MEMORIAL 31 DE MARÇO DE 1964

MEMORIAL 31 DE MARÇO DE 1964
Avião que passou no dia 31 de março de 2014 pela orla carioca, com a seguinte mensagem: "PARABÉNS MILITARES: 31/MARÇO/64. GRAÇAS A VOCÊS, O BRASIL NÃO É CUBA." Clique na imagem para abrir MEMORIAL 31 DE MARÇO DE 1964.

sexta-feira, 8 de outubro de 2021

MEMÓRIA 1964 - O dossiê do braço armado de Brizola - Por CBN





Fragmentos do dossiê postado pela CBN



MEMÓRIA 1964 - 

O dossiê do braço armado de Brizola

Por CBN

(site da CBN, 23 de janeiro de 2009)

   http://cbn.globoradio.globo.com/hotsites/grupo-dos-onze/GRUPO-DOS-ONZE.htm


No fim de 1963, em meio à crescente radicalização do ambiente político do governo de João Goulart, Leonel Brizola era a liderança que unificara as esquerdas na Frente de Mobilização Popular. Entrincheirado na Rádio Mayrink Veiga, onde discursava todas as noites, ele pregava a criação dos Grupos de Onze Companheiros, compostos por cidadãos que marchariam unidos quando a esquerda tomasse o poder. A CBN teve acesso a documentos daquela época – que estavam em poder dos militares – que detalham como Brizola idealizou os Grupos de Onze: uma militância que pretendia utilizar mulheres e crianças como escudos civis; realizar ataques a centrais telefônicas, de rádio e TV; e previa a execução de prisioneiros.


Grupos de Onze: o braço armado de Brizola

Por: Mariza Tavares


Edição de arte: Fernanda Osternack

'Este é o documento a que me referi. O Exército não sabe que este dossiê ainda existe, porque foi dada uma ordem para que fosse destruído.' Este era o texto do curto bilhete que acompanhava o pacote que recebi pelo correio, enviado por uma ouvinte fiel da CBN. Dentro, um calhamaço de 64 páginas já amareladas, no qual chamava atenção o carimbo no alto, em letras garrafais: SECRETO. A ditadura militar brasileira incinerou regularmente documentos sigilosos. Este dossiê estava em poder de um militar que preferiu desobedecer à ordem e decidiu guardar os papéis em casa.

Datado de 30 de setembro de 1964 e assinado pelo general-de-brigada Itiberê Gouvêa do Amaral, o documento ostenta a classificação A-1, que até hoje é utilizada pela área militar e que significa que é de total confiança. A classificação varia de A a F para a confiabilidade da fonte; e de 1 a 6 para a confiabilidade do conteúdo.

No tom formal e meticuloso típico dos relatórios dos serviços de inteligência, o texto de abertura, a circular de número 79-E2/64, anunciava que havia sido identificada a criação de diversas células dos chamados 'Grupo de onze companheiros' no interior do Paraná e de Santa Catarina.

'Os grupos constituíam a célula de um grande contingente, no qual seriam arregimentados homens das mais variadas categorias e profissões para servirem de instrumento a um pseudolíder, Leonel Brizola, em sua política de subversão do regime e implantação de um Governo de tendências antidemocráticas', explicava o documento.

Os militares já haviam deposto o presidente João Goulart e tomado o poder naquele ano; e a circular festejava a ação ao afirmar, categoricamente, que, 'com o advento da revolução de 31 de março, foi cortado o processo ainda na fase inicial'. No entanto, o documento assinalava: 'Há indícios de que, no futuro, possa ser novamente equacionada a reestruturação dos grupos.' Leonel Brizola já se encontrava no exílio no Uruguai desde maio daquele ano, mas a circular assinalava que havia informes de contatos entre 'antigos elementos' que integravam esses grupos. Daí a necessidade de mobilização de oficiais para mapear qualquer atividade suspeita.

Jorge Ferreira: 'Houve quem se inscrevesse apenas porque gostava de Brizola. Teve gente que pôs até o nome de filhos pequenos nas fichas de inscrição.'

Os chamados Grupos de Onze Companheiros – simplificadamente, Grupos de Onze ou Gr-11 – e também conhecidos como Comandos Nacionalistas foram concebidos por Brizola no fim de 1963. Tomando por base a formação de um time de futebol, imagem de fácil assimilação e apelo popular, Brizola pregava a organização de pequenas células – cada uma composta de onze cidadãos, em todo o território nacional – que poderiam ser mobilizadas sob seu comando.

