MEMORIAL 31 DE MARÇO DE 1964

MEMORIAL 31 DE MARÇO DE 1964
Avião que passou no dia 31 de março de 2014 pela orla carioca, com a seguinte mensagem: "PARABÉNS MILITARES: 31/MARÇO/64. GRAÇAS A VOCÊS, O BRASIL NÃO É CUBA." Clique na imagem para abrir MEMORIAL 31 DE MARÇO DE 1964.

segunda-feira, 27 de outubro de 2025

Machado e Eça se encontram no Purgatório - Por Félix Maier

 


Machado e Eça SE ENCONTRAM no Purgatório

Um conto fantástico em que os mortos ainda se engalfinham em  glória, gramática, estilo e... censura.

 Félix Maier

Era uma tarde sem tarde — pois no Purgatório o tempo é uma invenção obsoleta, um relógio parado entre o céu e o inferno. O ar tinha cor de papel envelhecido e cheirava a tinta de tipografia. Por entre nuvens pardacentas, espíritos caminhavam de um lado para outro, arrastando pecados leves o bastante para não merecer o fogo, mas pesados demais para a ascensão.

E foi nessa atmosfera de papel e pecado que dois vultos se cruzaram numa tarde sem tarde, pois o tempo, ali, é uma abstração que perdeu a pontualidade.

Um deles caminhava devagar, apoiando-se num bastão feito de ironia. Tinha a pele morena, pince-nez ajustado com precisão de relojoeiro, e um sorriso discreto, desses que não riem do mundo, apenas o decifram. Era Machado de Assis, o Bruxo do Cosme Velho, que chegara ao Purgatório sem alarde, pedindo licença até para a eternidade vestindo um cerimonioso fraque translúcido.

O outro vinha de passo largo, terno preto etéreo com lenço de gola alta, bigode impecável e porte de diplomata atrasado para um baile solene. Trazia no ar o perfume distante das livrarias de Paris e no olhar a altivez dos que se creem injustiçados até por Deus e o Diabo. Era Eça de Queiroz, o português que acreditava que cada vírgula tinha alma e cada pecado, estilo.

Tropeçaram um no outro, um tropeço metafísico, como se o destino, cansado das suas intrigas terrenas, resolvesse brincar de roteirista purgacional.

Machado recuou um passo, ajeitou o fraque da alma e, com aquele tom que transforma qualquer desculpa em sentença, murmurou:

— Creio que o cavalheiro me interceptou o passo.

Eça arqueou o sobrolho e respondeu, com ligeiro sotaque de Lisboa e orgulho de quem nunca perde a nuance:

— Interceptar? Meu caro, quem tropeça em mim costuma pedir desculpas em francês.

Machado sorriu com um movimento quase imperceptível dos lábios, como quem anota uma ironia mental para uso futuro.

— Francês… até aqui o senhor o invoca. Há de haver cafés parisienses no além, imagino, com madames de névoa e pecados de veludo.

Eça abanou a mão, teatral:

— E o senhor, que nunca saiu da Rua do Ouvidor, fala como se o paraíso fosse um bonde do Rio de Janeiro.

O silêncio que se seguiu era civilizado. No Purgatório, até os insultos exigem boa sintaxe.

Começaram a caminhar lado a lado, ou quase, pois entre eles havia uma distância invisível, medida em séculos de vaidade e crítica literária.

A névoa ao redor cheirava a papel amarelado e tinta de pena. Era o perfume dos escribas da posteridade.

Machado, olhando em volta, comentou:

— Curioso, senhor Queiroz. O Purgatório assemelha-se um pouco à Academia. Há cadeiras, vaidades e votos secretos.

Eça respondeu, sem resistir à provocação:

— E, como na Academia, poucos sobem.

Machado riu com os olhos, que eram sua parte mais viva.

— Ao menos aqui não se discute ortografia.

— Discutir, não. Mas vi ali ao fundo uma alma a conjugar o verbo ascender com cê, e foi mandada de volta ao limbo por erro grave — retrucou Eça.

Caminharam. De vez em quando, passava uma alma apressada, algum poeta arrependido, tentando trocar o Purgatório por uma antologia.

No alto, anjos-porteiros cochichavam, anotando quem falava mal de quem, pois até na eternidade há jornais de fofoca metafísica.

Eça, sempre ansioso por justificar-se, retomou o fio das mágoas antigas:

— Ainda guardo lembrança amarga das críticas, senhor de Assis. Sob pseudônimo, o senhor me esfolou vivo em O Primo Basílio. E disse que O Sr. Eça de Queiroz parece escrever com um bisturi na mão... O Sr. Eça é o Zola das senhoras portuguesas...

Machado pigarreou com elegância, ajeitando o pince-nez.

— Ah, sim… Eleazar. Era um exercício de estilo. A crítica, caro Eça, é um modo educado de praticar a caridade.

— Caridade? — Eça arregalou os olhos. — Chamou minha Luísa de tola, meu Basílio de leviano e meu realismo de vulgar!

— Limitei-me a observar — retrucou Machado — que a empregada Juliana tinha mais alma que a patroa. O senhor quis retratar o adultério e acabou traindo a psicologia.

Eça respirou fundo, dividido entre ofensa e admiração. A vaidade ferida é um espelho que se quebra refletindo o próprio rosto.

— O senhor fala como padre, mas escreve como coveiro. Metade dos seus personagens já nasce morta.

— É uma economia de enredo — disse Machado, com doçura. — O defunto autor é mais confiável do que o narrador vivo.

Eça riu, sacudindo a poeira do orgulho.

— Reconheço, há gênio no seu sarcasmo. Mas confesse: o senhor sempre invejou o meu pecado.

