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Por
Luiz Lopes Diniz Filho*
Recentemente a Gazeta do Povo
publicou uma reportagem com
mais uma batelada desses chavões que os seguidores de Paulo Freire usam para
nos fazer acreditar que esse sujeito era um educador preocupado com liberdade e
autonomia do indivíduo, quando ele não passava de um doutrinador ideológico
dogmático e autoritário (mas de fala mansa). Como crítico de sua pedagogia,
gostaria de tecer alguns comentários.
Segundo a reportagem, Freire – que “defendia uma
educação assumidamente ideológica” – “propunha uma prática de sala de aula que
pudesse desenvolver a criticidade dos alunos e condenava o tradicionalismo da
escola brasileira, que chamou de ‘educação bancária’, em que o professor
deposita o conhecimento em um aluno desprovido de seus próximos pensamentos.
Tal sistema, diz, só manteria a estratificação das classes sociais, servindo o
ensino de mero treinamento para a formação de massa de trabalho.
Contrariamente, Freire propunha a construção do saber de forma conjunta, em que
o professor se aproxima dos conhecimentos prévios dos estudantes, para com
essas informações ser capaz de apresentar os conteúdos aos alunos, que teriam
poder e espaço para questionar os novos saberes”.
Na prática, a coisa funciona assim: o professor
questiona os alunos sobre o seu dia a dia, apresenta uma explicação ideológica
para os problemas e insatisfações relatados, e depois discute com eles o que
acharam desse conteúdo. Se os alunos discordarem da explicação, o professor
argumenta em favor do seu próprio ponto de vista ideológico. Ao fim do diálogo,
o professor conclui que os alunos que ele conseguiu convencer estão agora
“conscientes” da sua “verdadeira” condição de oprimidos e explorados pela
sociedade de classes.
Ora, isso é apenas a dita “educação bancária”
camuflada de diálogo! O professor apresenta uma única via para explicar as
situações relatadas pelos alunos: a ideologia em que ele acredita. O aluno é
deixado na ignorância sobre a existência de pesquisas que explicam as situações
de pobreza, desigualdade, problemas urbanos e ambientais, entre outros, fora do
universo teórico e ideológico do professor.
O próprio simplismo do pensamento de Paulo Freire
permite exemplificar como isso se dá. Suponham que um aluno de Freire, um
operário em processo de alfabetização, convidado a falar sobre sua vida
cotidiana, dissesse que está desempregado. Aproveitando a oportunidade para
“conscientizar” o aluno, o professor Freire apresentaria a sua visão sobre o
tema: “O desemprego no mundo não é, como disse e tenho repetido, uma
fatalidade. É antes o resultado de uma globalização da economia e de avanços
tecnológicos a que vem faltando o dever ser de uma ética realmente a serviço do
ser humano e não do lucro e da gulodice irrefreada das minorias que comandam o
mundo” (a citação é de Pedagogia da autonomia: saberes necessários à prática
educativa).
É claro que o aluno hipotético só poderia contestar
essa análise se tivesse lido trabalhos de economistas sobre as causas do
desemprego. Entretanto, o aluno obviamente não leu nada disso, pois está se
alfabetizando! Ou seja, o aluno não tem nem poder nem espaço para “questionar os
novos saberes” apresentados pelo professor.
O que se tem aí, portanto, é um método que consiste
em transmitir ao aluno verdades prontas, tal como na dita “educação bancária”,
mas disfarçado por um processo dialógico manipulado pelo professor, que sonega
ao aluno o conhecimento de explicações alternativas e mais sofisticadas do que
aquela!
* Doutor em Geografia pela FFLCH-USP,
professor do Departamento de Geografia da UFPR e colaborador do ESP.
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