Sobre a propriedade intelectual
Félix Maier
(19/11/2002)
O livro
de Michael Novak, “O Fogo da Invenção, o Combustível do Interesse - sobre a
propriedade intelectual” (1), trata do direito de patente (royalty) e do
direito autoral (copyright), além de tecer algumas considerações éticas
sobre patentes nas áreas genética e biogenética. Diminuto - com apenas 52
páginas -, o livro aborda a questão em foco com grande objetividade.
Michael Novak, teólogo e filósofo
norte-americano descendente de tchecos, fez seus estudos na Universidade
Gregoriana de Roma e em Harvard, e é responsável pelos setores de religião,
filosofia e políticas públicas no American Enterprise Institute, de
Washington, D.C. Escreveu mais de 20 livros, sendo o mais conhecido “The
Spirit of Democratic Capitalism”.
O livro “O Fogo da Invenção” - publicado no
Brasil pelo Instituto Liberal do Rio de Janeiro, com o apoio da Atlas
Economic Research Foundation - resultou de uma palestra de Novak (de uma
série de três) patrocinada pela Pfizer Inc. (Vale lembrar que a Pfizer é a
fabricante do Viagra, o moderno “combustível” para o “fogo” do amor...)
Na condição de católico, Novak também se refere,
no livro, à Encíclica Centesimus Annus (1991), do Papa João Paulo II.
Novak define assim as duas formas de propriedade
intelectual: “o direito de patente diz respeito à remuneração pela cessão do
uso de um novo produto ou processo e o copyright ao direito de reproduzir as
criações” (pg. 8).
O autor inicia seu trabalho baseado em um
discurso de Abraham Lincoln (1859), sobre “descobertas e invenções”, no qual o
ex-presidente americano se refere aos “seis grandes passos da história da
liberdade” – o sexto sendo a lei de patentes e a de direitos autorais. Novak
lembra que na Constituição dos EUA, de apenas 4.486 palavras, a palavra
“direito” aparece uma única vez, e ela se refere ao “direito” dos inventores e
autores.
(Em contrapartida, vejamos o que Gilberto Paim,
em seu livro “O Filósofo do Pragmatismo” (pg. 113-114), tem a dizer sobre a
nossa Constituição albanesa de 1988, em que até os juros foram tabelados: “Com
suprema paciência de pesquisador beneditino, Roberto Campos nos apresenta uma
estatística curiosa, extraída de sua análise da Carta: a palavra
‘produtividade’ só aparece uma vez no texto constitucional; as palavras
‘usuário’ e ‘eficiência’ figuram duas vezes; fala-se em ‘garantias’ quarenta e
quatro vezes; em ‘direitos’ setenta e seis vezes, enquanto a palavra ‘deveres’
é mencionada apenas quatro vezes. Para quem duvide da tendência antiliberal do
texto, basta dizer, afirma Campos, que a palavra ‘fiscalização’ é usada quinze
vezes e a palavra ‘controle’ nada menos de vinte e duas vezes!” (2) Hoje, a
“Constituição dos Miseráveis” já está mais retalhada que a cara de
Frankenstein, porém, duvida-se que as palavras-chave citadas por Campos tenham,
no texto atual, ranking diferenciado da Carta original, a tal
“Constituição-cidadã-do-avanço-do-atraso” de Ulysses Guimarães.)
Na página 12, o autor apresenta uma verdadeira
ode à globalização que Lincoln faz, já àquela época, enaltecendo as conquistas
alcançadas pela humanidade: “Olhemos esta jovem América”, disse Lincoln em
1859, “vejamos sua indumentária e veremos tecidos de algodão de Manchester e
Lowell; linhos brancos da Irlanda; lã da Espanha; seda da França; peles das
regiões árticas e um manto de búfalo das Montanhas Rochosas”. Continua
Lincoln: “À mesa desta Jovem América pode-se encontrar, além do pão comum e
da carne preparada em casa... açúcar da Louisiana; café e frutas dos trópicos;
sal das ilhas turcas; peixe da Terranova; chá da China e especiarias das
Índias. A baleia do Pacífico fornece sebo para as velas; há um anel de
diamantes do Brasil; um relógio de ouro da Califórnia e um charuto espanhol de
Havana”.
(Até o Brasil já estava globalizado na época de
Lincoln, exportando diamantes para nosso big brother. Por que, hoje, muitos
ainda são contra a globalização, que tantos benefícios traz para a humanidade?