— Pecado? — perguntou Machado, arqueando uma sobrancelha. — No Brasil, o calor já basta.

Foram andando. O chão, feito de páginas translúcidas, parecia murmurar citações antigas. De vez em quando, uma folha solta passava flutuando, trazendo trechos de romances esquecidos. Ao longe, um coral de almas declamava versos franceses. Machado suspirou.

— Nem o senhor, com todo o seu Paris, subiu.

— Nem o senhor, com todo o seu moralismo, desceu — respondeu Eça. Talvez Deus esteja indeciso sobre o valor do estilo.

Riram. No Purgatório, o riso é moeda de purificação. Mas o silêncio seguinte não era inocente. Eça, com aquela elegância provocadora dos duelistas do Chiado, lançou:

— Diga-me, senhor Machado, não é curioso o senhor também ter vindo parar aqui? Ou seria castigo por... pequenas apropriações intelectuais?

Machado ajeitou o colarinho invisível, como quem ajusta a própria ironia.

— O senhor fala de plágio?

Eça ergueu as sobrancelhas.

— Não eu. Apenas cito fontes. Há quem diga que suas nuvens caídas vêm de Alphonse Karr, suas batatas de Ernest Renan, seu verme de Baudelaire e seu emplastro de um tal Sterne.

Machado parou, olhou para o vazio e sorriu.

— Ah, sim. Chamemos de cosmopolitismo literário. Afinal, se os franceses me influenciaram, influenciaram o senhor duas vezes.

Eça gargalhou alto, um riso de vinho e pecado.

— Ainda assim, o meu plágio cheira a Bordeaux, não a mate amargo.

Machado inclinou o chapéu inexistente.

— Pois que brindemos às influências mútuas. O senhor, herdeiro do naturalismo; eu, discípulo da ironia. E ambos, reféns da crítica.

Nesse momento, uma brisa correu, e as nuvens formaram uma espécie de cortina. Dela saiu uma figura miúda, de terno escuro, olhar fiscal e prancheta flamejante.

— Agrippino Grieco! — exclamaram em uníssono, surpresos e resignados.

O crítico literário sorriu com a satisfação de quem reencontra velhos réus.

— Senhores — disse ele —, a eternidade exige revisão. Tenho aqui os autos dos vossos pecados literários.

Eça revirou os olhos:

— Nem morto me livro da crítica.

Machado, tranquilo:

— Deixe-o falar, caro Eça. A verdade, às vezes, melhora com o tempo.

Grieco abriu a prancheta. O som do papel soou como sentença. O Purgatório, que até então sussurrava como uma biblioteca de convento, calou-se por completo. Nem o folhear das almas se ouvia. Agrippino Grieco — crítico emérito e fiscal da posteridade — abrira sua prancheta flamejante.

Os papéis, em vez de linhas, traziam pequenas chamas que ardiam em silêncio, como notas de rodapé em fogo lento.

— Muito bem, senhores — começou, com voz que soava entre o tom de júri e o de colunista. — Eis-me aqui, incumbido de revisar vossas obras e vossos pecados. Afinal, a eternidade, como a boa literatura, não admite rasuras.

Eça endireitou-se, ajeitando o bigode incorpóreo. Machado apenas arqueou a sobrancelha — esse leve gesto que, no Céu ou na Terra, valia por um capítulo. Agrippino prosseguiu:

— Primeiro réu: Machado de Assis. Acusado de citações não creditadas, apropriações cosmopolitas e filosofias reaproveitadas. Item um: Melhor cair das nuvens do que de um quinto andar — procedência, Alphonse Karr. Item dois: Ao vencedor, as batatas — fonte, Ernest Renan. Item três: Ao verme que primeiro roeu as frias carnes do meu cadáver dedico como saudosa lembrança estas Memórias Póstumas — Baudelaire, naturalmente. Item quatro: O emplastro Brás Cubas — ah, caro senhor, puro Sterne!

Machado manteve a calma dos culpados que filosofam.

— Meu caro Agrippino, plagiar é dar segunda vida às ideias. A originalidade é o disfarce mais refinado do talento.

— Disfarce ou travestimento? — atalhou Grieco, anotando algo em sua prancheta que faiscou.

— Travestimento é o que o senhor chama de crítica — devolveu Machado. — Um gênero que se veste de erudição e esconde o prazer de punir.

Um murmúrio percorreu as nuvens: os anjos-bibliotecários cochichavam, fascinados. Agrippino fingiu não ouvir.

— Eça de Queiroz, passo ao senhor. — E folheou outro papel ardente. — O senhor é acusado de ter plagiado Zola, adulterado o pudor e cometido pecados de descrição excessiva.

— Descrição excessiva?! — indignou-se Eça. — Eu apenas pintei o real com as cores que ele exige. Se há excesso, é do mundo, não meu.

— Descrição em minúcias da carne não é arte, é fisiologia — disse Machado.

— Zola, Balzac, Flaubert... o senhor bebeu em todas as garrafas francesas — disse Grieco.

Eça inclinou-se, com altivez.

— Ao menos as garrafas eram boas. E o senhor, Machado, confessará que me leu com atenção, pois quem me critica tanto, me admira em dobro.

Machado sorriu.

— Confesso, li-o com o prazer que se tem ao observar um incêndio da sacada: belo, mas perigoso.

Grieco interrompeu:

— Senhores! Aqui não se trata de duelo literário, mas de ajuste de contas com a posteridade.

Eça cruzou os braços etéreos:

— A posteridade, caro Agrippino, é apenas a crítica que Deus faz aos mortos.

Machado assentiu, filosófico:

— E, pelo visto, ainda não fomos absolvidos, para subir. Nem condenados, para descer.