Jorge Ferreira, professor-titular de História da UFF (Universidade Federal Fluminense), doutor em História Social pela USP (Universidade de São Paulo) e autor do livro 'O imaginário trabalhista', explica que um dos poucos documentos disponíveis sobre o Grupo de Onze é o modelo de ata de adesão. 'Há poucos estudos sobre este movimento e praticamente não há documentação a respeito. As atas, com os dados dos participantes, eram enviadas para a Rádio Mayrink Veiga e depois ficaram em poder da repressão. Como os Grupos de Onze foram criados no fim de 1963, o clima de radicalização já se generalizara. A imprensa também supervalorizava sua capacidade de ação, mas a verdade é que houve quem se inscrevesse apenas porque gostava de Brizola e nunca teve participação efetiva. No Sul, muitos achavam que iam ganhar terra, sementes. Teve gente que pôs até o nome de filhos pequenos nas fichas de inscrição.'

O dossiê a que a CBN teve acesso disseca o manual de ação desses militantes e foi criado quando Brizola, eleito deputado federal pelo PTB (Partido Trabalhista Brasileiro) com 300 mil votos – até então, o mais votado da antiga Guanabara – ocupou quase que diariamente o microfone da Rádio Mayrink Veiga entre 1962 e 1963. A tradicional emissora do antigo Distrito Federal, existente desde 1926, funcionava como palanque para Brizola, que ali destilava inflamados discursos pela aprovação das reformas de base – pilar do governo João Goulart e que compreendiam da reforma fiscal à agrária, com a desapropriação de terras de grandes proprietários rurais. E garantia que elas seriam aprovadas, 'na lei ou na marra'. A Mayrink Veiga estava tão identificada com o projeto político brizolista que uma cópia do documento assinado pelos integrantes de cada recém-criado Gr-11 deveria ser enviada para a emissora. A militância da Mayrink Veiga provocou uma reação dos empresários de comunicação Roberto Marinho (Rádio Globo), Manoel Francisco Nascimento Brito (Rádio Jornal do Brasil) e João Calmon (Rádio Tupi): a criação da Rede da Democracia, uma cadeia radiofônica para combater a política do presidente Jango. Também selou sua sorte: a emissora foi fechada pelo presidente militar Castelo Branco um ano depois da queda de João Goulart.

O documento é composto de anexos que detalham o modus operandi dos Grupos de Onze. O primeiro deles tem cinco páginas dedicadas aos 'companheiros nacionalistas', numa espécie de cartilha para a promoção e organização de um comando nacionalista. Na abertura, uma afirmação categórica de vitória: 'A ideia de organização do povo em Comandos Nacionalistas (CN) ou em Grupos de Onze (Gr-11) está amplamente vitoriosa. Milhões e milhões de patriotas integram os Comandos Nacionalistas formados em todo o território pátrio: a palavra de ordem, organizados venceremos, penetrou na consciência de todos os nacionalistas brasileiros.'

Para organizar um Gr-11, a primeira providência era a leitura e o estudo das instruções, 'quantas vezes forem necessárias até uma segura compreensão dos fins e objetivos da organização.' A etapa seguinte era 'procurar os companheiros com os quais têm convivência e ligações de confiança'. Vizinhos ou colegas de trabalho eram os mais indicados, e sempre em grupos reduzidos, de três ou quatro pessoas. Diante de receptividade para a ideia de organizar um Gr-11, 'tal decisão significará um verdadeiro pacto de solidariedade e confiança entre os companheiros.'

O objetivo era reunir 11 pessoas, mas as instruções reconhecem que arregimentar este contingente poderia ser um pouco difícil e estabelece que, com sete integrantes, a célula de militantes poderia começar a atuar. Ao alcançar este quorum mínimo, o grupo é fundado oficialmente e, depois da leitura do manual e do 'exame da situação política e da crise econômica e social que estamos atravessando', é escolhido o dirigente do Gr-11; seu assistente – e eventual substituto – e o secretário-tesoureiro. 'Tomadas estas decisões', prosseguem as instruções, 'proceder à leitura solene, com todos os onze companheiros de pé, do texto da ata e da carta-testamento do presidente Getúlio Vargas.' Os integrantes devem assinar seus nomes logo abaixo da assinatura de Vargas e do seguinte texto: 'O presidente Vargas sacrificou sua vida por nós. Nosso sacrifício não conhecerá limites para que o nosso povo, de que ele foi escravo, conquiste definitivamente sua libertação econômica e social.' Entenda-se que a 'libertação' passava por reforma agrária e fim da espoliação internacional.

