidência da Var-Palmares, em 29 de maio de 1970, no Rio), Ari Rocha Miranda (ALN, em 11 de junho de 1970, em São Paulo), Antonio Lourenço (Ação Popular, em fevereiro de 1971, no Maranhão), Carlos Alberto Maciel Cardoso (ALN, em 13 de janeiro de 1971, no Rio), Marcio Leite Toledo (ALN, em 23 de março de 1971, em São Paulo), Amaro Luiz de Carvalho (PCR, em 22 de agosto de 1971, em Pernambuco), Francisco Jacques Moreira de Alvarenga (Resistência Armada Nacionalista, em 28 de junho de 1973, no Rio; assassinado pela ALN), Salatiel Teixeira Rolins (PCBR, em 22 de julho de 1973, no Rio), Rosalino Cruz Souza (“Mundico”), e “Paulo”, não identificado, respectivamente em agosto e setembro de 1973 (ambos do PC do B, durante a Guerrilha do Araguaia, por terem demonstrado o desejo de abandoná-la). "Mundico"” foi assassinado por Dinalva da Conceição Oliveira Teixeira (“Dina”), transformada em quase heroína pelo jornalista. Fico por aqui. É ou não uma Parcialidade Escancarada?

(*) Carlos Ilich Santos Azambuja foi historiador militar e agente de Inteligência da Aeronáutica. Faleceu em 2019. Nome fictício, tem as iniciais de CISA - Centro de Informações de Segurança da Aeronáutica.



O FASCÍNIO DOS ANOS DE CHUMBO - GENERAL RAYMUNDO NEGRÃO TORRES

O FASCÍNIO DOS ANOS DE CHUMBO


Raymundo Negrão Torres (*)


Alfredo Hélio Sirkis – um ex-guerrilheiro urbano que ajudou Lamarca no audacioso seqüestro de dois embaixadores estrangeiros – relatou em livro suas experiências na luta armada comunista dos chamados anos de chumbo.

Ao publicar a 14ª edição de “Os Carbonários”, fez questão de inserir, como um novo prefácio, uma espécie de autocrítica na qual reconhece: “Mas a história, ela própria, acontece duas vezes. Uma no instantâneo eclodir dos fatos. Outra nas obras literárias, históricas, biográficas, memorialísticas e, hoje, no audiovisual, na TV, no cinema, em CD-ROM. Se na primeira perdemos fragorosamente, na segunda não nos saímos de todo mal”.

Mais adiante, ao confessar não compreender o permanente interesse da mídia por esse confuso e conturbado período de nossa história, escreveria: ”Muitas obras houve e, pelo fascínio que esse período continua a exercer, muitas ainda haverá”.

E aquele “fascínio” – que disfarça interesses pecuniários – continua dando seus frutos. A sua mais recente manifestação é uma “obra” cuja gestação custou – segundo o autor, Elio Gaspari - longos dezoito anos e o trabalho da maior equipe que uma editora já colocou à disposição de um escritor. Tempo mais longo do que Jacó precisou trabalhar para Labão, antes que este lhe desse a ambicionada Raquel e tão vasto que o irreverente Carlos Heitor Cony chegou a pensar que não viveria o bastante para ter a ventura de saborear o resultado de tão longa faina. Não sei o que o acadêmico e memorialista Cony achou da coisa, mas penso que nada dirá, além da reclamação que já fez em sua coluna diária da imputada co-autoria de um contundente editorial do Correio da Manhã publicado na véspera da queda de Jango Goulart. São “vinhos da mesma pipa”...

Costuma-se dizer que pelos frutos é que se conhece a árvore e árvore má não dá bons frutos. Daí ser interessante conhecer algo da vida do jornalista-autor, dono de página dominical inteira em jornais de circulação nacional e que se julga – “eliocentricamente”, como ele mesmo proclama - um dos ìcones de nosso jornalismo investigativo. A tomar como válido o esboço biográfico de Elio Gaspari traçado por outro conhecido e veterano jornalista, também durante muitos anos figura importante na redação da revista VEJA, em seu alentado livro “Notícias do Planalto”(Companhia das Letras), fica no ar a certeza de que o fruto é o retrato da arvore que o produziu.

Mário Sérgio Conti – até hoje não desmentido no que escreveu e publicou em 1999 – mostra um alvorecer para a profissão nada edificante, pois afirma que com sua ancestralidade napolitana, a convivência em um dos muitos colégios onde estudou com filhos de banqueiros do jogo do bicho e a observação da fauna de malandros, sambistas, prostitutas, pederastas e cafetões da Lapa (Rio), Gaspari embebeu-se do que chama de a “sabedoria das ruas”.

Precisando de uma profissão, acabou sendo empurrado, por sua militância no Partido Comunista, para o jornalismo em Novos Rumos, órgão do PCB, onde chegou depois de um modesto emprego na Embaixada cubana. A reviravolta havida com a queda de Jango Goulart o deixa sem trabalho por uns meses e o leva para um emprego em uma agência de notícias no aeroporto do Galeão que lhe abriria as portas para uma experiência em que sua “sabedoria das ruas” seria de grande valia para o seu promissor início como falsificador de entrevistas.

Como o tempo de contato com políticos e personalidades em trânsito era reduzido, o repórter já levava prontas as entrevistas que eram oferecidas aos que as quisessem encampar em troco da vantajosa aparição nos jornais. Isso triplicava sua produtividade e o recomendava aos patrões, aos encarregados das redações e aos “pauteiros”; além disso, a técnica inusitada e esperta faria escola.