Enquanto o debate se acirrava, as nuvens se juntaram em semicírculo, formando um anfiteatro brumoso. Sentados nas bordas vaporosas estavam figuras ilustres: Camões, que não sabia se declamava ou julgava; Garrett, que penteava o vento; Padre Antônio Vieira, que tentava converter os suspiros em sentenças; e Baudelaire, claro, fumando um cigarro de névoa, curioso para ver o destino de suas influências tropicais.

Camões foi o primeiro a falar, com a solenidade de quem atravessou mares e séculos:

— Senhores, as musas são irmãs. Não há roubo entre família.

Baudelaire, porém, sorriu de modo venenoso:

— Eu, por mim, aceito o plágio como homenagem. Desde que o homenageado receba os direitos autorais da eternidade.

Machado inclinou-se, respeitoso:

— Tenho pagado em glória tardia, caro Charles. E, se o senhor me inspirou, ao menos o fiz vestir fraque brasileiro.

— E eu — replicou Eça, sarcástico — o vesti de casaca portuguesa. Somos ambos alfaiates da linguagem.

Grieco pigarreou.

— Alfaiates, sim, mas a costura é suspeita. Há remendos visíveis, senhores.

Machado respondeu:

— Todo estilo é um remendo que o tempo chama de assinatura.

O murmúrio das nuvens transformou-se em aplauso.

Permitam-me, caro leitor, uma breve interferência — pois quem vos fala, como todo narrador, não é neutro, apenas disfarçado. Machado e Eça, naquele instante, não discutiam a autoria das frases, mas o direito de serem eternos à sua própria maneira. O Purgatório, esse salão nebuloso, não passa de um congresso literário sem encerramento, onde cada alma quer a última palavra e nenhuma deseja ouvir a alheia. E eu, observador das brumas, vi que o julgamento de Agrippino não buscava justiça — buscava estilo. Eça queria a elegância da forma; Machado, a elegância do pensamento; Agrippino, a elegância da censura.

De repente, Grieco retirou da pasta um pergaminho e o ergueu como um troféu. Era o original de Memórias Póstumas de Brás Cubas, com anotações à margem em francês. As letras cintilavam, revelando o diálogo secreto dos autores mortos.

— Eis aqui — disse o crítico, triunfante — a prova de que Machado lia Sterne com entusiasmo quase eclesiástico.

Machado olhou o pergaminho, sereno.

— Li-o, sim. E aprendi com ele que a morte é o narrador mais honesto.

Eça comentou, em voz baixa:

— E o mais rentável.

Grieco continuou sua sanha acusatória, exibindo agora um exemplar de O Primo Basílio com dedicatória a Balzac.

— E o senhor, Eça, não fica atrás. Sua Lisboa cheira a Paris, seu adultério fala francês, e seu moralismo tem sotaque de salão.

Eça abriu os braços:

— Ah, mas foi o pecado que me deu tema, e o tema, estilo. Escrevi o que todos fazem, mas fingem ignorar.

Machado, com um sorriso enviesado, completou:

— Eu escrevi o que todos ignoram, mas fingem compreender.

Grieco suspirou, vencido pela dialética.

— Pois bem — disse ele —, declaro-vos igualmente culpados de genialidade reincidente.

O coro de sombras aplaudiu. Baudelaire, com fumaça azulada, murmurou:

— Ah, se todo plágio fosse assim...

Camões ergueu a espada, feita de neblina e lembrança:

— Pela pena e pelo verbo, absolvidos sejam!

Mas Agrippino, que não cedia facilmente, fechou o relatório com ar de tabelião da eternidade:

— A sentença não é tão simples. Permanecerão ambos no Purgatório até redigirem juntos um tratado intitulado Do Plágio como Forma Superior de Admiração.

Eça fez cara de horror.

— Escrever com este homem?

Machado respondeu com um meio-sorriso filosófico:

— Um prazer infernal, caro Eça.

E assim terminou a sessão.

As almas dispersaram-se como leitores após o prefácio. Eça e Machado permaneceram sentados sobre uma nuvem de leve densidade crítica. Entre eles, Agrippino já desaparecera, deixando no ar um leve cheiro de tinta e burocracia.

Machado quebrou o silêncio:

— Sabe, Queiroz, talvez a eternidade seja apenas uma segunda edição, revista e aumentada.

Eça respondeu:

— Desde que o prefácio não seja seu.

Machado riu.

— Nesse caso, escrevamos em parceria.

Eça levantou-se, resignado:

— Pois bem. Comecemos o tratado. E se a eternidade tem revisores, que ao menos sejam imparciais.

Sobre a mesa pairavam folhas de papel celestial — luminosas, como se escritas por dentro. Era o material concedido por Agrippino Grieco para que redigissem o tratado Do Plágio como Forma Superior de Admiração.

Eça começou o preâmbulo, empunhando a pena espectral:

— “Nós, abaixo-assinados, Machado de Assis e José Maria Eça de Queiroz, reconhecemos que toda obra é filha ilegítima de outra, e que a originalidade é uma forma elegante de esquecimento.”

Machado assentiu, sorrindo:

— Belo começo. Faltam apenas as entrelinhas, que é onde reside a ironia.

— Ironia? — respondeu Eça. — Prefiro o sarcasmo, é mais civilizado.

— O sarcasmo é francês; a ironia, universal — retrucou Machado.

Ambos se entreolharam, compreendendo que o tratado seria mais difícil do que a confissão de um santo. Machado suspirou, olhando o papel que não se deixava concluir.

— Escrever, aqui, é como tentar acender fósforos molhados.