A primeira reunião formal do grupo tinha objetivo bem burocrático: montar a estrutura do Gr-11. As funções estão bem detalhadas e cada integrante tem um papel específico (esta é a transcrição da descrição das tarefas):

Líder, dirigente ou comandante: representa, orienta e coordena as atividades do grupo, de acordo com as instruções partidárias e os objetivos da organização. Está previsto que seu mandato será a duração de um ano;

Assistente: prestar colaboração direta ao dirigente ou comandante do grupo, substituindo-o em seus impedimentos;

Secretário-tesoureiro: responsável pela gestão dos recursos financeiros e guarda de papéis e documentos (líder, assistente e secretário-tesoureiro formam a comissão executiva do Gr-11);

Comunicações: dois integrantes ficam encarregados das comunicações, que englobam a troca de informações entre os elementos do Gr-11, inclusive no caso de ser preciso avisar aos companheiros sobre a necessidade de esconderijo ou fuga;

Rádio-escuta: acompanhamento pelo rádio dos acontecimentos nacionais e locais;

Transporte: coordenação das possibilidades de transportes para os membros do grupo no caso de atos e concentrações públicas;

Propaganda: responsável por faixas, boletins, pichamentos, notícias para a imprensa;

Mobilização popular: contatos e ligações com o ambiente local, visando a formar um círculo de relações e colaboração em torno do grupo, principalmente para garantir o comparecimento em comícios ou outros atos públicos;

Informações: atribuição de fazer contatos e o levantamento de informações sobre a situação política e social, além de outros problemas que interessem o grupo. Também fica responsável pela organização partidária local;

Assistência médico-social: o companheiro deve ser, se possível, médico, enfermeiro ou assistente social, 'ou no mínimo com alguma noção ou treinamento para prestar assistência ou orientação a todas as pessoas necessitadas no ambiente onde atuar o Comando Nacionalista (por exemplo, aplicar injeção, conseguir medicamentos, curativos de emergência)'.

A proposta era criar sucessivos grupos de 11 integrantes até atingir 11 células com estas características, quando, como relata o documento, 'seus onze líderes formarão um Gr-11-2, isto é, um grupo de onze de 2º. nível, reunindo um total de 121 companheiros.'
Esta seria a matriz de multiplicação dos comandos nacionalistas: os 11 líderes escolheriam, entre si, um comandante de segundo nível, cuja responsabilidade seria a coordenação dos onze grupos; e os outros dez companheiros deste Gr-11-2 dariam apoio ao novo chefe. Mas nada de parar por aí, porque cada nova célula deveria perseguir sua clonagem ao infinito: 'se num município, numa cidade, área ou bairro, se organizarem onze grupos de onze, portanto um Gr-11-2 e depois onze grupos de 2º. nível, teremos um total de 1.331 companheiros na organização, os quais serão orientados e dirigidos por um Gr-11-3, ou seja, um grupo de onze de 3º. nível, integrado pelos onze líderes dos grupos de 2º. nível.'

As 'recomendações gerais' sugerem que os Gr-11 deveriam ser integrados inicialmente por companheiros de 'maior capacidade de direção e liderança'. Os demais grupos seriam compostos por militantes de capacidade 'aproximada ou igual'. O documento frisa que o movimento recebe, de braços abertos, gente de todas as procedências: 'No mesmo Gr-11 poderão estar um trabalhador da mais modesta atividade, ao lado de um médico; um trabalhador ou técnico especializado, um estudante, um agricultor, um intelectual, um motorista, ao lado de um camponês, um militar.'

O contato com a liderança nacional era de responsabilidade de um delegado de ligação (DL); enquanto não chegavam novas instruções, cabia ao Gr-11 realizar reuniões para estreitar os laços entre seus militantes e analisar a conjuntura, além de buscar adesões em sua área de atuação. 'Os companheiros devem estimular, particularmente, a formação de Gr-11 entre a mocidade e estudantes. É da maior significação esse ponto das presentes instruções. A nossa causa depende fundamentalmente do apoio e da integração dos jovens e das classes trabalhadoras.'

Embora não fizesse restrições a analfabetos, a arquitetura dos Gr-11 praticamente ignorava uma militância integral das mulheres: 'As companheiras integrantes do Movimento Feminino ou simpatizantes devem formar seus próprios Gr-11.

Oportunamente serão enviadas instruções especiais sobre a estrutura desses grupos de companheiras.'

O chamado Anexo C é composto de documentos de Leonel Brizola com o sugestivo título de 'Subsídios para a Organização dos Comandos de Libertação Nacional'. Tem oito seções, todas subdivididas num minucioso roteiro para a militância. E começa pelo nome a ser dado ao grupo. No capítulo 'Denominação', há cinco sugestões, por ordem preferencial: Comandos de Libertação Nacional (Colina); Comando Revolucionário de Libertação Nacional (Corlin); Comando Revolucionário dos Onze (Cron); Comando de Libertação Brasileira (Colb); e Comando dos Onze Revolucionários (Core).