A meu ver, ser contra a globalização é o mesmo que ser contra o nascimento do
sol todos os dias; é ser contra a chuva que cai do céu; é ser contra termos
sido gerados no interior do ventre de nossa mãe; ou seja, é ser contra a
natureza, contra a ordem natural das coisas.)
Lincoln distingue 6 passos fundamentais na
aventura humana:
1) “O primeiro passo foi uma dádiva divina: a
capacidade humana de construir um idioma” (pg. 13).
2) “O segundo passo foi o lento domínio da
arte do descobrimento, através da aprendizagem de três hábitos humanos
fundamentais: a observação, a reflexão e a experimentação” (pg. 13).
3) “O terceiro passo foi a invenção da
escrita. Através dela, ocorrida apenas em poucos lugares, alastrando-se
lentamente, observações e reflexões realizadas em um século proporcionaram a
reflexão e a experimentação nos séculos posteriores” (pg. 14).
4) “O quarto grande passo foi a imprensa, que
difundiu os registros das observações, reflexões e experiências realizadas, em
círculos infinitamente mais amplos, muito além do pequeno punhado de pessoas
que tinham condições de pagar pelos pergaminhos manuscritos. Agora, tais
registros estavam ao alcance de centenas de milhares de pessoas a um custo
mínimo” (pg. 14).
O autor lembra que “entre a invenção da
escrita e a invenção da imprensa, quase três mil anos se passaram. Entre a
invenção da imprensa e a invenção da moderna lei de patentes (na Grã-Bretanha,
em 1624), menos de 200 anos se passaram” (pg. 15).
5) “O quinto grande passo foi o descobrimento
da América. Na nova nação, comprometida com os ideais de liberdade e igualdade,
a mente humana foi emancipada como nunca, posto que ‘um novo país é mais
favorável – quase que necessariamente – à emancipação do pensamento e ao
conseqüente avanço da civilização e das artes’. O descobrimento da América foi
‘um evento que facilitou enormemente as descobertas e invenções úteis’ ” (pg.
15).
6) Finalmente, “o sexto passo foi a adoção de
uma Constituição, na qual a palavra ‘direito’ aparece apenas uma vez,
precisamente no Artigo 1, seção 8, cláusula 8: o reconhecimento de um direito
autoral de autores e inventores” (pg. 15).
Antes de a humanidade ter conhecido esse último
“passo”, Lincoln escreveu que qualquer pessoa poderia utilizar o invento de
outro, sem vantagens para o inventor. Porém – continua Lincoln – “o sistema
de patentes alterou esta realidade, assegurando ao inventor, por um tempo limitado,
o uso exclusivo de sua invenção; e daí em diante, acrescentou o combustível do
interesse ao fogo do gênio, na descoberta e produção de coisas novas e úteis”
(pg. 16).
O “combustível do interesse” multiplicado pelo
“fogo do gênio”! Realista, Lincoln entendia perfeitamente o comportamento
humano: uma coisa é ser gênio, outra coisa é ser motivado a fazer algo e,
finalmente, outra coisa ainda é receber o devido apoio ou prêmio por uma
descoberta. Diz Novak: “... um regime que não assegura os direitos naturais
desalenta a energia humana. Os direitos naturais não são meros sopros de ar;
eles formalizam capacidades para a ação, que em algumas sociedades permanecem
dormentes e em outras são abastecidas com o combustível capaz de manterem-se
acesas” (pg.
6).
Lincoln não era apenas um homem de palavras, mas
também de ação. No ano de seu famoso discurso (1859), ele obteve uma patente
por um “dispositivo para manter a flutuação de uma embarcação sobre bancos
de areia” (pg. 16).
Continua Novak: “A razão do apoio de Lincoln
ao Homestead Act (Lei de Incentivo à Colonização do Oeste dos Estados Unidos) e
à Lei de Patentes foi impedir que o Oeste fosse dominado por grandes
latifundiários e pudesse, assim, tornar-se uma sociedade de homens livres e de
muitas mentes práticas e inventivas. Mais de cinco milhões de patentes foram
expedidas nos Estados Unidos, desde que a primeira lei de patentes foi
promulgada em 1790” (pg. 17).