— Natural — ouviu-se a voz de Grieco, retornando num halo vaporoso para atormentar os ilustres escribas. — O Purgatório é a tipografia do eterno inacabado.

— Então somos linotipistas da posteridade — gracejou Eça.

— Não, senhores. — A voz de Agrippino tornou-se grave. — São personagens do próprio estilo. O castigo de todo grande escritor é viver preso àquilo que escreveu.

Machado ergueu as sobrancelhas:

— Nesse caso, estou condenado a ironizar até o fim dos tempos.

— E eu — disse Eça — a descrever salões que não existem.

— Pois que descrevam o que sempre escreveram — replicou Agrippino, antes de desaparecer numa centelha de crítica.

Decididos a terminar o tratado, os dois mestres resolveram visitar o Salão das Ideias Perdidas, onde pairavam todas as frases que nunca chegaram a ser escritas. Era um lugar impressionante: flutuavam ali inícios de romances, metáforas abortadas, parágrafos esquecidos e até o esboço de um soneto de Camões sobre mosquitos.

Eça observou, fascinado:

— Eis aqui a biblioteca da humanidade inconclusa.

Machado tocou numa frase suspensa no ar, Se Deus fosse crítico literário… — e murmurou: — Essa é perigosa. Pode transformar-se em realidade.

Do fundo do salão, uma voz ecoou, grave e mansa:

— Transformou-se em realidade, meus filhos.

Era uma voz sem corpo, mas com muita autoridade. As ideias se afastaram respeitosamente.

— Quem fala? — perguntou Eça, empalidecendo até quase sumir.

— O Autor — respondeu a voz. — Chamam-me de Deus, mas prefiro o título de Crítico Universal.

Machado inclinou-se.

— Então é verdade que o mundo é apenas um manuscrito divino?

— Um rascunho, Machado. Ainda em revisão.

Eça, entre o espanto e a ironia, perguntou:

— E nós, o que somos?

— Margens comentadas.

Houve um silêncio sublime, interrompido apenas pelo farfalhar das nuvens. Machado, em sua calma olímpica, ousou dizer:

— Senhor, se somos notas de rodapé, ao menos que sejamos legíveis.

Eça completou:

— Ou elegantes.

A voz sorriu — e um raio de luz atravessou o salão.

De volta ao Café das Sombras Leves, escreveram juntos, pela primeira vez sem disputa: Toda criação é uma herança. Todo gênio, um tradutor. Plagiar é participar da corrente secreta das vozes que não cessam. Aquele que escreve sozinho mente; aquele que copia, dialoga.
Por isso, o plágio é a mais pura forma de admiração.

Assinaram juntos, Machado com pena de corvo, Eça, com pena de pavão: Machado de Queiroz – Eça de Assis (Revisado por Laurence Sterne e Émile Zola).

Quando finalizaram o tratado, Agrippino Grieco reapareceu, surpreendentemente com um leve sorriso.

— Está aprovado — disse ele. — Mas, aviso: a eternidade o transformará em apócrifo.

Machado inclinou-se, satisfeito:

— Todo texto que sobrevive ao autor é apócrifo.

Eça levantou o copo:

— Às cópias que nos superam!

Brindaram com vinho purgacional em copos feitos de névoa.

No alto do Purgatório, as nuvens se abriram. Camões com um tapa-olho novo, tecido pelas Parcas, Zola com seu diáfano béret, Vieira com batina negra purgacional e colarinho clerical branco, Baudelaire no terno escuro com laço de veludo e até o clérigo espirituoso com peruca branca Sterne acenavam, como num sarau de luz. O Café dissolveu-se em claridade, e o som das risadas se confundiu com o canto dos anjos revisores.

E o narrador, este modesto cronista das almas, encerrou o relato, dizendo ao leitor que o Purgatório, no fundo, não é um castigo. É apenas a sala de espera entre a leitura e a reescrita.

E lá ficaram Eça e Machado, entre o riso e o verbo, escrevendo sem fim o que já estava escrito, comentando o que nunca será dito, pois na eternidade, como na literatura, ao vencedor, as batatas.

Só não se sabia ainda se as batatas viriam cozidas no fogo eterno ou servidas à moda do paraíso — o Crítico Universal não entrega spoilers.  


                                      ***                                                        

Obs.:

Machado de Assis, sob o pseudônio Eleazar, escreveu na revista Cruzeiro ácidas críticas contra o livro O Primo Basílio, de Eça de Queiroz. O crítico literário Agrippino Grieco, no livro Machado de Assis (Conquista, Rio de Janeiro, 2a. edição, revista, 1960), revolveu todos os escritos de Machado, identificando muitas frases famosas que seriam plágio de autores franceses e ingleses não menos famosos.

Assim, resolvi colocar esse trio  e outros gigantes da literatura  no Purgatório, para que continuem se enfalfinhando em glória, gramática, estilo e... censura.

Félix Maier



quarta-feira, 22 de outubro de 2025

Pé na Cova planeja uma boa morte - Por Félix Maier

 

Pé na Cova planeja uma boa morte

Félix Maier

Pé na Cova acordou mais cedo do que de costume naquela terça-feira. O relógio marcava 5h27, e o galo do vizinho, um animal de vocação suicida, ainda nem tinha se animado a cantar. Sentou-se na beira da cama, estalando os joelhos como quem abre uma gaveta velha, e suspirou com aquele ar de quem está revendo o filme da própria vida — mas um filme de baixo orçamento, com som ruim e sem final feliz.

— Tá chegando a hora, Pé na Cova… — murmurou para si mesmo, enquanto calçava as pantufas. — E olha que nem vai ter reprise.