O capítulo seguinte é o da 'Justificativa': 'A palavra revolucionária, como é sabido, exerce poderosa atração nas pessoas entre 17 e 25 anos – fator que servirá à etapa de arregimentação'. O documento aposta na força de atração do termo: 'A sigla onde aparece a ideia de revolução pode, com maiores possibilidades, ser difundida com certo mistério e mística de clandestinidade, complementada por instruções secretas, senhas, códigos, símbolos etc...', diz o texto que exibe rudimentos de técnica de marketing e motivação.

Vitor Borges: 'Os militares queriam saber como pretendíamos envenenar o reservatório de água e perguntavam onde estavam os sacos de veneno.'

O gaúcho Vitor Borges de Melo, natural de Alegrete, cidade que fica a cerca de 500 quilômetros de Porto Alegre, é um bom exemplo de arregimentação de jovens que queriam um pouco de ação. 'Eu e meus companheiros éramos simpatizantes de Brizola desde a Cadeia da Legalidade, em 1961. Eu já tinha me apresentado como voluntário nesta época. Depois passei a acompanhar os discursos na Rádio Mayrink Veiga e decidi entrar para o Grupo de Onze. Todos usavam nomes de guerra e o meu era Tavares.'

Aos 63 anos, embora seja citado como ex-integrante do Gr-11, Vitor na verdade só se lembra de ter participado de uma reunião. Mesmo assim ficou preso, incomunicável, por 31 dias. 'Os militares queriam saber como pretendíamos envenenar o reservatório de água de Alegrete e perguntavam onde estavam os sacos de veneno. Não sei de onde tiraram isso, como é que faríamos uma coisa dessas?', lembra Vitor, hoje aposentado, filiado ao PTB e beneficiado, pela Lei da Anistia, com uma indenização de R$ 12 mil.

Provavelmente, por só ter ido a uma reunião, Vitor não foi 'iniciado' em todas as propostas de ação do movimento.

No dossiê, a delimitação de áreas de ação é meticulosa e pretende cobrir todo o território nacional. Do contingente inicial de 11 membros, a proposta é multiplicá-los de forma que um distrito tenha 11 unidades de 11 membros, contabilizando 121 almas. A província terá 22 distritos, ou 2.662 membros; e a região será composta por 11 ou mais províncias, com 29.282 membros. O documento divide o país em sete regiões, mas exclui a Região Norte, provavelmente por problemas de logística:

1ª. Região: Guanabara, Rio de Janeiro e Espírito Santo;

2ª. Região: Bahia e Sergipe;

3ª. Região: Minas Gerais;

4ª. Região: São Paulo e Paraná;

5ª. Região: Santa Catarina e Rio Grande do Sul;

6ª. Região: Pernambuco, Alagoas, Paraíba e Rio Grande do Norte;

7ª. Região: Ceará, Piauí, Maranhão e Fernando de Noronha.

A estrutura administrativa nacional também previa um organograma que contava com um comandante supremo (CS); dois inspetores regionais (IN); e oito conselheiros regionais (CR), uma elite de burocratas encarregados de escolher, nomear ou destituir as camadas inferiores de militantes. Mas, abaixo deles, também havia espaço para muita gente se acomodar. O desenho da burocracia interna do poder é rico em categorias e deixaria qualquer analista de RH impressionado com o número de cargos.

Sob a estrutura nacional, há estruturas administrativas regionais, provinciais e distritais, com direito a chefias, secretarias-executivas, assessorias e monitorias. Ao todo, são listados 32 cargos de alguma relevância – uma longa carreira que se descortinava para os aspirantes à militância.

Especialmente suculento é o capítulo sobre instruções gerais aos companheiros que quisessem organizar um Gr-11. Uma das principais preocupações diz respeito à seleção de indivíduos: 'Procure conhecer bem as ideias políticas de cada uma das pessoas que você pretende convidar', ensina a cartilha, batendo na tecla da prudência: 'Convide a pessoa para uma conversa reservada. Peça sigilo sobre o assunto. Procure certificar-se de que ela manteve sigilo. Mande alguém, seu conhecido, testá-la nesse pormenor.'

A paranóia pela segurança se estende aos deveres dos dirigentes. Entre os dez itens listados, cinco dizem respeito ao controle da informação e dos membros do grupo: 'manter severa vigilância em sua jurisdição para evitar infiltrações de inimigos entre os seus comandados'; 'alternar, sempre, os locais de reuniões de seu grupo, fazendo as convocações sempre em código ou através de senhas'; 'manter sob rigoroso controle os arquivos secretos e os dados sigilosos sobre a organização e seus membros'; 'não discutir assuntos referentes aos planos dos Comandos de Libertação Nacional exceto com as pessoas autorizadas'; 'procurar organizar em sua jurisdição um esquema de rápida mobilização popular para enfrentar golpistas, reacionários e grupos antipovo.'O código de segurança detalha os cuidados a serem adotados e a ordem é clara: desconfiar o tempo todo. Por isso o telefone fica banido na transmissão de mensagens. O militante também deve anotar tudo o que ouvir sobre a organização, especialmente quando partir de um 'reacionário': 'até as piadas têm sua importância. Não as despreze.'Os comandantes são instruídos a buscar subordinados para os Grupos de Onze que sejam 'os autênticos e verdadeiros revolucionários, os destemerosos da própria morte.'