Como Novak é católico, ele lembra que quase um
século e meio depois do discurso de Lincoln em Jacksonville, uma encíclica do
Papa João Paulo II, Centesimus Annus, publicada em 1991, tem a essência
do pensamento do grande presidente americano: “Em nossos tempos, em particular,
existe outra forma de propriedade que chega a ser mais importante que a terra:
o domínio do conhecimento, tecnologia e habilidade” (O que pode ser observado
em países como o Japão, cujas riquezas estão muito mais baseadas no
“conhecimento” do que em “recursos naturais”.) Observa, ainda, o Papa: “Certamente
que, além da terra, o principal tesouro do homem é ele, o ‘próprio homem’. Sua
inteligência permite-lhe descobrir o potencial produtivo da terra e as
diferentes maneiras pelas quais as necessidades humanas podem ser satisfeitas”
(pg. 18). Palavras quase idênticas às de Lincoln, que afirmou: “Toda
natureza - o mundo inteiro, material, moral e intelectual - é uma mina” e “o
destino da raça de Adão” é “desenvolver, através de descobertas, invenções e
aperfeiçoamentos, os tesouros escondidos dessa mina” (pg. 18). O Papa
retoma o pensamento: “Enquanto, em determinada época, o fator decisivo da
produção foi a ‘terra’, e posteriormente o ‘capital’ - compreendido como o
conjunto completo dos meios de produção - atualmente o fator decisivo da
produção é, de forma crescente, o ‘próprio homem’, isto é, seu conhecimento,
especialmente seu conhecimento científico, sua capacidade para a organização
inter-relacionada e compacta, como também sua capacidade para perceber as
necessidades dos demais e satisfazê-las” (pg. 18-19).
O autor lembra que “os conceitos de direitos
autorais e patentes não são os mesmos e têm histórias distintas” (pg. 20).
As primeiras origens desse conceito vieram da Grã-Bretanha, da Alemanha e da
França. Continua Novak: “Como observou Lincoln, a invenção da imprensa em
1456 chamou a atenção dos autores e filósofos, notadamente no mundo inglês de
Hobbes e Locke, para a questão dos direitos autorais. Para os monarcas, as leis
de direitos autorais foram inicialmente consideradas como um meio de censura;
por outro lado, filósofos e poetas (como John Milton), de pronto, rebelaram-se
contra este conceito. Além disso, mais e mais escritores e inventores provinham
de classes inferiores, sem qualquer origem nobre, desprovidos de qualquer
herança que os sustentassem, dependentes de sua própria inteligência para
sobreviver. Eles queriam libertar-se financeiramente dos tipógrafos, dos
editores, da Igreja e da Coroa” (pg. 20-21).
Mais adiante, Novak passa às definições. “O
termo inglês para definir os direitos autorais, ‘copyright’, significa,
literalmente, o direito de fazer cópias, e patente significa o direito à
titularidade das vantagens (‘royalties’) sobre um novo produto ou um novo
processo. Os direitos autorais protegem as criações de escritores e artistas,
enquanto as patentes protegem invenções e descobertas de inventores. Paul
Goldstein, da Universidade de Stanford, apresenta uma definição bastante
sucinta: ‘Copyright é o direito do autor, e patente é a lei da invenção’ ”
(pg. 22).
Naturalmente, nem todos defendem esses conceitos
acima expostos. “O filósofo Tom G. Palmer, por exemplo, nega que possa haver
direito de propriedade sobre idéias; idéias são ‘objetos ideais’, afirma ele,
com características bastante diferentes das coisas materiais. Porém, Palmer não
faz justiça ao que se refere a um ponto fundamental: leis de patentes e
direitos autorais não protegem idéias ou conceitos considerados em sua
imaterialidade e divisibilidade. Ao contrário, as leis de direitos autorais
protegem a expressão concreta das idéias, sua materialização nas precisas
características da linguagem, ou das canções singularizadas por seus
criadores”. (...) Em ambos os casos, não se protege a idéia de modo genérico,
mas sim a sua materialização concreta” (pg. 23).
“Alguns creem ser ilógico que duas ou mais
pessoas possam chegar substancialmente ao mesmo invento – continua Novak –,
ainda que requeiram a patente com apenas um dia de diferença. Alegam ser
injusto recompensar totalmente um dos inventores e negar a patente ao outro” (pg. 24). Novak argumenta que “a questão de tempo é
essencial” para que os benefícios do novo invento passem à comunidade, da mesma
forma que o Homestead Act (Lei da Colonização) recompensava aqueles que
primeiro haviam formulado o pedido de concessão de terras no Oeste americano.