A morte, em si, não o incomodava. Tinha feito as pazes com a ideia fazia tempo. A questão era outra: e se, no dia do velório, ninguém aparecesse? Nem pra garantir uma foto decente pro Facebook do cemitério?

Esse pensamento o vinha atormentando havia semanas, desde o enterro do amigo Aparício — um sujeito alegre, língua solta, que falava palavrão como quem recita poesia. Aparício fora um daqueles que acreditava firmemente que "quem morre descansa", mas ninguém o avisou que o descanso incluía velório sem plateia.

Naquela tarde fatídica, Pé na Cova chegou à capela mortuária e contou, com a precisão de um auditor da Receita Federal: dez pessoas. Dez! Incluindo o coveiro e o motorista do carro funerário, que estavam ali por força do ofício.

Nenhuma coroa de flores enfeitava o ambiente. A parede ao lado do caixão estava nua, deprimente, como um salão de festa abandonado depois do baile. Pé na Cova, num impulso piedoso e um tanto culpado, saiu correndo até a floricultura da esquina e comprou, do próprio bolso, uma coroa com fita dourada. Pediu que escrevessem: “Do amigo que ainda respira — com respeito e um pouco de ciúme.”

O florista olhou torto, mas escreveu.

Desde então, Pé na Cova vinha matutando. E se com ele acontecesse o mesmo? Morreu, e pronto: meia dúzia de curiosos, dois parentes distraídos, e talvez um cachorro vagando pela capela.

— Ninguém quer morrer anônimo — disse a si mesmo, enquanto preparava o café. — Nem defunto gosta de solidão.

O espelho da cozinha o encarava com franqueza cruel. Rugas novas, olheiras antigas. Olhos de quem já começou o estágio probatório para o além. Ele se olhou e retrucou:

— Pois é, Pé, tua ficha tá quase sendo chamada. E o que é que tu vai deixar pro mundo, hein? Uns boletos, uma coleção de rótulos de cerveja e uma senha de Wi-Fi?

Ele riu, um riso seco, meio soluçado.

Pegou o jornal e foi direto à página dos obituários. Era o seu ritual matinal. Gostava de ver quem “partiu para a glória”, talvez para medir o próprio atraso. Naquele dia, uma nota lhe chamou atenção: “Falecimento de Osmar C. da Luz, 68 anos. Deixou mulher, três filhos, seis netos e 78 seguidores no Twitter.”

Pé na Cova ficou boquiaberto.

— Setenta e oito seguidores? Só isso? Coitado. Morreu cancelado, o homem.

Achou triste morrer com menos de cem seguidores. A morte moderna, pensou ele, não é mais uma questão de alma, e sim de engajamento. Já imaginava o padre dizendo na missa de corpo presente: “Aqui jaz um influencer de pouca importância.”

Esse pensamento o acompanhou o dia inteiro. Decidiu, então, que precisava fazer algo. Talvez criar um perfil novo, postar frases motivacionais do tipo ‘A vida é curta, mas o velório pode ser longo’, só para garantir uns seguidores póstumos.

Mais tarde, sentado na varanda, começou a conversar de novo com seu interlocutor preferido — ele mesmo.

— Pé, meu velho, tu tem medo da morte?

— Medo, não. Só não gosto da ideia de morrer impopular.

— Mas o que é que importa, se tu nem vai estar lá pra ver?

— Importa, sim! Vai que o além tem internet e eu fico vendo tudo pelo Wi-Fi celestial? Imagina: dez pessoas bocejando e uma coroca desafinada cantando “Segura na mão de Deus”.

Olhou para o quintal. O ipê florido parecia zombar dele com suas pétalas amarelas, como confete de enterro festivo.

— Quer saber? — resmungou. — Acho que vou planejar meu próprio velório.

E assim começou o projeto “Operação Despedida Digna”. Comprou um caderno novo e escreveu na capa: “Roteiro do Meu Velório — Versão Final (ou quase)”.

Na primeira página, listou os convidados ideais — mesmo sabendo que alguns já tinham ido antes dele. Depois, anotou detalhes logísticos:

  1. Local: Capela 3 do Campo da Saudade (tem ar-condicionado e bom estacionamento).
  2. Flores: Mínimo de quatro coroas — nada de crisântemos baratos.
  3. Música: Preferência por boleros. Nada de “Vencendo vem Jesus”, da Harpa Cristã — é brega demais.
  4. Discurso: Apenas um amigo autorizado a falar — e, de preferência, que chore com moderação.
  5. Café: Forte, sem açúcar, e acompanhado de cuca com farofa em cima.

No rodapé, acrescentou: “Obs.: Proibido celular com flash. O defunto agradece.”

Enquanto escrevia, sentia um certo orgulho. Afinal, planejar o próprio velório é o auge da autonomia. Quem disse que a morte não pode ser personalizada?

Foi então que lhe ocorreu o detalhe derradeiro: a sepultura. Afinal, de nada adiantaria uma despedida organizada se o pós-evento ficasse pendente. No dia seguinte, marchou até o cemitério municipal e procurou o administrador, um homem de terno puído e voz fúnebre. Pediu uma sepultura simples, mas definitiva — nada de jazigos coletivos ou promoções “leve dois, pague um”. Escolheu um lote ensolarado, com vista para o portão (sempre gostou de observar o movimento).

Mandou gravar a lápide com seu nome, a data de nascimento e, por óbvio, deixou a data final em branco, com um discreto espaço entre os traços.

— É só preencher depois — explicou ao funcionário. — Evita trabalho pro pessoal.

O homem concordou, com a solenidade de quem assina um testamento.