Os comandantes regionais, devido à sua importância na estrutura do movimento, recebem instruções secretas que só devem ser compartilhadas com os companheiros do Grupo de Onze 'com as devidas cautelas e ressalvas'. O filé mignon da pregação revolucionária brizolista se encontra no Anexo D, cuja abertura tem o pomposo título 'Preâmbulo Ultra-secreto' e determina que 'só os fortes e intemeratos podem intentar a salvação do Brasil das garras do capitalismo internacional e de seus aliados internos. Quem for fraco ainda terá tempo de recuar ante a responsabilidade que terá que assumir com o conhecimento pleno destas instruções.'

Os comandantes são instruídos a buscar subordinados para os Grupos de Onze que sejam 'os autênticos e verdadeiros revolucionários, os destemerosos da própria morte, os que colocam a Pátria e nossos ideais acima de tudo e de todos.' E a recomendação seguinte é evitar arregimentar parentes ou amigos íntimos.
Findo o preâmbulo, as instruções secretas têm dez seções. A primeira, sobre os objetivos, volta a pregar a importância do Gr-11 como a 'vanguarda avançada' do movimento e compara esta célula à Guarda Vermelha da Revolução Socialista de 1917.

Por ser revolucionária, ela não precisa prestar contas dos seus atos: 'Não nos poderemos deter à procura de justificativas acadêmicas para atos que possam vir a ser considerados, pela reação e pelos companheiros sentimentalistas, agressivos demais ou até mesmo injustificados.' Sem sombra de dúvida, os fins justificam os meios.

O quesito seguinte, que tem o título genérico de 'Observações', descreve o que seria uma espécie de estado de espírito permanente dos participantes: 'Os Grupos dos Onze Companheiros, como vanguardeiros da libertação nacional, terão que se preparar devidamente (...) devendo considerar-se, desde já, em REVOLUÇÃO PERMANENTE e OSTENSIVA.' A revolução cubana vitoriosa de Fidel Castro é a principal referência: 'A condição de militantes dos gloriosos Gr-11 traz consigo enormes responsabilidades e, por isso, embora para formação inicial de nossas unidades não seja condição sine qua o conhecimento da técnica propriamente militar, torna-se absolutamente necessário o da técnica de guerrilhas e a leitura, entre outras importantes publicações, do folheto cubano a respeito daquele mister.'

No terceiro capítulo, sobre a ação preliminar, os companheiros são instados a tentar conseguir o quanto antes armamentos para o 'Momento Supremo'. E a lista contempla desde espingardas a pistolas e metralhadoras. Com um lembrete: 'Não esquecer os preciosos coquetéis Molotov e outros tipos de bombas incendiárias, até mesmo estopa e panos embebidos em óleo ou gasolina.' A instrução reconhece a escassez de armas no movimento, mas conta com aliados militares (segundo o documento, 'que possuímos em toda as Forças Armadas') e garante ter o apoio da população rural. 'Os camponeses virão destruindo e queimando as plantações, engenhos, celeiros e armazéns.'

O descolamento entre propostas e realidade é flagrante, mas não diminui o grau de virulência da ação que, pelo menos em tese, seria desencadeada pelos Grupos de Onze. Juarez Santos Alves, de 61 anos, é contemporâneo e até hoje amigo de Vitor Borges de Melo. O pai, dono de farmácia, e o tio, militar, eram militantes do PCB (Partido Comunista Brasileiro) e foram sua inspiração. No entanto, no que diz respeito à sua passagem pelo Grupo de Onze, a monotonia imperava. 'Considero mais um grupo poético, porque nunca demos um passo além das reuniões. Falava-se em tomar o quartel, mas como é que iríamos resistir se no máximo tínhamos armas pessoais ou de caça?', rememora Juarez, que depois ingressou na Vanguarda Popular Revolucionária. Preso e torturado, foi beneficiado com uma indenização de R$ 100 mil.

A cartilha de ação inclui escudos humanos, saques e incêndios de edifícios públicos e empresas particulares, além da difusão de notícias falsas.