Anos mais tarde, na revista Veja, “a molecagem” – no dizer de Conti – seria repetida, já refinada e com grande sucesso e vantagem. Escola que, ao que parece, nunca foi abandonada e foi utilizada contra uma de suas mais notórias e recentes vítimas, o brigadeiro Werner que teve sua entrevista publicada nas Páginas Amarelas da revista de forma inteiramente deturpada pela repórter que o ouvira, transformando-a em um pronunciamento de caráter nazista.

Esse refinamento deve ter sido também obra da experiência adquirida pelo jovem Gaspari, ainda no tempo do Galeão, quando começou a trabalhar para Ibrahim Sued, o mais bem sucedido colunista social, que soube, como ninguém, utilizar seu faro de repórter policial e informante da polícia para explorar a vaidade de “didus” e “dolores” e transformá-la em rendosa fonte de prestígio e dinheiro.

Terá sido, certamente, a ligação íntima com o “Turco” que terá dado a Elio Gaspari a ferramenta com que abriu o “cofre das vaidades” de certas figuras da ditadura – como Ernesto Geisel e Golbery do Couto e Silva - de onde saíram os papéis de arquivos oficiais – transformados leviana e criminosamente em arquivos pessoais - e os “diários” com que montou sua mais recente e longeva obra, cujos dois primeiros volumes, logo que lançados, já despontavam na lista dos mais vendidos, mostrando que o Sirkis tinha razão, mesmo que o apontado fascínio seja o resultado de longas e trabalhosas compilações do que muitos outros já escreveram, com uma conveniente e capciosa seletividade de fatos e fontes ao bel prazer do autor, de declarações com o velho “cheiro de Galeão” e de um texto bem escrito, mas recheado de equívocos, erros grosseiros, meias verdades e mentiras completas, próprias ou encampadas. Falhas que já começam a ser apontadas publicamente, porque ainda estão vivas muitas das testemunhas dos fatos e que agora se dispõem a corrigi-lo e a contar o que sabem.

Em resumo, trata-se de uma obra escrita com objetivos canalhas que tem em vista tentar denegrir e enxovalhar as Forças Armadas, especialmente o Exército e seus chefes, que são, em muitos pontos, ridicularizados e depreciados.

À “sabedoria das ruas” – de que fala o Conti – talvez se devesse acrescentar outro talento herdado e que é revelado em um texto do Zuenir Ventura publicado no suplemento Prosa e Verso, de O Globo de 23 de novembro de 2002, onde ele dá a entender que a mãe do Gaspari, empregada do Hotel Excelsior, no Rio, se apropriou, indebitamente, de livros esquecidos no quarto por hóspede ilustre e os passou ao filho, quando os deveria ter entregue á gerência para serem restituídos ao seu legítimo dono, e hoje enriquecem a variada e volumosa biblioteca “Pedro Malan” do jornalista. Será verdade? O cáustico Elio, ao que se saiba, nunca explicou esse comprometedor lance.

Outra fonte de refinamento Gaspari acabaria tendo de sua ligação com Dorrit Harazim, uma iugoslava de nascimento que, depois de algum tempo morando no Brasil, andou pela França de onde teve de fugir para livrar-se das grades da Suretè francesa que a perseguia por suas ligações com os terroristas. Gaspari - que participou dos primeiros e difíceis tempos do lançamento da revista VEJA (1969/70) - trabalhou com ela por algum tempo na revista, para onde a recrutaram em Paris outras figuras marrons da imprensa, como os Civita e Mino Carta. Este, italiano como ele, muito o ajudou dando-lhe especial destaque na redação da revista, onde se notabilizou por seu jeito desenvolto, prepotente, intrometido e absorvente, para onde voltara com Dorrit em 1979, já casados ou coisa que o valha, depois de algum tempo de trabalho no Rio e no Jornal do Brasil.

Foi na tentativa de incrementar a cobertura política de VEJA que Gaspari veio a conhecer o “bruxo” Golbery de cuja intimidade passou a privar, como verdadeiro “leva-e-traz” de notícias e informações. Com a escolha e a eleição de Geisel para suceder a Médici, “caiu-lhe a sopa no mel”. A tal ponto que na redação da revista era visto como um “aliado da ditadura e um agente do Golbery na imprensa”. E era mesmo. Nas Explicações do primeiro volume da obra de que nos ocupamos, o jornalista não faz segredo dessa situação e confessa que sem o apoio e “a paciente colaboração” (pág. 14) do ex-presidente Geisel ela não teria saído.

Se a isto juntarmos certos equívocos nas apreciações contidas no depoimento de Ernesto Geisel à turma esquerdista do CPDoc da Fundação Getúlio Vargas (que analisei detidamente no capítulo Depoimento Geisel, páginas 103 a 113, de meu livro “Nos porões da Ditadura” da Editora Expressão e Cultura, 1998, Rio de Janeiro), será lícito concluir, sem ofensa à memória de quem já não pode mais defender-se, haver da parte do ex-presidente um empenho subjetivo de melhorar sua imagem histórica e eventualmente resgatar alguns dos inegáveis desacertos de seu governo, o mais autoritário do ciclo revolucionário.

Para quem claramente afirmou que a substituição de Castello por Costa e Silva levaria a Revolução de 64 à perdição e, mais tarde, teve a oportunidade de tentar salvá-la, mas, pelo contrário, ajudou a enterrá-la melancolicamente, parece que só restaram a covardia das memórias póstumas e o uso de interpostas pessoas para melhorar sua biografia. E uma delas, sem dúvida, é o autor de Ilusões Armadas, cujo processo de expulsão do Brasil, como estrangeiro indesejável, foi retirado do Gabinete Militar da Presidência a mando de Golbery que o fez desaparecer, como declarou recentemente, em artigo no jornal Ombro-a-Ombro, o então major Kurt Pessek.