Na semana seguinte, Pé na Cova foi conferir a obra pronta. Achou o granito bonito, bem polido, digno de um homem que sempre pagou suas contas. Passou a mão sobre o espaço vazio e comentou consigo mesmo:

— Agora só falta o detalhe mais caro: o corpo.

Sorriu satisfeito. Afinal, ninguém iria gastar um tostão com ele. Era viúvo há vinte anos, os filhos moravam longe e os sobrinhos só apareciam quando o décimo terceiro caía. Fez as contas e concluiu que, no fundo, morrer sairia mais barato do que continuar vivendo.

À noite, sonhou com Aparício. O amigo aparecia radiante, de terno branco e sorriso debochado. Disse-lhe:

— Tu te preocupa demais, Pé. Aqui em cima ninguém liga pra número de seguidor. O que vale é quem te trouxe café quando tu tava vivo.

Pé na Cova acordou suando. Sentiu um misto de alívio e irritação.

— Fala isso porque teu velório foi vazio, Aparício. Fácil filosofar depois que já tá no além.

No dia seguinte, levantou decidido. Resolveu visitar a floricultura onde havia comprado a coroa do amigo. Pediu ao rapaz do balcão uma coroa nova.

— Pra quem é? — perguntou o vendedor.

— Pra mim mesmo. Quero deixar paga. Assim evito constrangimentos.

O rapaz arregalou os olhos.

— O senhor tá doente?

— Só de realismo, meu filho.

Saiu da loja satisfeito, levando o recibo dobrado no bolso. Pensou em emoldurá-lo. Era como garantir um ingresso de primeira fila para o próprio espetáculo.

Nos dias seguintes, Pé na Cova passou a caminhar pelo cemitério depois do almoço. Dizia ser “para ir se acostumando com a vizinhança”.

Cumprimentava os mortos como velhos conhecidos:

— E aí, Seu Anacleto, o senhor ainda com a mesma cara de tédio?

Os visitantes o olhavam de soslaio, sem saber se deviam rir ou chamar o padre.

Uma tarde, sentado num banco de pedra, Pé na Cova concluiu:

— A morte, no fundo, é uma questão de relações públicas. Se a gente não se promove em vida, o pós-venda fica fraco.

E riu. Riu alto, tanto que um gato preto fugiu assustado.

Naquele riso havia resignação e certo orgulho. Sabia que estava indo, mas iria organizado. Quem sabe até transmitiriam o velório ao vivo? #DespedidaDoPé poderia ser trend topic por algumas horas.

Voltou para casa mais leve, fez café, ligou o rádio e deixou o noticiário correr. Ao ouvir o locutor anunciar a previsão do tempo — “chuvas isoladas à tarde” — murmurou:

— Bom, pelo menos não vai empoeirar minha sepultura.

Deitou-se para o que poderia ser o último cochilo, sorrindo. Mas a mente já passeava pela capela: roteiro do velório pronto, coroa comprada, sepultura marcada, vinte carpideiras com véus ensaiando cada lágrima, pagas com café e cuca, e o padre abençoando com solenidade. Até os mosquitos iriam compor o cenário.

Antes de adormecer, Pé na Cova sorriu divinamente, imaginando como seria gratificante ver a capela cheia no dia do próprio velório — e, com certeza, saborear cada lágrima, cada olhar curioso e cada copo de cachaça que pagassem para assistir. E, melhor de tudo, um death influencer já pago para garantir um luto premium e uma morte monetizada.

Nada mau, pensou. Nada mau mesmo. Morrer sem público jamais seria opção — seria como contar uma última piada e não ouvir nem um risinho.

Durante a madrugada, Pé na Cova acordou sobressaltado. Havia se esquecido de comprar o caixão. No dia seguinte, escolheu um modelo de luxo, muito lustroso e florido, com detalhes de metal, levou para casa e passou a dormir dentro.

Era para ir se acostumando… e, de quebra, garantir que, quando chegasse a hora, a plateia tivesse algo digno para aplaudir.


segunda-feira, 20 de outubro de 2025

O Sistema Toga Petralha - Por Félix Maier

 

Lula se reúne em jantar com ministros do STF, incluindo ...

O Sistema Toga Petralha

Félix Maier

Coitado, não, feliz Tio Pedro! por não ter vivido o bastante para ser testemunha de um golpe vergonhoso do Supremo Togastão Festivo (STF), aplicado no Paraíso do Vira Bosta. Um STF feito de festas, lagostas, vinhos e orçamento bilionário.

Pinar del Río, em Cuba, havia virado a Disneylândia dos charutos, vendendo Cohiba Esplêndido por 70 dólares a unidade, que o Imperador Dom Barba I, conhecido como Ogro de Nove Dedos, fuma como quem saboreia 18 cm de vitória revolucionária. O STF, aparelhado pelo Ogro com juízes esquerdistas (alguns haviam trabalhado como causídicos para ele e o PT), havia se transformado num Togastão (ou, como dizem alguns escribas, no Sistema Toga Petralha), à frente de um novo país, o Brasilistão, país que não pretende ser uno na multiplicidade cultural de seu povo, mas enjaulado em distintos bantustões, como ocorria no Apartheid de triste memória, na África do Sul.

Um criminoso havia sido condenado por unanimidade em três instâncias, por 9 votos a 0, e depois descondenado em 15 de abril de 2021 por togados petistas indicados ao Togastão por... ele mesmo, o Ogro, para voltar à Presidência do Brasilistão pela terceira vez. Com grande chance de voltar à cena do crime pela quarta vez, em 2026, com a força bruta do Togastão que ninguém ousa contestar.

Se tivesse sobrevivido, por certo Tio Pedro teria dito em 2022:

— Pobre do País que tem que escolher entre o Cavalão e o Ladrão!