(O assunto me traz à memória o caso de Santos
Dumont. Se ele tivesse registrado a patente de seu 14-Bis, com o qual recebeu
um prêmio em Paris, em frente a centenas de testemunhas, além de efetivamente
ser o “Pai da Aviação”, sem contestação dos irmãos Wright, teria trazido
enormes benefícios ao Brasil. Infelizmente, Santos Dumont era apenas um rico
jovem romântico, descuidou-se de patentear o invento, e logo outros o fizeram,
iniciando a criação de várias empresas de construção de aviões e empresas de
transporte aéreo. O mesmo descuido não teve, p. ex., Graham Bell, inventor do
telefone, que patenteou o invento e o resultado foi a criação de um gigante das
comunicações mundiais, a ITT. O Brasil é campeão mundial do desleixo neste
sentido. O Padre Landell de Moura, muito antes do invento do italiano Marconi,
fez uma demonstração de comunicação sem fio (ondas rádio) ao imperador D. Pedro
II, no Rio de Janeiro, que apenas achou que o invento era uma simples
“curiosidade”, coisa de “padre maluco”. O Padre Bartolomeu Lourenço de Gusmão,
o “padre-voador”, tornou-se famoso na corte de D. João VI com seu balão
dirigível. Francisco João de Azevedo inventou uma máquina de escrever em 1861 e
apenas recebe uma medalha de ouro de D. Pedro II. Os irmãos José de Sá
Bittencourt Accioli e Manuel Ferreira da Câmara Bittencourt criaram inovadora
tecnologia de mineração, quando o mundo todo usava a bateia. Um francês estabelecido
em Campinas, Hercule Florence, criou um processo fotográfico cinco anos antes
que Daguerre o fizesse na França, a daguereotipia. Florence tinha a vantagem de
já utilizar o negativo - como ocorre hoje em dia -, para cópias múltiplas, ao
contrário do processo daguereótipo, que utilizava um processo “positivo”, ou
seja, uma chapa de cada vez, sem possibilidade de cópias. Quantos benefícios
esses inventos genuinamente brasileiros poderiam ter trazido ao País, se seus
inventores tivessem tido uma visão prática da criação de suas obras
extraordinárias! Ou que, pelo menos, o Governo tivesse se interessado por
algumas dessas criações.)
(É bom lembrar que a proteção ao invento foi
introduzida no Brasil pelo Alvará do Príncipe Regente de 28 de janeiro de 1809,
tornando nosso País o quarto do mundo a tratar do assunto.)
(No Brasil, o direito autoral é uma das formas
de propriedade garantidas pela Constituição. “Aos autores pertence o direito
exclusivo de utilização, publicação ou reprodução de suas obras, transmissíveis
aos herdeiros pelo tempo que a lei fixar” – Cap I, Art. 5º, XXVII, da
Constituição Federal. O autor pode explorar suas obras vitaliciamente. Com a
sua morte, esses direitos passam aos herdeiros (cônjuge, pais ou filhos),
também de forma vitalícia. Se tais herdeiros forem distantes, a sucessão nesses
direitos se dará por prazo determinado, que a lei estabelece ser, hoje, de 60
anos, a contar de 1º de janeiro do ano seguinte à morte do autor.)
(No que se refere a inventos industriais, assim
a Constituição se pronuncia: “A lei assegurará aos autores de inventos
industriais privilégio temporário para sua utilização, bem como proteção às
criações industriais, à propriedade das marcas, aos nomes de empresas e a
outros signos distintivos, tendo em vista o interesse social e o
desenvolvimento tecnológico e econômico do País” – Cap I, Art. 5º, XXIX. A
definição do que seja “invento industrial” ou “criação industrial” é matéria do
Código Nacional de Propriedade Industrial, ainda em fase de tramitação no Congresso
Nacional. Enquanto isso, haja pirataria...)