Os dois primeiros volumes do livro do Elio Gaspari foram recebidos com o estardalhaço que era de esperar, pois todo o mundo queria saber o que continham os arquivos implacáveis do “bruxo” Golbery. Na edição do Globo acima citada, o jornalista Aluízio Maranhão cantou em prosa e verso os dois primeiros volumes da obra Só que, ao que parece, "a montanha pariu um rato".

Do resumo que o Globo publicou, já se podia ver quanto de besteiras, preconceito e inverdades estão nos grossos volumes já à venda. A revista Veja, na edição de 27 de novembro de 2002, também deu largo espaço ao lançamento do cartapácio.

Tentaremos alinhavar uma série de observações sobre pontos em que o já publicado é notoriamente incorreto, tendencioso, parcial ou incompleto, em que pese a enorme equipe que a Companhia das Letras – a grande interessada no sucesso editorial do empreendimento – formou para ajudar o autor.

Elio Gaspari parece demonstrar uma entranhada paixão pela democracia e pela liberdade, sentimento estranho e tardio em quem muito cedo alistou-se no Partido Comunista, certamente um equívoco da mocidade ou um jeito malandro de tirar proveito de ser comunista, como se constata no já citado livro do Mario Conti pelo elevado número deles nas redações dos jornais e revistas. O que acaba sendo irrelevante, tendo em vista o imenso número dos cristão-novos da Democracia que andam hoje por aí, no governo, na imprensa e alhures, com gordas indenizações e polpudas pensões arrancadas do suor do trabalhador brasileiro.

Outro detalhe interessante é que o autor faz críticas ferinas ao modo de escrever do general Lyra Tavares e dos capitães redatores de um certo Manifesto lançado na EsAO, esquecendo que eles não tiveram a vasta equipe de edição de texto que garantiu a sua boa sintaxe, conforme reconhece nos agradecimentos.

Cumpre ressaltar também que o autor contou – além da vastíssima bibliografia já existente sobre o assunto – com a colaboração de muitos “inocentes-úteis” que deram seus depoimentos em troca da honra de constar de um livro supostamente tão importante. Acima de tudo, contou com a boa fé de muitos depoentes que jamais iriam imaginar o uso que o jornalista faria de suas declarações e confidências, incluindo-as em um livro destinado a enxovalhar a farda a qual dedicaram suas vidas e que o Golbery, em certo ponto do livro, chama debochadamente de “fantasia”.

Por outro lado, o livro é farto de afirmativas que o autor não se dá ao trabalho de comprovar ou justificar, bastando para tanto a verdade da palavra “eliana” ou a citação de uma fonte muitas vezes duvidosa. Como na página 22 – 1º volume, onde afirma peremptoriamente que “Frota chegou ao generalato graças ao expurgo praticado contra centenas de oficiais fiéis ao regime deposto”. Em 1964, Frota devia ser coronel antigo; logo, o inventado expurgo teria de atingir coronéis mais antigos que ele ou mais bem colocados nos Quadros de Acesso e com o curso de Estado-Maior. Se o Exército dormiu janguista e acordou revolucionário, - como se afirma - de onde saíram as centenas de coronéis fiéis a Jango expurgados? Com tantos coronéis leais o “golpe” teria sido fatalmente derrotado.

Outra falácia que o autor repete é sobre o criador do SNI. E aí há certa justificativa, pois o próprio Golbery dela se pavoneava e muita gente até hoje a repete. O SNI surgiu por transformação do Serviço Federal de Informação e Contra-Informação (SFICI) criado no governo de JK. Quando este visitou os Estados-Unidos, o presidente Einsenhower manifestou-lhe sua preocupação com a infiltração esquerdista no governo brasileiro. Ofereceu-lhe assistência técnica para a criação de uma agência equivalente à CIA, lá surgida no governo Truman em 1949. JK desconversou.

Na visita ao Brasil, em fevereiro de 1960, Ike, além de sugerir a Juscelino que reconsiderasse sua decisão anterior de romper com o FMI, repisou sua antiga preocupação com a infiltração comunista no Brasil, o que tornaria necessário um reforço nos órgãos de segurança. Como JK estava interessado em reatar as negociações com o FMI, concordou em criar a tal agência. Foram criados o SFICI, bem como Seções de Segurança Nacional nos ministérios civis, todos subordinados à Secretaria Geral do Conselho de Segurança Nacional. Quem quiser conferir, leia Moniz Bandeira, em Brasil-EUA – A rivalidade emergente, Editora Civilização Brasileira – 1989, página 93, citado por Roberto Campos, em Lanterna na Popa, página 283.

É enorme a quantidade de maus julgamentos, ambigüidades, distorções, meias verdades e idéias preconceituosas constatadas no primeiro volume do “pentateuco” – A Ditadura Envergonhada – que vale a pena mencionar ainda que brevemente.

Embora admita, implicitamente, que até o AI/5 não havia censura (pág. 24) ao dizer que até a demissão do ministro Frota, em 1977, foram nove anos de restrições, mais adiante, entra em contradição e erra nas contas ao afirmar que com o mesmo Ato o Brasil entrara no mais longo período ditatorial de sua história (pág. 35), esquecendo o “curto período da ditadura estadonovista de Getúlio.

Demonstra uma profunda ignorância do que era a Doutrina de Segurança Nacional da Escola Superior de Guerra, confundindo-a com o que a esquerda caolha, raivosa e burra chamou de Ideologia, responsabilizando-a pela alegada violência do regime, e alongando-se em pretensiosas considerações que só fazem acentuar seu despreparo e sua verbosidade.(pág. 39-40).