        Se vivo fosse, Tio Pedro estaria mancando por ter levado alguns coices reais ou virtuais do Presidente Cavalão — que levou uma facada na barriga durante a campanha presidencial, em 2018, e foi perseguido trinta horas por dia durante seu mandato. Que coices o Cavalão deu? Primeiro, foi sua ignorância frente à pandemia da Covid-19, se portando como um palerma, tripudiando sobre vacinas que transformariam pessoas em jacarés. Ridículo foi também o Cavalão criticar as urnas eletrônicas, que o elegeram para deputado federal por sete vezes e até Presidente da República. Por fim, houve ainda uma folclórica minuta do golpe, existente em pastas de ministros, aspones, grupos de WhatsApp, pendrives, e-mails, agendas e nuvem do Google, além de uma reunião secreta sobre o assunto, que foi filmada e vazada — uma comédia pastelão à moda antiga, sem ensaio nem roteiro, mas com muitas bravatas. E que condenou o Cavalão e sua entourage estrelada à cadeia, por um golpe de Estado que nunca ocorreu — para gáudio de seus inimigos políticos.  

        Se o Cavalão tivesse que ser condenado, deveria ser pelo crime de prevaricação, por não ter tomado providências após o funesto golpe do Togastão, em 15 de abril de 2021, para garantia da lei e da ordem — crime de prevaricação também cometido pelo Presidente do Senado.

Por tudo isso, é certo que Tio Pedro teria ficado muito triste com o Cavalão, poderia até ter votado em branco, mas jamais votaria no Ladrão. Se vivo, com certeza teria também perguntado:

— Será que esses idiotas registraram a minuta do golpe em cartório?

No Brasilistão, o Togastão ostenta com orgulho seu mais refinado invento institucional: o Poder Moderador de Toga. Criado não por assembleia constituinte, nem pelo Congresso Nacional, mas por inspiração dos próprios togados, ele se reserva o direito de interpretar, reinterpretar e, quando necessário, reinventar as leis e a Constituição Federal. Seu lema, bordado em ouro nas cortinas do plenário, é simples e reconfortante: Nós decidimos, vocês acatam. Entre canetadas providenciais e interpretações criativas de uma Constituição cada vez mais elástica, esse poder garante que nenhuma decisão do povo, do parlamento ou do executivo permaneça de pé se não passar pelo crivo sagrado da Suprema Caneta. Afinal, no Brasilistão, a democracia é plena, reconhecida por Cuba, Venezuela, Irã e até a ONU — desde que tudo seja aprovado pelo Togastão.

Muita coisa ainda acaba em samba, funk e pizza no Brasilistão, especialmente nos palácios atapetados de Brasília. Porém, nestes tempos de governança fascista-populista que aparelhou a Suprema Corte, os memes — por enquanto! — são tudo o que restam a um povo perseguido, censurado, bloqueado e desmonetizado nas redes sociais, com contas bancárias bloqueadas, exilado ou até preso — além de aplicação de multas milionárias para deixar os condenados e suas famílias na miséria. O que a dupla Jango-Brizola não conseguiu, o Ogro provou como é fácil subjugar um povo inteiro.

Na atualidade, não importa quem seja eleito Presidente do Brasil, de direita ou de esquerda, porque quem de fato governa é o Sistema Toga Petralha. O deboche do Togastão é tão escancarado e cruel que aplicou multa de R$ 22,9 milhões ao Partido Liberal (PL), por litigância de má fé. O PL, por pura coincidência, é o Partido de Jair Messias Bolsonaro e tem o número... 22. E o Ogro ficou muito feliz ao indicar o comunista Flávio Dino para o Togastão, justo no dia 27 de novembro de 2023, data que lembra a malfadada Intentona Comunista de 1935.

Assim, para o atual sistema fascista matar política, social e financeiramente um adversário no Brasilistão de hoje, não é preciso paredón, como foi em Cuba, nem envenenamento, como ocorre na Rússia de Vladimir Putin, ou matar sob tortura, como ocorre na Venezuela de Nicolás Maduro, mas apenas tirar do páreo o inimigo do povo via Tribunal Eleitoral ou Corte Suprema. Em vez de se ater aos autos, só aos autos, os vaidosos togados são mariposas sempre em busca de holofotes. Com as Forças Armadas domesticadas pelo Sistema Toga Petralha, onde o Togastão põe um olho, tem um culpado para ser massacrado. Uma variante das máximas de Lênin e de Beria, já visto neste livro.

Nesse sentido, o Presidente Jair Messias Bolsonaro, condenado a mais de 27 anos de prisão, foi morto e enterrado no dia 11 de setembro de 2025, pois ninguém mais verá sua imagem ou suas falas na mídia, nem seus posts nas redes sociais. Sem direito a auxílio-reclusão, como ocorre a bandidos de estimação deste atual sistema fascistoide em expansão.

