Divagações sobre o último livro de Olavo de Carvalho, "O mínimo que você precisa saber para não ser um idiota"
Olavo de Carvalho é um sujeito esquisito
Félix Maier
25/09/2013
Acaba de ser lançado no mercado o livro de Olavo de Carvalho, “O mínimo que você precisa saber para não ser um idiota”, organizado por Felipe Moura Brasil e lançado pela Record. Como sempre ocorre com Olavo, a “grande mídia” simplesmente ignorou o fato. Abateu-se sobre o filósofo o mais estrondoso silêncio.
Apesar do boicote da intelligentzia tupiniquim, já na primeira semana o livro apareceu em 4º lugar entre os mais vendidos da lista de Veja – e continua no mesmo patamar três semanas depois. Assim como é certo ouvir-se a trovoada depois do raio, esquerdistas invejosos logo lançaram a mentira de que os milhares de livros vendidos (na primeira semana, foram 10.000) foram comprados por “financiadores” secretos de Olavo. Este deve ter dado altas gargalhadas, e até perdeu alguns minutos de seu precioso tempo para dar uma boa resposta aos idiotas que não leram o livro e, mesmo assim, não gostaram.
A respeito do estrondoso silêncio da mídia, Olavo esclarece: “Quando não se contentam em baixar sobre os adversários a mais pesada cortina de silêncio, dedicam-se a difamá-los pelas costas, inventando a respeito as histórias mais escabrosas, tratando-os como criminosos, colocando-os em ‘listas de inimigos’ e cumprindo à risca a regra de Lênin: não discutir com o contestador, mas destruí-lo politicamente, socialmente e, se possível, fisicamente” (pág. 315 – “O plano e o fato”, Diário do Comércio, 11/03/2013).
O livro de Olavo é uma compilação de importantes artigos, publicados em jornais e revistas, de 1997 a 2013. Os artigos – melhor dizendo, ensaios e, por que não?, pequenos tratados – estão reunidos em 25 capítulos temáticos, onde os assuntos, correlatos, se mantêm coesos e complementares. Como são textos curtos, você pode saboreá-los aos poucos, como drops, mesmo aleatoriamente.
Passei a admirar Olavo de Carvalho depois de ler uma reportagem de capa da revista República. Depois de acompanhá-lo semanalmente na revista Época, escrevi o texto Olavo Denisovich Carvalho. Por isso, é com orgulho que me considero um “olavete”, como alguém já me chamou. Triste eu ficaria se me chamassem de “emirete” (Emir Sader), “marilenete” (Tiazinha Chauí), “bagnete” (Marcos Bagno)...
Por que Olavo de Carvalho é um sujeito esquisito, muito esquisito? Olha só o que ele diz no livro, em “Orgulho do fracasso”, artigo publicado em O Globo, 27/12/2003: “Língua, religião e alta cultura são os únicos componentes de uma nação que podem sobreviver quando ele chega ao término da sua duração histórica” (pág. 65). Onde já se viu um cara falar em religião, sem ser padre ou pastor, nestes tempos do politicamente correto, em que predominam a pregação pagã e os ataques permanentes contra o Cristianismo?
O organizador do livro tem razão: “Olavo de Carvalho é um homem de fé”. Ele não tem vergonha de falar de Deus, de São Paulo Apóstolo, do salmista, dos evangelistas, da Bíblia, do Corão, do Budismo, da espiritualidade. Há quarenta, cinquenta anos, ainda havia escritores brasileiros importantes que evocavam Deus em suas obras, como Alceu Amoroso Lima, Gustavo Corção, Austregésilo de Athayde. Qual é o pensador brasileiro de renome que hoje em dia defende os três domínios que uma nação deve ter, para atingir seu desenvolvimento pleno, ou seja, a língua, a alta cultura e a religião?
Continua Olavo: “A Alemanha foi o foco irradiador da Reforma e em seguida o centro intelectual do mundo – com Kant, Hegel e Schelling – antes mesmo de constituir-se como nação. Os EUA tinham três séculos de religião devota e de valiosa cultura literária e filosófica antes de lançar-se à aventura industrial que os elevou ao cume da prosperidade. Os escandinavos tiveram santos, filósofos e poetas antes do carvão e do aço. O poder islâmico, então, foi de alto a baixo criatura da religião – religião que seria inconcebível se não tivesse encontrado, como legado da tradição poética, a língua poderosa e sutil em que se registraram os versículos do Corão. E não é nada alheio ao destino de espanhóis e portugueses, rapidamente afastados do centro para a periferia da noite para o dia, sem possuir uma força de iniciativa intelectual equiparável ao poder material conquistado” (pág. 66).