Ao sumariar os acontecimentos que antecederam a queda de João Goulart, demonstra que, apesar do tempo de que dispôs e da enorme equipe com que contou, sua pesquisa foi claudicante, errônea e incompleta. Na eleição de Jânio-Jango, esquece e nem menciona a importância dos comitês Jan-Jan. A revolta dos sargentos em Brasília em setembro de 1963 – um dos antecedentes mais importantes da queda de Jango – nem é mencionada.

A importância da interinidade de Ernesto Geisel no comando da 5ª Região Militar é exagerada. Ressuscita um tal Setor Militar do PCB – um tal de SERMIL, mencionado por Luis Mir em seu livro “A revolução Impossível” – coisa em que ninguém ouviu falar e esquece notórios oficiais comunistas, como o major Lauro Garcia Carneiro, valendo-se de depoimentos que teriam sido prestados 33 anos depois dos acontecimentos.(pág. 53/54) E digo, teriam sido, porque há menção no livro a depoimentos que nunca foram prestados, como o atribuído ao então major Kurt Pessek (nota pág. 25). Pura invencionice, repetindo comentários que se ouviram na época em Brasília, afirma o oficial.

Ao falar do general Castello Branco (pág. 54/56) dá a entender que consultou o arquivo pessoal e privado do ex-presidente, mas ignora olimpicamente o importante livro de Luís Viana Filho sobre o Governo Castello Branco – nem mencionado na Bibliografia – e dá ouvidos aos cochichos de um ilustre depoente especial, gravados em doze fitas K-7, com que a filha do mesmo acaba de presenteá-lo, conforme confessa (pág. 15).

Ao falar do interesse dos americanos na situação brasileira nem de leve tem coragem para mencionar entre os eventos marcantes a ajuda aos seus atuais patrões – os Marinho – com o empréstimo de duzentos milhões de dólares do poderoso Time-Life, como forma de fortalecer um grupo que notoriamente se opunha a um presidente que ameaçava jogar o Brasil nos braços de Moscou. (pág. 59/62).

Assis Chateaubriand sempre achou que nessa estória havia o dedo do então embaixador do Brasil nos Estados Unidos, Roberto Campos, que nega o fato em suas memórias. A ajuda aos donos da Globo iria minar o predomínio das Emissoras e Diários Associados e fazer nascer um novo império na mídia brasileira.

E aí vão alguns tópicos para a Companhia de Letras incluir na revisão de uma próxima edição, se o quiser e se houver:

- a 1ª DIE da FEB na Itália pertencia ao IV Corpo de Exército americano. O 5º era o Exército do general Mark Clark de quem o capitão Vernon Walters fora ajudante de ordens (pág. 61);

- A Artilharia Divisionária/3 não era em Porto Alegre e o general Barra que a comandava não era o Rubens – que, como coronel servia em Curitiba – mas seu irmão Newton (pág,90);

- Almirante Vermelho era o apelido pelo qual era conhecido na Marinha o almirante Paulo Mário da Cunha Rodrigues, da Reserva, nomeado ministro nos estertores do governo Goulart e como conseqüência da revolta dos marinheiros, e não o almirante Aragão, chamado “o Almirante do Povo”.

A julgar pela versão dada pelo general Cordeiro de Farias em seu depoimento para Aspásia Camargo e Walder de Góes, sobre o que se teria passado em Curitiba nos idos de 64, sua versão encampada por Elio Gaspari de que “o Exército dormiu janguista no dia 31 e acordou revolucionário no dia 1º”, precisa ser colocada de quarentena. Aquela versão, meninos eu vi!, é inteiramente equivocada. Além disso, o então comandante da Região Militar, general Dario Coelho, fez publicar dias depois um relatório sobre os acontecimentos que desmente a versão do general Cordeiro.

A partir da página 130, o autor inicia um exercício de “chutometria” numerológica a respeito dos presos, mortos, exilados etc. Apresenta dados desde os da embaixada americana até os que, anos depois, surgiriam do livro de dois farsantes – Nilmário Miranda e Carlos Tibúrcio – intitulado “Dos filhos deste solo”.

A citação desse livro feita no final da longa nota de rodapé que tomou o nº 8 (pág.132) dá uma idéia do nível de empulhação que perpassa a obra. A referência cita a página 311, como apoio ao que diz sobre a morte do coronel Alfeu de Alcântara Monteiro. O caso desse oficial se encontra à página 561 e registra uma das muitas mentiras do grosso calhamaço editado com o dinheiro do PT (Editora Perseu Abramo) e sobre o qual vale a pena nos alongarmos, pois dá a medida do que se fez na tal Comissão de Mortos e Desaparecidos.

Ali consta que “Alfeu era coronel aviador. Foi fuzilado no dia 4 de abril de 1964 na Base Aérea de Canoas no Rio Grande do Sul. A perícia médica constatou que foi assassinado pelas costas com uma rajada de metralhadora, tendo sido encontrados 16 projéteis em seu corpo”. Em setembro de 1997, a Comissão concedeu indenização aos familiares do coronel, cuja viúva já recebia pensão militar, com o voto favorável do general Oswaldo Pereira Gomes, que, em entrevista à Folha de São Paulo de 7 de junho de 1998, disse:

“ (...) Houve um caso de um militar janguista que se rebelou num quartel do Rio Grande do Sul. Ele foi morto e a Comissão votou o processo em que ele teria levado 16 tiros pelas costas. Era o coronel Alfeu de Alcântara Monteiro. O pedido de indenização foi aceito. Eu mesmo aprovei o caso. Na verdade, depois de o caso ser apurado, fui descobrir que o coronel não tinha levado 16 tiros pelas costas, mas sim um tiro, após tiroteio (...) O que foi para o relatório “Brasil Nunca Mais” foi essa versão de 16 tiros pelas costas, o que é uma inverdade. Houve muitos casos como esse.”