Novak lembra, no livro, que há um grande número
de acadêmicos que negam a existência dos tais “direitos” de propriedade
intelectual. “Eles consideram os direitos de propriedade demasiadamente
‘conservadores’ e inseridos em algo que parecem desprezar: ‘o individualismo
possessivo’. A outros desagrada a aparente anomalia de outorgar ‘monopólios
temporários’, e assim, estigmatizam as patentes e os direitos autorais com o
mesmo desprezo existente com relação aos monopólios” (pg. 26). A esses,
Novak refuta as argumentações apresentadas: “Obviamente, este entendimento é
um equívoco terminológico. ‘Monopólio’ pertence à linguagem do domínio sobre a
concorrência, porém o ‘direito autoral’ pertence à linguagem da propriedade
privada e consagra o direito de entrar no mercado. O objetivo do monopólio é
extinguir a concorrência, enquanto o objetivo buscado com a proteção dos
direitos autorais é justamente o incentivo à concorrência. O reconhecimento dos
direitos autorais aumento o número de concorrentes; seu objetivo é justamente o
oposto do monopólio” (pg. 26-27).
Continua a argumentação de Novak: “Esses
críticos esquecem que as patentes e os direitos autorais existentes
freqüentemente inspiram novas séries de concorrência para evitar concessões já
existentes, com a esperança de lançarem criações mais bem-sucedidas. Isto se
aplica especialmente no âmbito da pesquisa médica e farmacêutica. Patentes e
direitos autorais não extinguem a concorrência; com freqüência, o sucesso das
patentes e direitos autorais resulta no aumento da concorrência nas áreas
adjacentes” (pg. 27).
(Nesses tempos em que proliferam movimentos
antiglobalização, que criticam violentamente o capitalismo e as regras que
vigoram no comércio internacional, convém lembrar uma proposta apresentada no I
Fórum Social Mundial (FSM), realizado em Porto Alegre no final de janeiro de
2001, a cargo do governo petista local: o copyleft. Como se sabe, o FSM,
tanto em 2001, como no início do corrente ano, reuniu movimentos de inúmeras
tendências, a começar pelo punk anarquista e pelo jovem idealista, sonhador de
mais uma utopia, passando pela “intelectuária” esquerdista antiamericana e
anticapitalista (Emir Sader), pelo clero marxista da teologia da libertação
(Frei Betto), por elementos “falangistas rurais” (João Pedro Stédile, do MST),
por passeatas com bandeiras comunistas, execrando os EUA e enaltecendo os
regimes tirânicos de Cuba e da Coréia do Norte, e chegando ao cúmulo de reunir
terroristas das FARC, do IRA e do ETA. Depois de algumas badernas (destruição
de uma plantação de soja, dita transgênica, da empresa Monsanto, em
Não-me-Toque, (que ironia!), RS, e ameaça de destruição de uma loja da
McDonald’s em Porto Alegre, o copyleft foi uma das “resoluções”
apresentadas no I FSM. A argumentação apresentada foi que as obras intelectuais
não podem ser de propriedade de ninguém, seja pessoa física ou jurídica, pois o
benefício do conhecimento deve ser estendido a toda a humanidade. Nada, pois,
de copyright - right, essa coisa nojenta da direita! Copyleft,
tem, portanto, este duplo sentido: left, de “esquerda”, de enaltecimento
à ideologia totalitária de triste memória; e left, de “deixar”,
“permitir”, isto é, que as “cópias” de todos os trabalhos intelectuais possam
ser feitas livremente, sem pagamento de copyrights ou royalties. Exatamente
dentro do espírito formigueiro-esquerdista-coletivista “sem-vergonha de ser
feliz”. Ou seja, o conceito de copyleft não é nada mais do que um
incentivo ao roubo, à pirataria e ao contrabando, prática muito comum neste
extenso país-pirata chamado Brasil.)
Continuando sua dissertação, Novak apresenta
três problemas sérios referentes às patentes e aos direitos autorais: a busca à
proteção internacional para a propriedade intelectual, a busca à proteção no
novo meio das comunicações eletrônicas e digitais - reprografia, informática,
Internet –, e os escrúpulos morais relacionados aos campos da genética e da
biogenética.
Quanto ao registro de uma patente internacional,
Novak lembra que a burocracia “envolve centenas de milhares de dólares e
milhares de horas de trabalho” (pg. 28), dentro das regras da Organização
Mundial do Comércio (OMC).
