Quarta-feira, 7 de agosto de 2019
Pós-verdade: “A verdade ficou para trás, não interessa mais a sua busca”
Por Osório Silva Barbosa Sobrinho, Gianfranco Faggin Mastro Andréa e Giovanna Pinhanelli Faria de Paula
Um termo que se tornou comum de se ouvir na atualidade é o da: “pós-verdade”. Mas em que consistiria tal fenômeno? Mattew D’Ancona, jornalista político britânico, por meio de seu livro “Pós-verdade: a nova guerra contra os fatos em tempos de fake news”, nos oferece uma luz quanto a esta questão palpitante.
Para o autor a pós-verdade seria uma reação da população em relação à classe política, aos meios de comunicações oficiais e à própria ciência, em que se faz prevalecer a emoção, as crenças e as ideologias sobre os fatos objetivos. O prefixo “pós” significa que a verdade ficou para trás, ou seja, não interessa mais a sua busca. Assim, há a perda de nexo ou vínculo com o factual, porém isso não quer dizer que pós-verdade é uma simples mentira, mas sim uma escolha individual dentre várias informações daquela que mais aprouver ao indivíduo, segundo seu universo.
A preponderância da pós-verdade não se trata de privilégio brasileiro, mas de verdadeiro movimento global. Isto ocorre em função da crise que o sistema democrático vem passando, principalmente diante da descrença populacional no sistema representativo. Há um enorme abismo entre o que almeja a população e o que seus representantes políticos discutem no parlamento. Com efeito, o povo não se sente mais representado. E os endêmicos casos de corrupção no âmbito da política também contribuem para desgastar ainda mais a imagem das instituições democráticas. Trata-se da “neo-democracia”, uma vez que, mesmo onde ocorrem tais fenômenos, a democracia os legitima e garante sua preponderância respeitando o jogo democrático.
Para além disso, a imprensa oficial, ou seja, aquela que ostentaria respeito perante a população, caiu por terra. Passa-se a questionar as notícias, ainda que possam ser comprovadas como verdades objetivamente. Constata-se o surgimento da “neo-imprensa”, porquanto a imprensa oficial, ou tradicional, ganhou tal descrédito diante do vislumbre do cidadão que percebeu que ela, mesmo diante dos fatos ditos objetivos, costumava distorcê-los para atender aos seus próprios interesses, pois está sempre ligada a grupos econômicos. Foi profético o poeta Raul Seixas quando disse: “eu não preciso de jornais, mentir sozinho eu sou capaz”, há mais de trinta anos! O acesso às redes sociais deu a todos essa possibilidade (para o bem ou para o mal)! Dá-se maior valor à imprensa alternativa, porquanto esta sim veicularia notícias verdadeiras, uma vez que não teriam sido cooptadas pelo sistema. Aliás, é assim que a própria imprensa tradicional, diante da sua derrocada, e para não sucumbir de vez, vem adaptando-se ao fenômeno, tanto o é que passou a checar as notícias divulgadas nas redes sociais para atestá-las se verdadeiras ou falsas. Não que seu “atestado” valha muito, mais assim ela entra no jogo.
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Osório Silva Barbosa Sobrinho é mestre em Direito Constitucional pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo. Procurador Regional da República da 3ª Região
Gianfranco Faggin Mastro Andréa é mestre em Direito Político e Econômico pela Universidade Presbiteriana Mackenzie. Especialista em Direito Público pela Faculdade de Direito Damásio de Jesus.
Giovanna Pinhanelli Faria de Paula é bacharelanda em Direito pela Universidade de São Paulo – USP
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