O general era o representante das Forças Armadas na Comissão. Suas dúvidas sobre esse processo deveriam ter sido tiradas antes da votação, para que pudesse dar seu voto com absoluto conhecimento de causa, como é o mínimo que se espera de qualquer juiz. Elas seriam tiradas se, simplesmente, ele consultasse o IPM que, na época, apurou o fato. Se consultasse teria tomado conhecimento do que ocorreu: o brigadeiro Nelson Freire Lavanère Wanderley, acompanhado do coronel aviador Roberto Hipólyto da Costa, chegou à então 5ª Zona Aérea, em Porto Alegre, para assumir o comando, que deveria ser transmitido pelo coronel aviador Alfeu de Alcântara Monteiro, oficial mais graduado presente. O coronel Alfeu, amigo pessoal de João Goulart, após recusar-se a transmitir o comando, atirou e feriu o brigadeiro, sendo morto com um tiro de pistola 45 pelo coronel Hipólyto, em ato considerado como de legítima defesa de outrem. O coronel Hipólyto foi absolvido pela Justiça Militar. (jornal “Ombro a Ombro” de julho de 1998).

É assim que a esquerda conta a estória dos “anos de chumbo”, agora com o auxílio do tortuoso discípulo do Golbery.

As estatísticas do livro do Gaspari, fazem lembrar as elucubrações que ainda se fazem a respeito do número de índios que havia no Brasil quando da chegada de Cabral ou da falsificação numerológica sobre a população do Paraguai ao iniciar-se a guerra da Tríplice Aliança e que alimentou os inventores do mito do genocídio. “Chutometria” alucinada de burocratas que tinham de preencher e mandar relatórios. No território da 5ª RM, os presos não passaram de 20. Devem ter considerados como presos os que fugiram por nada, os exilados voluntariamente e os que se esconderam. Diz o autor que em três anos (1964/66) passaram pelas embaixadas cerca de 500 asilados. Os dados sobre as intervenções nos sindicatos e confederações, além de fantasiosos e confusos, são ridículos (pág. 131).. Misturam-se e embaralham-se dados para confundir o leitor e aumentar o número de páginas do calhamaço. Se nem o nome certo do órgão punitivo existente na ocasião eles sabem direito, com acreditar na veracidade do que escrevem.

O autor é mais um sujeito que não sabe que a comissão chefiada inicialmente pelo marechal Taurino era a Comissão de Investigação Sumária (CIS) e que a Comissão Geral de Investigações (CGI) – órgão para apurar atos de corrupção, só surgiria depois do AI-5, no começo de 1969, e era presidida pelo Ministro da Justiça (pág. 134). E as incorreções se sucedem como a que aparece na página 137, ao falar na crise da aviação embarcada, quando o número de ministros demitidos é mencionado incorretamente. Dado irrelevante, como se poderia argumentar, mas que desacredita o mais que se escreveu. Depois de tantos anos de pesquisa e com o auxílio de computadores e de uma enorme equipe, o livro tem passagens que fazem lembrar o do Barão de Münchausen. O problema é que a mentira, além de pernas curtas, tem muitas faces e a verdade só uma.

E o repórter falsário dos tempos do Galeão reaparece a cada passo, ao omitir detalhes que invalidariam sua tese ou seu raciocínio de uma evidente prevenção contra os militares, apesar de revelar-se um perfeito sabujo dos generais quando isso lhe traria algum proveito. Ao tentar mostrar o que chama de “a anarquia militar”, escamoteia do leitor fatos e circunstâncias relevantes em uma isenta apreciação histórica.

Ao mencionar a alegada rebeldia dos quartéis na vigência da Constituição de 1946 esconde que a pressão que levou o presidente Vargas ao suicídio foi o “mar de lama” que, segundo ele mesmo constataria envergonhado, corria por baixo do Palácio do Catete e que resultara no assassinato de um major da Aeronáutica por um sicário a serviço da guarda pessoal do próprio presidente. Que o impedimento dos senhores Café Filho e Carlos Luz foi necessário para abortar um golpe que pretendia impedir a posse do presidente eleito Juscelino Kubstichek (pág. 140).

Com o mesmo ânimo encampa a notícia falsa publicada em agosto de 1964 pelo Correio da Manhã, de que “o advogado e ex-deputado paranaense Walter Pecoits, que organizava camponeses na região de Cascavel, ficara cego de um olho, seis dias depois de ter sido preso pelo Exército”. O acusado de ter causado a cegueira no médico foi um oficial da Polícia Militar; a área de atuação do político do PTB não era Cascavel – que em outro ponto do livro é colocada a 200 quilômetros de Curitiba, quando fica a 500 – mas bem longe dali, em Francisco Beltrão/Paraná e Pato Branco/Paraná, onde em 1959 houve um levante de posseiros e, finalmente, fontes insuspeitas declararam que o médico já era quase cego da vista e usou a alegação da violência - que realmente ocorreu – para beneficiar-se politicamente e depois pecuniariamente do fato. (pág. 144). E perfilha, algumas páginas adiante, as estatísticas sobre tortura do famoso projeto Brasil: nunca mais, montado sobre a alegação geral e total dos terroristas e guerrilheiros - por instrução de seus advogados - para nos Juízos Militares derrubar as confissões feitas na fase de inquérito – algumas de próprio punho – alegando sistematicamente as terem feito sob maus tratos.

Curiosamente, uma das exceções foi a famosa Bete Mendes, a Rosa da VAR-Palmares, autora de falsa acusação ao coronel Carlos Alberto Ustra, em 1985

O autor, apesar de ter se tornado um “lambe-graxa” do Golbery, é um crítico feroz do SNI e tenta justificar o porquê de seu pretenso criador tê-lo chamado de “monstro”. Mas atribui ao órgão um pecado que não foi dele e mostra, mais uma vez, que quando se trata do Paraná, é mais mal informado do que o habitual.