(Hoje, observa-se que, na prática, apenas as
grandes corporações, em parceria com as universidades, têm cacife para a
pesquisa e a descoberta de um novo produto para lançar no mercado - ao menos no
que se refere a grandes projetos. O custo desses projetos, como o da construção
de uma nova espaçonave, o da Estação Espacial Internacional ou o do Genoma
Humano, é bilionário e envolve uma infinidade de especialistas. Se a Pfizer
gastou milhares de dólares para criar o Viagra - o dito “combustível” da “brasa
dormida” -, outros milhares de dólares foram necessários para ela registrar a
patente internacional do medicamento. Dificilmente um médico, trabalhando
isoladamente e arcando com todas as despesas, teria condições financeiras para
criar um produto semelhante e requerer a patente internacional. A não ser que
esse médico tivesse o nome de Bill Gates. Vale lembrar, cá entre nós,
brasileiros, que a “patente” de nossa primeira Santa, Paulina, finalmente sacramentada
pelo Vaticano, custou aos fiéis católicos algo em torno de US$ 100 mil...)
Em relação ao segundo problema - novos meios das
comunicações eletrônicas e digitais - Novak reconhece as dificuldades de
gerenciar o problema. Porém, ele afirma categoricamente: “nunca apostar
contra a sobrevivência de um livro, a palavra impressa e o direito autoral”
(pg. 28).
(Países em desenvolvimento, como o Brasil,
sempre viveram às turras com os países desenvolvidos no que concerne a direitos
autorais. Em tempos de “xerox”, de informática e Internet, a contenda somente
se acirrou. Em vez de pagar direitos autorais, esses países preferem fazer
pirataria. Para começar, basta ver o escândalo que ocorre em nossas
universidades, onde milhares de máquinas copiadoras não cansam de reproduzir
folhas e mais folhas de livros didáticos, não destinando 1 centavo sequer para
os autores. As feiras-livres são verdadeiros portos seguros para piratas de
toda espécie. Vendem-se milhões de CDs, fitas cassette, roupa com etiqueta
falsificada etc., ocasionando um prejuízo de bilhões, tanto para os cofres
públicos – já que os ambulantes não pagam impostos –, quanto para os autores
das obras e os detentores de marcas famosas. Quando também não vendem produtos
roubados, adquiridos de interceptadores de cargas roubadas nas rodovias
brasileiras ou mesmo dentro de grandes centros urbanos, como São Paulo. Em
Brasília, durante o governo de Cristóvam Buarque, foi criada uma feira para
reunir vendedores ambulantes da cidade, logo congnominada “Feira do Paraguai”,
tal a quantidade de produtos piratas que são encontrados no local. Ou seja, a
pirataria ganhou selo governamental. Na área da informática, a sem-vergonhice é
total. Calcula-se que no Brasil mais de 80% dos programas de computador são
pirateados. Uma vergonha!)
(É notório o imbroglio resultante de o
governo brasileiro não reconhecer as patentes de medicamentos em poder de
multinacionais, especialmente dos EUA. Muitas retaliações comerciais o Brasil
já sofreu devido a isso. Mesmo em se tratando de medicamentos para a AIDS, o
Brasil – na pessoa de seu ex-ministro da Saúde, José Serra – deveria dar o
devido valor ao esforço inventivo de empresas que conseguiram dar uma sobrevida
aos aidéticos. É fácil realizar a beneficência, ser a Madre Tereza de Calcutá,
utilizando-se do invento de outros, quebrando patentes ou exigindo que os
preços de certos medicamentos sejam os mais baixos do mundo. Pois fica a
pergunta: por que as empresas continuariam a gastar bilhões em projetos
custosos, se no futuro elas não teriam garantido o retorno do dinheiro
empregado, para a continuação de outros projetos? Melhor seria ficar de tocaia,
observar quando aparecesse um novo produto na praça e, espertamente, fazer uma
cópia pirata. Ao menos é assim que pensa uma grande parcela da sociedade
brasileira, especialmente aquela composta pelos socialistas de todos os matizes
– do rosa-chocking dos sociais-democratas ao vermelho-sangue dos stalinistas
que aqui ainda proliferam a altas taxas de natalidade.)