Em centros urbanos, a tática adotada será assumidamente a de guerra suja, com a utilização de escudos civis, principalmente mulheres e crianças. 'Nas cidades, os companheiros (...) incitarão a opinião pública com gritos e frases patrióticas, procurando levantar a bandeira das mais sentidas reivindicações populares, devendo, para a vitória desta tática, atrair o maior número de mulheres e crianças para a frente da massa popular.' Agitação é a palavra de ordem, com direito a depredação de estabelecimentos comerciais, saques e incêndios de edifícios públicos e de empresas particulares. Também estão incluídos ataques a centrais telefônicas, emissoras de rádio e TV. O objetivo? 'Com as autoridades policiais e militares totalmente desorientadas, estaremos, nesse momento, a um passo da tomada efetiva do Poder-Nação.'

Sobre a tática geral da guerrilha nacional, tema do item quatro, a ênfase recai na guerra de informação. Depois de a autodenominada ação revolucionária ter provocado o caos, o passo seguinte seria cortar a comunicação entre as cidades e divulgar apenas o que interessasse ao movimento. 'Difundindo-se notícias falsas, tendenciosas e inteiramente favoráveis aos nossos Gr-11 e aos nossos planos, com interceptação de comunicações telefônicas isolamento das cidades e de seus meios de comunicação.'

Em 'O porquê da revolução nacional libertadora', a explicação de cartilha revolucionária: a exploração do capital monopolista estrangeiro, principalmente americano; e a estrutura agrária baseada na concentração latifundiária. No capítulo sobre 'o aliado comunista', não resta dúvida de que Brizola não via o Partido Comunista Brasileiro (PCB) com a menor simpatia. 'Devemos ter sempre presente que o comunista é nosso principal aliado mas, embora alardeie o Partido Comunista ter forças para fazer a Revolução Libertadora, o PCB nada mais é que um movimento dividido em várias frentes internas em luta aberta entre si pelo poder absoluto e pela vitória de uma das facções em que se fragmentou.' E continua, aumentando o tom da crítica: 'São fracos e aburguesados esses camaradas chefiados pelos que veem, em Moscou, o único sol que poderá guiar o proletariado mundial à libertação internacional. Fogem à luta como fogem à realidade e não perderão nada se a situação nacional perdurar por muitos anos ainda.'

'No caso de derrota do nosso movimento, os reféns deverão ser sumária e imediatamente fuzilados.'

O trecho mais chocante das instruções secretas aos comandantes diz respeito à guarda e ao julgamento dos prisioneiros. Para esta tarefa, a orientação é clara: 'Deverão ser escolhidos companheiros de condições humildes mas, entretanto, de férreas e arraigadas condições de ódio aos poderosos e aos ricos'. Além da prisão, está previsto o julgamento sumário de oponentes ao movimento, onde se incluem autoridades públicas, políticos e personalidades. 'No caso de derrota do nosso movimento, o que é improvável, mas não impossível (...) e esta é uma informação para uso somente de alguns companheiros de absoluta e máxima confiança, os reféns deverão ser sumária e imediatamente fuzilados, a fim de que não denunciem seus aprisionadores e não lutem, posteriormente, para sua condenação e destruição.'

Para o professor Jorge Ferreira, entre 1961 e 1964 houve uma profunda mudança nos interesses que alimentavam a correlação de forças entre militares, partidos políticos e sociedade. 'Em agosto de 1961', diz ele, 'quando Jânio Quadros renuncia, os militares deram um golpe que foi rechaçado pelo Congresso, pelos partidos e pelas entidades civis. Os grupos progressistas e legalistas venceram. A sociedade brasileira não queria romper com o processo democrático.' O período parlamentarista manteve o equilíbrio, ainda que precário, entre essas correntes. Jango sabia que precisava de maioria no Congresso ou não governaria, mas o plebiscito que lhe devolveu o presidencialismo acabou dando outro rumo aos acontecimentos, como afirma Ferreira: 'a Frente de Mobilização Popular, encabeçada por Brizola, havia unificado praticamente todas as esquerdas, englobando o Comando Geral dos Trabalhadores, Ligas Camponesas, UNE, Ação Popular, a esquerda do Partido Socialista Brasileiro, a esquerda mais radical do PCB, os movimentos de sargentos e marinheiros. E a exigência dessas esquerdas era o rompimento com o PSD (Partido Social Democrático), a convocação de Assembléia Nacional Constituinte e o questionamento das instituições liberais vigentes. É quando se estabelece o confronto.' Desta vez, o estado de direito não venceu.

Texto também disponível em 


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Notícias de Jornal Velho: O discurso de Leonel Brizola em 1 de abril de 1964

28 de setembro de 2006

por Carlos I. S. Azambuja (*) em 25 de março de 2004

Resumo: A reação de Leonel Brizola - um dos principais incentivadores da conspiração comunista então em andamento no Brasil - diante da intervenção militar que barrou seus planos de poder.