A escolha do deputado Leon Peres para governador biônico daquele estado foi uma conspiração palaciana urdida junto ao presidente Médici por gente que se acotovelava no Palácio do Planalto, figurantes de um dos muitos círculos que se criavam na Brasília daqueles tempos – de que fazia parte o deputado e que o Sr. Roberto Médici em depoimento sobre seu pai apelidou de “clube inglês” - e nos quais se entreteciam os arranjos, onde os sócios trocavam elogios mútuos, procurando valorizar-se. E se o SNI chegou a fazer tudo o que o autor menciona (pág. 170/171) deveu-se principalmente ao “uso do cachimbo” que lhe impingiu Golbery e que deixou “a boca torta”, de que o próprio Gaspari dá um exemplo ao afirmar que um oficial de Marinha - cujo nome menciona - lhe mostrara em 1976 um informe do mesmo SNI, exemplo da intimidade que o jornalista gozava com gente do “monstro” em plenos “anos de chumbo”. Arcades ambo, como diriam os latinos e que se pode traduzir por “canalhas ambos”.

E a torrente de mentiras prossegue ao tratar o livro extensamente (pág. 191/196) da tentativa de guerrilha do “exército brancaleone” de Jefferson Cardim Osório, um “porra-louca” para os seus contemporâneos na Escola Militar e que, no episódio, recebia ordens do ex-sargento da Brigada Militar gaúcha, Alberi Vieira dos Santos, como ficou constatado na apuração do evento. Começa, ao dizer que ao atingirem a divisa do Rio Grande do Sul com Santa Catarina, “os guerrilheiros tinham o Exército no encalço”. O “exército” eram dois majores que tinham recebido a missão de rastrear e acompanhar à distância o bando.

A “viagem rotineira” do presidente Castello Branco era um importante evento para a época, qual seja a inauguração da Ponte da Amizade, iniciada por JK e que, ao contrário dos que fariam anos mais tarde com as grandes iniciativas deixadas pelos governos dos generais-presidentes os revanchistas odientos, fora continuada e concluída. E de repente, no relato “eliano” e como soe acontecer nos seriados históricos da TV Globo, o entrevero entre os aprendizes de guerrilheiro e a tropa legal viaja dezenas de quilômetros e muda-se para “as vizinhanças da cidade de Cascavel, duzentos quilômetros a oeste de Curitiba”.

E aí termina a ignorância geográfica de quem não sabe a verdade e começa a falsificação torpe de quem se empenha em difamar o Exército Brasileiro. Não pelo episódio da prisão que poderá ter acontecido, com o destempero do capitão comandante da tropa ao prender um dos responsáveis pela morte acontecida há pouco de um de seus sargentos e defrontar-se com alguém - que certamente não conhecia - sem farda, mas sobre o qual teria descarregado sua justa ira. A partir daí, volta a funcionar a fábrica de mentiras do discípulo do Ibrahim Sued; e vêm as torturas em três quartéis, a desconfiança de Castello com a rapidez das confissões – certamente sob tortura - e a comparação com episódios históricos de 22 e 24.

Jefferson Cardim durante sua longa prisão foi tratado com tanta consideração que conseguiu que comparsas seus armassem, por causa disso e explorando suas regalias, uma fuga espetacular que descrevi em um capítulo do meu livro, “Nos “porões” da Ditadura”, já citado acima. A apontada “rapidez das confissões” (prisão em 28 de março e leitura do presidente em 13 de abril) indicativa de uso de tortura é notícia do pasquim porto-alegrense Coojornal, de dezembro de 1978, o que por si só já desqualifica a afirmação, não fora a tolice de considerar que o prazo de quinze dias fosse motivo de espanto para a difusão de uma informação. E a comparação entre a ação de desatinados a serviço de uma potência estrangeira e subsidiados por dinheiro cubano com as tropelias internas de descontentes com um governo que os perseguiu, enquanto pôde, é descabida, mas coerente com tudo o que o autor assoalha em toda a obra, quando, sistematicamente, escreve que os de um lado “morrem” e os subversivos, terroristas e guerrilheiros são “assassinados”.

E para terminar esse exaustivo exame, embora parcial, de A Ditadura Envergonhada vale a referência comparativa com o que o autor chama a “Roda de Aquários”. É emblemática a leniência com que o autor trata a violência dos desordeiros americanos - que era reprimida sem contemplações pela polícia e que mais adiante motivaria severas medidas contra a indisciplina nos “campi” universitários – com a decisão com que os governos pós-64 enfrentaram a guerrilha urbana e a luta armada comunista em nosso país.

A obra de Elio Gáspari vem a lume no justo momento em que a democracia americana – atingida em seu próprio seio pelo terrorismo islâmico – adota medidas de salvaguarda que deixam o nosso AI-5 como um mero regulamento de colégio de freiras e onde os “porões” da ditadura brasileira - que tanto incomodaram certos círculos da terra de Tio Sam e muitos ditos brazilianistas – ficam a parecer um “jardim de infância” se comparados com os de Guantanamo...

(*) Raymundo Negrão Torres é general reformado e autor do livro 1964 – Uma Revolução Perdida .”


O "atentado" do Riocentro


Preâmbulo

24/02/2014

Durante o programa do "Fantástico", da TV Globo, levado ao ar no último 1º de maio [de 2005], houve uma rápida entrevista com o coronel Luís Antônio Ribeiro Prado, designado presidente do Inquérito Policial Militar(IPM) para apurar as explosões no Riocentro ocorridas na noite de 30 de abril para 1º de maio de 1981.