Olavo finaliza aquele artigo, resumindo sucintamente o que ocorreu no país do bundalelê, onde a “alta cultura” é eleger a mulher-tomate, rebolar o traseiro sobre uma garrafa, ver novela da TV Globo: “Escolhendo o imediato e o material acima de tudo, o povo brasileiro embotou sua inteligência, estreitou seu horizonte de consciência e condenou-se à ruína perpétua” (pág. 67).
Segue Olavo: “‘Cultura’, no Brasil, significa antes de tudo ‘artes e espetáculos – e as artes e espetáculos, por sua vez, se resumem a três funções: dar um bocado de dinheiro aos que as produzem, divertir o povão e servir de caixa de ressonância para a propaganda política... Foi preciso, no festival de Paraty, uma escritora irlandesa (Edna O’Brien) vir avisar aos brasileiros que Chico Buarque de Holanda não faz parte da literatura” (pág. 72 – “A fonte da eterna ignorância”, DC, 27/07/2009). E haja Jabutis literários para os cágados esquerdistas, jabaculês para a indústria da música, regalos da Lei Rouanet para o cinemaço nacional.
O desastre não podia ser pior: “Considerando-se os nossos cinco séculos de história, a extensão física e o volume populacional deste país, a nulidade da nossa contribuição espiritual chega a ser um fenômeno espantoso, sem paralelo na história do mundo” (pág. 64 – “Espírito e cultura”, 31/12/1999).
Olavo tem 8 filhos, aos quais deu um ensino doméstico (homeschooling) de alto nível, que não obteriam nas escolas tradicionais. Ele afirmou que seu filho mais culto é o que passou menos tempo na escola. Ele próprio é um autodidata, um filósofo self-made, sem diplomas acadêmicos. Verdadeiro mestre da lógica, ele sabe utilizar como ninguém as técnicas da argumentação e da refutação, entremeadas com boa dose de humor e ironia. Cedo Olavo aprendeu que, se queria obter conhecimento profundo das coisas, teria que procurar longe dos cursos oferecidos pelas universidades.
E os palavrões de Olavo, que tanto escandalizam os “stalinistas puritanos” do politicamente correto? “Alguns ouvintes já entenderam que a linguagem paradoxal do meu programa True Outspeak – explicações eruditas entremeadas de palavrões grosseiros – é um esforço barroco, talvez falhado, de sintetizar o insintetizável, de resgatar para a esfera da alta cultura a fala disforme e quase animal do novo Brasil. Muitos nem percebem a diferença entre a linguagem tosca e sua imitação caricatural” (pág. 331 – “O Brasil falante”, DC, 28/02/2011).
Sobre Yoani Sánchez, que disse que “em Cuba nunca houve comunismo, apenas capitalismo de Estado”, Olavo transcreve trecho do Manifesto Comunista para desmascarar a blogueira cubana: “A última etapa da revolução proletária é a constituição do proletariado como classe dominante... O proletariado servir-se-á da sua dominação política para arrancar progressivamente todo o capital da burguesia, para centralizar todos os meios de produção nas mãos do Estado, isto é, do proletariado organizado” (pág. 318 – “Debilidades”, DC, 02/06/2013).
Olavo escreve os textos com uma vara de marmelo ao lado. Ele não expõe nenhuma pessoa ao ridículo devido a seus pecados privados, porém não tem medo de apontar nominalmente essa ou aquela celebridade quando os pecados são públicos e altamente criminosos, camuflados atrás de conceitos vaporosos como “sociedade”, “grupo social”, “responsabilidade coletiva” – enfim, a esquerdalhada que só sabe agir em grupo, lambendo os rabos sujos uns dos outros, como as alcateias de cães selvagens e os casais swing. Para Olavo, a responsabilidade deve ser sempre individual, não coletiva, como já havia enunciado em sua obra-prima “O Jardim das Aflições” (Realizações, 2000, pág. 174): “Se quem dá coices são os cavalos e não a cavalidade, do mesmo modo quem age é o homem concreto, não a sociedade”.
E por que o gramscismo se estabeleceu tão amplamente na sociedade brasileira? Olavo não tem meias palavras ao afirmar que a estratégia adotada pelos militares, especialmente a teoria de Golbery do Couto e Silva, O bruxinho que era bom, de deixar uma válvula de escape da "panela de pressão" aos esquerdistas, contribuiu decisivamente para que isso ocorresse. Após 1964, “uma ala mergulhou na leitura das idiotices de Regis Débray e Che Guevara, torrando suas energias na ‘revolução impossível’ das guerrilhas. Outra, mais esperta, recuou e apostou na estratégia de longo prazo que propunha ir conquistando o universo inteiro das artes, do ensino, da cultura, do jornalismo – discretamente, como quem não quer nada – antes de arriscar a sorte na luta direta contra o inimigo político. O governo militar, obsediado pelo empenho de reprimir as guerrilhas, não ligou a mínima para esses empreendimentos pacíficos, aparentemente inofensivos. Fez vista grossa e até os apoiou como derivativo e alternativa aceitável à oposição violenta. A ideia gramsciana foi tão bem-sucedida que, já em plena ditadura militar, a esquerda mandava nas redações, marginalizando os direitistas mais salientes – Gustavo Corção, Lenildo Tabosa Pessoa – até excluí-los totalmente das colunas de jornais” (pág. 326-7 – “Da fantasia deprimente à realidade terrível”, DC, 11/09/2006).