© 2004 MidiaSemMascara.org

Em 1º de abril de 1964, Leonel Brizola pronunciou – aliás, gritou – o seguinte discurso, desde o Palácio Piratini, em Porto Alegre, para o país inteiro, pelos microfones da Rádio Guaíba, que ainda estavam em rede com a Agência Nacional: (foto: Brizola, à esquerda, junto com o General Ladário Pereira e João Goulart)

“Atenção, sargentos do III Exército! Dessas Unidades que me ouvem neste momento” Atenção, sargentos das Unidades chefiadas por esses militares golpistas! Atenção, oficiais nacionalistas dessas Unidades! Atenção Sargentos!

O povo, do qual sois uma parte inseparável, vos pede neste instante. Pedem a todos vós neste momento! Pede aos sargentos que se levantem, tomem os quartéis e prendam os gorilas! (gritos e aplausos).
Atenção, sargentos do Exército brasileiro, das Unidades que traíram a confiança do ínclito general... do ínclito general Ladário Pereira Teles. Peço-vos... ou nós vos pedimos, nós do povo, do qual sois uma parte inseparável, mesmo que nos tenham negado a posse das armas... Tomem a iniciativa... à unha mesmo (gritaria), com o que tiverem na mão. Tomem as armas desses gorilas. Tomem conta dos quartéis e prendam os traidores (gritaria).

Eu quero comunicar a esta multidão, a Porto Alegre, ao Rio Grande e ao Brasil que a 3ª Divisão de Cavalaria Blindada pôs suas Unidades sediadas (ininteligível) (gritos de já ganhou, já ganhou).

Atenção, sargentos de Uruguaiana! Atenção, sargentos de Bagé! Atenção, sargentos da 3ª DI de Santa Maria! O povo gaúcho confia na vossa bravura, no vosso heroísmo e no vosso amor à causa do povo brasileiro (gritaria). Chegou a vossa hora. Aliem-se. Procurem os oficiais nacionalistas! Tomem conta dos quartéis e prendam os oficiais gorilas e golpistas! (gritaria).

Agora vai chegar a vez dos golpistas e gorilas! Das fronteiras do Rio Grande para cima. Aqueles que traíram em Santa Catarina e Paraná, em São Paulo, em Minas Gerais e em outros pontos do território nacional. Atenção, sargentos do Brasil! Atenção, oficiais nacionalistas do Exército, da Marinha e da Aeronáutica e das Forças Públicas estaduais. Tomem nesta noite as necessárias iniciativas! Hoje à noite! Amanhã, no momento oportuno, ocupem os quartéis e prendam esses golpistas que querem garrotear os nossos direitos e as nossas liberdades!” (gritaria).


(*) Carlos I. S. Azambuja é historiador.



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A música que os gaúchos cantaram para se despedir de Brizola 



Querência Amada

(Teixeirinha)



Quem quiser saber quem sou

olha para o céu azul

E grita junto comigo

viva o Rio Grande do Sul

O lenço me identifica

qual a minha procedência

Da província de São Pedro

padroeiro da querência



Ó meu Rio Grande

de encantos mil

disposto a tudo

pelo brasil

Querência amada

dos parreirais

da uva vem o vinho

Do povo vem o carinho

bondade nunca é demais



Berço de Flores da Cunha

e de Borges de Medeiros

Terra de Getúlio Vargas

presidente brasileiro

Eu sou da mesma vertente

que Deus saúde me mande

E que eu possa ver muitos anos

o céu azul do Rio Grande



Te quero tanto

torrão gaúcho

morrer por ti

me dou o luxo

Querência amada

planícies e serras

Os braços que me puxa

da linda mulher gaúcha

Beleza da minha terra



Meu coração é pequeno

porque Deus me fez assim

O Rio Grande é bem maior

mas cabe dentro de mim

Sou da geração mais nova

poeta bem macho e guapo

Nas minhas veias escorrem

o sangue herói dos farrapos



Deus é gaúcho

de espora e mango

foi maragato

ou foi chimango

Querência amada

meu céu de anil

este Rio Grande gigante

Mais uma estrela brilhante

na bandeira do Brasil




XXXXXXXXXXXXXX


  • Usina de Letras -- Contato do Leitor‏

15/08/2011
andregbrizola@hotmail.com
Para ttacitus@hotmail.com
De:andregbrizola@hotmail.com 
Enviada:segunda-feira, 15 de agosto de 2011 21:06:26
Para:ttacitus@hotmail.com

Mensagem referente ao texto Internet revela novos escritores - Ensaios.