(Há casos em que se chega ao absurdo de não se
comprar a roda, nem permitir que ela seja produzida no País, mas criar uma
empresa para inventá-la novamente. Foi, p. ex., a história de ópera bufa da
“reserva de informática”, durante a “República dos Marcianos” – a do
“verde-oliva”, dos presidentes quatro-estrelas. Embora visceralmente
anticomunistas, os militares estatizaram o Brasil quase tanto quanto Lênin
havia feito na Rússia, autênticos Gosplans tocavam nosso
desenvolvimento, na forma de inúmeras “BRÁS”: Telebrás, Portobrás, Eletrobrás,
Nuclebrás etc. Desta forma, os “marcianos” de Geisel fundaram a Secretaria
Especial de Informática (SEI), que tinha como objetivo criar o computador
padrão para a Terra Brasilis, A SEI, atuante durante o período de 1975 a
1992, colocou o Brasil em uma posição de destaque junto aos países defasados
tecnologicamente. O que se viu foi uma vergonha sem fim: não foi criado nenhum
computador, apenas se montou um tosco Frankenstein, recheado de peças
contrabandeadas de Taiwan, da China, da Tailândia e da Malásia, só o gabinete
era genuíno produto nacional. E o preço final era dez vezes maior que o do
produto similar estrangeiro. Batidas policiais eram feitas em escritórios pela
Receita Federal e pelo SNI, para confiscar computadores importados - vale dizer,
contrabandeados. O contrabando só era permitido se fosse “federal”: “...
quando declararam que o Sisne 3.000, da brasileira Scopus, era funcionalmente
equivalente ao DOS, da Microsoft. E o programa dito brasileiro era mera cópia
do DOS, cópia autorizada e legalizada pela SEI” (Gilberto Paim, op. cit.,
pg. 86). Coisa de marciano. As grotescas cópias piratas de computador
realizadas no Brasil bem que podiam ter sido denominadas de “PC-171”: P de
pirata, C de contrabando, e 171 – conhecido artigo de nosso Código Penal.)
Novak diz que há uma alternativa ao sistema de
patentes: o regime de “segredos comerciais”. “Existem milhares desses
segredos comerciais privados e rigorosamente guardados, sendo que talvez o mais
famoso seja a fórmula da Coca-Cola” (pg. 35). Complementa Novak: “Mas a
grande vantagem de um regime de patentes sobre um regime de segredos comerciais
é a publicação aberta. Uma patente é inscrita detalhadamente nos registros
públicos; apenas aquilo que estiver declarado em documentos públicos está
protegido. Ironicamente, por estas mesmas razões, um regime de patentes torna
publicamente disponível o conhecimento prático que um regime sem patentes frequentemente
mantém em segredo e inacessível, e, desta maneira, expande-se o domínio do
conhecimento científico, que se torna publicamente acessível” (pg. 35-36).
(Hoje, teoricamente, qualquer discípulo de Osama
bin Laden pode construir uma bomba atômica para lançar sobre Tio Sam. Não
existe mais segredo industrial de como uma bomba atômica, termonuclear ou de
nêutrons possa ser construída. A fórmula pode ser encontrada em bibliotecas
especializadas e até na Internet. O problema reside na prática, em como se
obter a matéria-prima, em como esse conhecimento adquirido na literatura
universal poderá se tornar viável para o fabrico, o manuseio, o lançamento e
até a explosão de tal artefato bélico.)
Uma outra fórmula alternativa a um regime de
patentes foi sugerida pelo economista liberal Friedrich von Hayek. Ele
argumentava que o caso dos direitos autorais “deve situar-se quase
inteiramente sobre a circunstância de que trabalhos de grande utilidade, como
enciclopédias, dicionários, livros didáticos e outros trabalhos de referência
não poderiam ser criados se, uma vez existentes, pudessem ser reproduzidos
livremente” (pg. 36).
Novak não concorda com a proposta de Hayek, pois
“essas pessoas socialmente úteis deveriam arcar com todos os custos do
tempo, esforço, investimento financeiro e sacrifício pessoal para produzir suas
criações, enquanto todos os demais seriam livres para usufruí-las. As nações
que têm tutelado patentes e direitos do autor, conforme demonstra a
experiência, têm observado uma explosão de invenções e descobertas muito além
daquelas obtidas sob o regime de não patenteamento” (pg. 36). Novak conclui
com uma pergunta retórica: “de que maneira algo pode ser consumido sem antes
haver sido produzido, e de que modo pode ser produzido se não há qualquer
incentivo para que seja inventado e oferecido ao mercado?” (pg. 37).