Visivelmente emocionado, o Cel Prado disse ao jornalista que inicialmente julgou que se tratava de um atentado promovido por algum grupo terrorista de esquerda contra os militares de Inteligência que faziam "campana" próximo ao show dos trabalhadores. Porém, à medida que os laudos apresentados foram elucidando o ocorrido, o Cel Prado não teve mais dúvidas de que a explosão dentro do Puma ocorreu devido à falha de manuseio da bomba que se encontrava no colo do sargento Rosário, ocupante do veículo ao lado do capitão Machado.

Pressionado pelas autoridades, que queriam incriminar as esquerdas com um IPM falso, o Cel Prado não se vergou às ameaças feitas e manteve a integridade moral que carregava desde o berço. Foi afastado do Inquérito e internado durante uma semana no Hospital Central do Exército (HCE), por "motivos de saúde". Não foi promovido a general, mas merece todo o reconhecimento da família militar brasileira por não ter traído a nação que um dia jurou defender, até com o risco da própria vida.

Ao Cel Prado os cumprimentos de todos os brasileiros, que também se emocionaram com o depoimento de um verdadeiro oficial do Exército brasileiro, que ainda hoje, já em idade bastante avançada, sente o corpo vibrar como nos tempos de cadete toda vez que ouve o Hino Nacional Brasileiro (F.M).


*


O "atentado" do Riocentro

Félix Maier

“Na noite de 30 de abril de 1981, durante um show de música popular para 20 mil jovens, uma bomba explode dentro de um automóvel que manobrava no estacionamento do Riocentro, na Barra da Tijuca. Morto no seu interior o Sargento Guilherme Pereira do Rosário; gravemente ferido abandona o veículo semidestruído o Capitão Wilson Luís Chaves Machado, ambos do Destacamento de Operações de Informações do 1º Exército sediado no Rio de Janeiro. Minutos depois outra bomba, mais poderosa, é lançada e explode próximo à casa de força do Riocentro. Como não atinge o seu alvo, não provoca a escuridão geral que certamente ocasionaria o pânico no recinto fechado do show, com conseqüências fáceis de se imaginar” (Major do Exército Dickson Melges Grael, in “Aventura, Corrupção e Terrorismo – à sombra da impunidade”, pg. 81 e 82).

Vinte e cinco minutos depois da explosão, o Capitão Machado foi levado ao hospital pela neta do Senador Tancredo Neves, Andréa Neves da Cunha, que chegava ao show com o noivo Sérgio Valle. O Capitão é levado ao Hospital Lourenço Jorge, depois ao Hospital Miguel Couto. O perito Humberto Guimarães (“Cauby”) diz aos repórteres que foram recolhidas outras 2 bombas no interior do Puma (placa OT-0279), uma delas destruída pela polícia.

Já no dia 1º de maio, à 1 hora da madrugada, um homem dizendo pertencer ao “Comando Delta” telefona para vários jornais, assumindo a autoria das explosões no Riocentro.

Às 2 horas da madrugada, o corpo do Sargento Rosário é levado para o IML e em seu corpo são encontradas peças de um mecanismo de relógio. Fotos mostrando o estado do Puma e o arrancamento das vísceras do Sargento comprovam que o mesmo manuseava uma bomba por ocasião da explosão, provavelmente em cima da perna direita.

Pela manhã, o General Waldyr Muniz, Secretário de Segurança Pública fluminense, em entrevista, afirma que os 2 militares foram vítimas de atentado e que os “terroristas fugiram em três carros”.

À tarde, o General Gentil Marcondes Filho, Comandante do I Exército, e o Coronel Job Lorena de Sant’Anna comparecem ao enterro do Sargento Rosário – com honras de herói – e ajudam a carregar o ataúde.

O General Gentil nomeia o Coronel Luís Antônio Ribeiro Prado presidente do IPM, para apurar as explosões no Riocentro. Cinco dias antes do prazo para conclusão do IPM, o Cel Prado renuncia por “motivos de saúde” e é substituído pelo Cel Job.

No dia 30 de junho, o Cel Job apresenta o resultado de suas investigações à imprensa, afirmando que os militares “foram vítimas de um atentado e a bomba havia sido feita com um quinto de uma lata de 2,5 litros de óleo Havoline e colocada entre a porta e o banco direito do Puma”.

“O problema do DOI-CODI, da sua sobrevivência, da sua missão especial, das suas prerrogativas – ele mantém prerrogativas que foram negadas ao Congresso Nacional – e que é crucial dentro do processo de democratização a que se devota o Presidente da República. Organismos de emergência, criados para articular as diversas forças empenhadas na repressão à subversão esquerdista e unificar o seu comando, eles sobreviveram à subversão a ponto de abrigar em seus quadros agentes de uma nova subversão, a que pretende impugnar a democratização do país e criar problemas ao Presidente da República e à nação” (Jornalista Carlos Castello Branco, em sua coluna no “Jornal do Brasil” – 6 Jun 1981).

No dia 30 de abril de 2001, 20 anos após o “acidente de trabalho”, o crime prescreveu e nenhum dos envolvidos poderá ser processado.