Mail enviado para: Félix Maier

Enviado Por: Andre Brizola - andregbrizola@hotmail.com
Da cidade : Carazinho

Jamais poderiam escrever tamanhas blásfemias sobre Brizola, de onde foi tirado tamanhas mentiras. Olhem a quantidade de obras que Brizola fez para o seu povo. Já o exército, além de matar milhões de inocentes ainda deixou uma divída enorme aos cofres púlicos. Também não há o que discutir, quem decidiu pelo presidencialismo foi o povo. Então pessoas como Felix Maier são uns derrotados que não tem respaldo nenhum, e ficam tentando criar um bicho Papão de uma pessoa que tanto fez por esse Brasil

 

Caro André,

Você deve estar se referindo a meu texto Brizola, o último dos maragatos. Nesse texto não existe nada inventado, apenas o currículo de Brizola:

- que foi o criador do G-11 (que, se tivesse êxito, seria um grupo de extermínio);

- que acabou com a cidade do Rio de Janeiro nos dois mandatos de governador, com a multiplicação de favelas, onde a polícia foi proibida de subir o morro para prender traficante;

- que não passou de um político populista e embusteiro.

Aliás, Brizola foi chamado por Fidel Castro de el ratón, por não explicar o sumiço de 200 mil dólares enviados a ele pelo Abutre do Caribe, no Uruguai, via pombo-correio Betinho, o santo de pau oco. A única obra de relevo foi o sambódromo na Sapucaí, no Rio, evitando o monta-desmonta de arquibancadas todo ano, com custo altíssimo. O projeto das escolas de tempo integral também foi bom - pena que só no papel, pois os "brizolões" foram obras faraônicas plantadas em locais estratégicos, para turista ver, especialmente os gringos.

O Exército não matou milhões de pessoas. Apenas defendeu o País contra grupos criminosos, que se intitulam "militantes políticos" mas que não passam de terroristas, assassinos, que queriam implantar aqui uma ditadura cubana. Os militares deixaram dívidas, sim, mas fizeram obras excepcionais de infraestrutura, que levou o Brasil, da 48ª para a 8ª economia mundial. Que obras foram essas? A TV colorida PAL-M, a Embratel, o sistema Telebrás, a Portobrás, as usinas de Itaipu, Tucuruí, Sobradinho e tantas outras, o Banco Central, os primeiros metrôs, a ponte Rio-Niterói etc. As dívidas de FHC e Lula foram muito superiores às dos militares, e o que estes fizeram de excepcional, além de doar um Paraná inteiro ao messetê e conceder bolsas-famílias a quem não precisa, mas que se revelou esperto sistema de voto de cabresto para o petismo? Você por acaso sabe qual a dívida atual do Brasil, tanto a externa (que Lula disse que tinha pago) e a interna?

Deixa de ser embusteiro, André Brizola. Não há como você brigar contra os fatos. O currículo de Brizola está aí abaixo. Não há chororô que modifique isso!

Att,

F. Maier

G-11- Grupo dos Onze, ou Grupo dos Onze Companheiros: “comandos nacionalistas”, que foram formados em todo o Brasil em 1963, a mando do ex-governador gaúcho Leonel Brizola. Os G-11 seriam o embrião do Exército Popular de Libertação (EPL). Um documento do Grupo afirmava que os G-11 seriam a “vanguarda do movimento revolucionário, a exemplo da Guarda Vermelha da Revolução Socialista de 1917 na União Soviética”. (Prova a ignorância de Brizola, pois em 1917 havia apenas a Rússia, não a URSS.) Quando ocorreu a Contrarrevolução de 1964, havia centenas desses Grupos espalhados em todo o País e tinham como missão eliminar fisicamente todas as autoridades do Brasil – civis, militares e eclesiásticas, como se pode ler nas “Instruções secretas” do EPL e seus G-11, no item 8, “A guarda e o julgamento de prisioneiros”: “Esta é uma informação para uso somente de alguns companheiros de absoluta e máxima confiança, os reféns deverão ser sumária e imediatamente fuzilados, a fim de que não denunciem seus aprisionadores e não lutem, posteriormente, para sua condenação e destruição” (AUGUSTO, 2001: 112). Sobre os G-11, leia os documentos secretos em  http://cbn.globoradio.globo.com/hotsites/grupo-dos-onze/GRUPO-DOS-ONZE.htm. [link indisponível]

AUGUSTO, Agnaldo Del Nero. A Grande Mentira. Biblioteca do Exército Editora, Rio de Janeiro, 2001.


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Antecedentes do Movimento de 64: João Goulart e o aumento da instabilidade no Brasil (1961-1964) - por AMANhttps://bdex.eb.mil.br/jspui/bitstream/123456789/4312/1/TCC%20-%20Felbinger%20revisado%202.pdf

Leonel Brizola e a Rede de Esclarecimento (1963-1964) - por Diego Martins Dória Paulo 

Brizola, o último dos maragatos - por Félix Maier 




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