Sobre a frequente afirmação de que a proteção da
propriedade intelectual beneficia os países ricos às custas dos países do terceiro
mundo, Novak prova em quatro considerações que esse argumento ignora que os
mais prejudicados são os pobres:
- “Primeiro, quando seus melhores inventores
e suas mentes mais criativas emigram para países onde as leis de patentes e
direitos autorais são cumpridas (como o caso de muitos russos que agora
trabalham na indústria da computação nos Estados Unidos), as nações que carecem
desta proteção padecem da chamada ‘fuga de cérebros’.
- Segundo, os países em desenvolvimento
necessitam desesperadamente do capital de risco, porém a ausência de leis de
propriedade intelectual afugenta este capital – e os empregos.
- Terceiro, sem a proteção das patentes e dos
direitos autorais, é pouco provável que as empresas multinacionais se
estabeleçam em um determinado país; não obstante, as multinacionais trazem
consigo mais benefícios, um tratamento mais humano e maiores oportunidades do
que as geralmente encontradas em negócios locais.
- Quarto, sem a proteção dos direitos de
propriedade intelectual, dificilmente as indústrias nativas crescem a ponto de
tornarem-se produtoras de nível multinacional e empregadoras em grande escala,
como seus países tanto necessitam” (pg. 38
e 39).
Finalmente, Novak diz também algo sobre a
genética. O autor inicia o assunto afirmando que “os inventores médicos de
nossa época desenvolveram magníficos substitutos artificiais para repor ‘certas
partes do corpo’ quando nossos órgãos originais param de funcionar,
permitindo-nos viver uma vida melhor e mais longa. Quando o Papa João Paulo II
quebrou o quadril em 1994, por exemplo, a colocação de uma prótese parcial
fez-se possível” (pg. 30). Porém, no tocante à genética e à biogenética, a
questão é mais grave. “Ninguém está se referindo às partes físicas do corpo,
como braços, pernas e rins, mas sim à identificação e isolamento de componentes
da nossa configuração genética” (pg. 30). Porém, há um lado positivo, diz
Novak, corroborado por João Paulo II: “O progresso científico, como aquele
que se relaciona com o genoma, representa um crédito à razão humana, pois o
homem é chamado a ser o senhor da criação, e ele honra o Criador, fonte de toda
a vida, que confiou à raça humana o dever de zelar pelo mundo” (pg. 31).
Quanto aos chamados “efeitos Frankenstein”,
Novak enfoca três modalidades: a criação de animais transgênicos, o
patenteamento de seres humanos modificados geneticamente e embriões humanos
clonados com o fim de reproduzir seus tecidos para pesquisa médica. O primeiro
caso não incomoda muito os cientistas, pois “não entendem ser muito diverso
do uso da genética para a modificação de plantas” (pg. 31). “Os outros
dois casos – seres humanos manipulados através da engenharia genética e a
clonagem de embriões para o fim de produção controlada – despertam profundas
dúvidas morais e até mesmo repulsão moral” (pg. 31).
Segundo Novak, deve-se distinguir os vários
tipos de pesquisa genética. “Certas doenças e vulnerabilidades corporais,
como já se conhece há muito tempo, são herdadas, e os genes específicos que
provocam esses defeitos podem ser agora isolados” (pg. 31). As intervenções
científicas não devem alterar a estrutura fundamental da pessoa humana, porém
corrigir suas deficiências. “O isolamento do gene que causa anemia por má
formação celular (sickle cell anemia), uma grave doença sanguínea que afeta
mais de 50 mil americanos (a maioria deles afro-americanos), levou ao
desenvolvimento de uma molécula sintética que representa uma grande promessa
para o tratamento da enfermidade hereditária” (pg. 32).
(Lendo a pequena, porém profunda obra de Michael
Novak, somos levados a concordar com a tese intrínseca existente em todo o
texto do livro, magistralmente enunciada por Abraham Lincoln: é sumamente
necessário o “combustível do interesse” - o reconhecimento do direito
intelectual - para que o “fogo do gênio” não fique apagado, fumacento, uma
“brasa dormida” à margem do complexo destino humano, em contínuo
desenvolvimento econômico, psicossocial, religioso, filosófico e político.)
Notas:
(1) NOVAK, Michael. “O Fogo da Invenção, o
Combustível do Interesse – sobre a propriedade intelectual”. Instituto Liberal,
Rio de Janeiro, 1998 (Tradução de Ingrid Schroeder Levy).
(2) PAIM, Gilberto Ferreira. “O Filósofo do
Pragmatismo – Atualidade de Roberto Campos”. Editorial Escrita, Rio de Janeiro,
2002.