“ENTENDA O CASO RIOCENTRO

30 de abril de 1981

Duas bombas explodem no Riocentro, centro de eventos no Rio, durante show comemorativo do Dia do Trabalho. Uma das bombas explode dentro de um Puma no estacionamento do Riocentro. O sargento Guilherme Pereira do Rosário morre. O capitão Wilson Luiz Chaves Machado tem o abdome dilacerado

Jun/81

Relatório sobre o atentado inocenta o sargento e o capitão. O inquérito sobre o caso é arquivado

Nov/96

João Baptista Figueiredo, presidente na época das explosões, admite que houve participação de militares no atentado

Jun/99

A procuradora da República Gilda Berger afirma, em parecer, que o caso não está prescrito, e o Ministério Público Militar estuda a reabertura do inquérito

Jul/99

O Exército abre novo IPM (Inquérito Policial Militar) para apurar a responsabilidade pelas explosões

Out/99

O IPM indicia quatro pessoas: o general reformado Newton Cruz, ex-chefe da Agência Central do SNI (Serviço Nacional de Informações), Wilson Machado, o sargento Guilherme Pereira do Rosário e o coronel Freddie Perdigão

Mar/2000

Cruz é acusado de falso testemunho sobre o caso. O STM (Superior Tribunal Militar) aceita a denúncia e marca o depoimento de Cruz

Abril/2000

O STF (Supremo Tribunal Federal) concede liminar suspendendo o depoimento e suspende a tramitação do processo

Maio/2000

O Supremo decide manter arquivado o processo contra Cruz”

(Folha de S. Paulo – 16/04/2001)


Antecendentes

Antes do Atentado do Riocentro, nos anos de 1980 e 1981, durante 16 meses, houve 40 atentados diversos contra Órgãos que faziam oposição ao Governo Figueiredo. Nenhum desses atentados foi elucidado.

“1980:

18/01 – desativada bomba no Hotel Everest, no Rio, onde estava hospedado Leonel Brizola.

27/01 – bomba explode na quadra da Escola de Samba Acadêmicos do Salgueiro, no Rio, durante comício do PMDB.


26/04 – show 1º de maio – 1980 – bomba explode em uma loja do Rio que vendia ingressos para o show.

30/04 – em Brasília, Rio, Porto Alegre, Curitiba, Belo Horizonte, Belém e São Paulo, bancas de jornal começam a ser atacadas, numa ação que durou até setembro.

23/05 – bomba destrói a redação do jornal ‘Em Tempo’, em Belo Horizonte.

29/05 – bomba explode na sede da Convergência Socialista, no Rio.

30/05 – explodem duas bombas na sede do jornal ‘Hora do Povo’, no Rio.

27/06 – bomba danifica a sede da Casa do Jornalista, em Belo Horizonte.

11/08 – bomba é encontrada em Santa Teresa, no Rio, num local conhecido por Chororó. Em São Paulo, localizada uma bomba no Tuca, horas antes da realização de um ato público.

12/08 – bomba fere a estudante Rosane Mendes e mais dez estudantes na cantina do Colégio Social da Bahia, em Salvador.

27/08 – no Rio, explode bomba-carta enviada ao jornal ‘Tribuna Operária’. Outra bomba-carta é enviada à sede da OAB, no Rio, e na explosão morre a secretária da ordem, Lyda Monteiro. Ainda nesta data explode outra bomba-carta, desta vez no prédio da Câmara Municipal do Rio.

04/09 – desarmada bomba no Largo da Lapa, no Rio.

08/09 – explode bomba-relógio na garagem do prédio do Banco do Estado do Rio Grande do Sul, em Viamão (RS).

12/09 – duas bombas em São Paulo: uma fere duas pessoas em um bar em Pinheiros e a outra danifica automóveis no pátio da 2ª Cia. De Policiamento de Trânsito no Tucuruvi.

14/09 – bomba explode no prédio da Receita Federal em Niterói.

14/11 – três bombas explodem em dois supermercados do Rio.

18/11 – bomba explode e danifica a Livraria Jinkings em Belém.

08/12 – o carro do filho do deputado Jinkings é destruído por uma bomba incendiária em Belém.

1981:

05/01 – outro atentado a bomba em supermercado do Rio.

07/01 – na Cidade Universitária, no Rio, uma bomba explode em ônibus a serviço da Petrobrás.

16/01 – bomba danifica relógio público instalado no Humaitá, no Rio.

02/02 – é encontrada, antes de explodir, bomba colocada no aeroporto de Brasília.

26/03 – atentado às oficinas do jornal ‘Tribuna da Imprensa’, no Rio.

31/03 – bomba explode no posto do INPS, em Niterói.

02/04 – atentado a bomba na residência do deputado Marcelo Cerqueira, no Rio.

03/04 – parcialmente destruída, com a explosão de uma bomba, a Gráfica Americana, no Rio.

28/04 – o grupo Falange Pátria Nova destrói, com bombas, bancas de jornais de Belém.” (Dickson M. Grael, op. cit., pg. 79 a 81)

Devido ao embuste que foi o Inquérito – que tentou encobrir um “acidente de trabalho” dos militares, colocando a culpa em militantes da esquerda –, o General Golbery do Couto e Silva, devido às resistências dentro do próprio SNI para punir os responsáveis pelo atentado terrorista, afirmou que havia criado um “monstro” (o SNI), e entregou o cargo de Chefe do Gabinete Civil. Golbery criou o SNI em 1964 e foi o seu primeiro Chefe (1964-67).

Todos são unânimes em afirmar que, devido à falta de vontade do Governo Federal em punir os militares responsáveis pelo ato terrorista, o Governo Figueiredo acabou prematuramente junto com o atentado do Riocentro.

Aliás, devido a esse episódio e, especialmente, pela falta de interesse de Figueiredo em exercer a Presidência, melhor fora se nunca tivesse assumido tão elevado cargo público. Para toda a nação brasileira, melhor fora se o general de cavalaria nunca tivesse deixado o padoque, local em que o perfume do esterco da cavalhada lhe era mais agradável do que o cheiro do povo.

Por isso, mais do que nunca, lembrar é preciso, de modo que não se repitam no futuro atentados como este e outros tantos, que sacudiram o Brasil durante aqueles tristes “anos de dinamite”.


Nota:

Publicado originalmente no site Usina de Letras - Artigos-->O atentado do Riocentro -- 02/05/2005 - 10:21 (Félix Maier)