Olavo é como o profeta que sobe à montanha para encontrar o silêncio e meditar sobre si mesmo, antes de discorrer sobre importantes questões do mundo atual, especialmente as do Brasil, ao mesmo tempo em que o povaréu, lá embaixo, se esfalfa na esbórnia, em adoração ao bezerro de ouro. “O reconhecimento interior não é só um exercício de memória, mas um esforço sério para ampliar a imaginação de modo que possa abarcar mesmo as possibilidades mais extremas e inusitadas. Você não pode fazer isso se não se dispõe a descobrir na sua alma monstros, heróis e santos que jamais suspeitaria encontrar lá” (pág. 401 – “Como ler a Bíblia” – JB, 17/01/2008).
E, como profeta, tem suas premonições: “Os editoriais escritos pelos srs. Roberto Marinho e Júlio de Mesquita Filho jamais poderiam ser publicados, hoje, nos próprios jornais que esses homens fundaram, onde o máximo que se permite, num espacinho minoritário, é um pouco de liberalismo chocho e inofensivo, quando não a pura crítica de esquerda a algum desmando ou patifaria mais vistosa do governo petista” (pág. 316 – “O plano e o fato”, DC, 11/03/2013). Isso Olavo escreveu em março, e, no dia 2 de setembro, cumpriu-se a profecia: a Rede Esgoto de Televisão, no Jornal Nacional, por meio de William Bonner, veio a público renegar o editorial do patriarca de O Globo, escrito em 1984, em que tecia elogios aos 20 anos de governo militar. Hoje, para ser jornalista de O Globo, o sujeito deve obrigatoriamente ser militante esquerdista.
“Olavo de Carvalho não é para frouxos” – afirma o organizador do livro na apresentação da obra. E como o Brasil poderia sair do marasmo em que se encontra? Olavo dá uma pista, o esquisito Olavo, mais uma vez discorrendo sobre espiritualidade: “Lutar para que a cultura brasileira se ligue às fontes centrais e permanentes do conhecimento espiritual, para que a experiência da visão espiritual ingresse no nosso horizonte de aspirações humanas e, uma vez obtida, faça explodir, com a força das intuições originárias, todo um mundo de formas imitativas e periféricas, gerando uma nova vida” (pág. 64 – “Espírito e Cultura”, 31/12/1999).
Na obra, não podia faltar uma abordagem sobre a “língua de pau” do politicamente correto, que tem a finalidade de distorcer e congelar certas expressões linguísticas, de modo que tenham apenas o significado da ideologia socialista. (Para Olavo, “ideologia é a prostituição da inteligência” – pág. 448 – “Conversa sobre estilo” – 28/04/2000.) “O termo ‘fascismo’, que cientificamente compreendido se aplica com bastante propriedade a muitos governos esquerdistas do terceiro mundo, é usado pela esquerda como rótulo infamante para denegrir ideias tão estranhas ao fascismo como a liberdade de mercado, o antiabortismo ou o ódio popular ao mensalão” (pág. 434 – “A palavra-gatilho”, DC, 08/06/2012).
No livro, Olavo lembra também a “espiral do silêncio”, que acovardou os líderes da Igreja Católica nos dois últimos séculos: “Trata-se de extinguir, na alma do inimigo, não só uma disposição guerreira, mas até sua vontade de argumentar em defesa própria, seu mero impulso de dizer umas tímidas palavrinhas contra o agressor... Calar-se ante o atacante desonesto é uma atitude tão suicida quanto tentar rebater suas acusações em termos ‘elevados’, conferindo-lhe uma dignidade que não tem. As duas coisas jogam você direto na voragem da ‘espiral do silêncio’. A Igreja do século XVIII cometeu esses dois erros como a Igreja de hoje os está cometendo de novo” (pág. 416-18 – “Maquiadores do crime – DC, 20/09/2010).
Enfim, isso e muitíssimo mais é exposto no livro do Olavo, que é um convite para que todos nós nos modifiquemos primeiro por dentro para depois tentar modificar o que está em volta. E aí, já comprou o livro ou vai continuar pensando e falando como um idiota?
Leia o último livro de Olavo de Carvalho
“O mínimo que você precisa saber para não ser um idiota”
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