Tarcísio Gomes de Freitas, Ronaldo Caiado, Ratinho Júnior, Romeu Zema, Jorginho Mello, Cláudio Castro, Ricardo Nunes, Michelle Bolsonaro, os irmãos Bolsonaro (Flávio, Eduardo, Carlos e Renan), Luciano Hang, Sóstenes Cavalcante, Sérgio Moro, Magno Malta, Damares Alves, Rogério Marinho, Gustavo Gayer, Delegado Zucco, Ricardo Salles, Bia Kicis, Luiz Philippe de Orléans e Bragança, Marcos Pollon, Carlos Jordy, Zé Trovão, Capitão Derrite, Kim Kataguiri, Marcel Van Hattem, Caroline de Toni, Nikolas Ferreira, Tomé Abduch, Marco Feliciano, Lucas Pavanato, Zoe Martinez, Adrilles Reis Jorge, Kim Paim, Janaína Paschoal, Modesto Carvalhosa, Demóstenes Torres, Marco Angeli, Ives Gandra Martins, Karina Kufa, André Marsiglia, Leandro Ruschel, Fernão Lara Mesquita, Luciano Pires, Allan dos Santos, Augusto Nunes, Ana Paula Henkel, Paulo Figueiredo Filho, Sara Winter, Jorge Moreira, Lobão, Digão, Oswaldo Eustáquio Filho, Antônia Fontenelle, Bruno Musa, Alexandre Garcia, Mário Sabino, Paulo Polzonoff, Luís Ernesto Lacombe, Martim Vasques da Cunha, Francisco Razzo, Danilo Gentili, Diogo Mainardi, Caio Copolla, Luiz Felipe d’Ávila, Felipe Moura Brasil, Marcelo Madureira, Jorge Serrão, Tiago Pavinatto, Rodrigo Constantino, Guilherme Fiuza, Paula Schmitt, Jeffrey Chiquini, Cristina Graeml, Alan Ghani, Emílio Surita, Rogério Morgado, Daniel Zukerman, Bruna Torlay, Roberto Motta, Padre Paulo Ricardo, Padre Gílson, Bernardo Kuster, Gusttavo Lima, Eduardo Costa, Sérgio Reis, Amado Batista, Zezé di Camargo, Fernando & Sorocaba, Edson (da dupla Edson & Hudson), Leonardo, Chitãozinho (da dupla Chitãozinho & Xororó), Rick (da dupla Rick & Renner), Bruno (da dupla Bruno & Marrone), Zé Neto (da dupla Zé Neto & Cristiano), Nivaldo Cordeiro, Percival Puggina, Políbio Braga, Leandro Narloch, Luiz Felipe Pondé, Flávio Morgenstern, Bruno Garschagen, Joaquim Teixeira, Pastor Silas Malafaia e quem mais se apresentar como conservador que se cuidem...

Que se cuidem também Revista Oeste, Revista Crusoé, Brasil Paralelo, Jornal da Cidade Online, O Antagonista, Canal Hipócritas (o Porta dos Fundos conservador), Gazeta do Povo, Jovem Pan News. Terça Livre, de Allan dos Santos, e Alerta Total, de Jorge Serrão, estão fora do ar, censurados pura e simplesmente. O jornalista José Roberto Guzzo, o JR Guzzo, crítico mordaz do Togastão festivo, não precisa mais temer represálias: faleceu no dia 2 de agosto de 2025.

Com as instituições federais totalmente aparelhadas pelo PT durante os últimos vinte anos, incluindo a Polícia Federal e o Petistério Público, e observando as inúmeras maracutaias petistas como Mensalão e Petrolão, até o extraordinário chansonnier Moacyr Franco perdeu a paciência, compondo uma canção-protesto: República Federativa do Bandido.

Vivemos, portanto, um momento revolucionário histórico do direito penal brasileiro: a inauguração de mais uma jabuticaba, a cogitação criminosa. Não é mais necessário executar o ato, nem tentar executá-lo. Basta rascunhar, conversar, pensar em voz alta. O Brasil finalmente se alinha à ficção científica, criminalizando não as ações, mas os pensamentos. George Orwell ficaria orgulhoso: estamos aperfeiçoando o Ministério da Verdade, que ganhou toga para impor respeito e imagens na TV Justiça para transformar uma farsa em espetáculo pedagógico.

Um dia, talvez descubramos que a verdadeira abolição do Estado Democrático de Direito não foi aquela atribuída a um punhado de políticos ingênuos e deslumbrados, mas a que se pratica sorrateiramente em nome da sua defesa. O povo do Brasilistão sonha com a volta de algum resquício de normalidade democrática, não esse fudevu fascista, parido no berçário do Togastão, para implantação de um governo social-populista.

Com o Ogro desfilando como imperador tropical Dom Barba I, está provado que 1964 — o ano que se recusa a virar pó — foi apenas mal coado pelos militares: em vez de expurgar o vírus, deixaram a praga incubada, pronta para florescer em hipocrisia, autoritarismo e deboche.

Assim, o Gárgula de Nove Dedos garguleja do alto do frontispício de sua catedral populista, despejando promessas podres sobre os súditos do Brasilistão. Entorpecidos pelo incenso da mentira, os fiéis seguem dançando sob os vitrais rachados, sem perceber que as portas já foram trancadas por fora. As máscaras agora não caem mais: grudaram à pele como cicatrizes. As luzes ardem até o último estalo, como tochas num funeral coletivo, e as paredes do templo começam a ceder sob o peso da ilusão. 

Quando o teto ruir, não haverá mais fuga, apenas o silêncio de um país sepultado sob os escombros de sua própria orgia, ao som do último riso de pedra do Gárgula. 

Mesmo entre os escombros, sempre há quem procure um novo altar. Da poeira das ruínas há de erguer-se, um dia, uma nova catedral — não feita de pedra, mas de consciência, erguida com o suor dos justos e o pranto dos que aprenderam, enfim, o preço da ilusão. Porque, por mais longa que seja a noite, Luzerna e o Brasil ainda guardam, em algum recanto da alma, a chama teimosa de um amanhecer que não se deixa apagar. 

Obs.: Trecho final do livro MEMORIAL DE LUZERNA, A PÉROLA DO RIO DO PEIXE – Uma saga teuto-brasileira, de minha autoria, finalizado em 10/10/2025, que pode ser baixado em https://felixmaier1950.blogspot.com/2025/10/memorial-de-luzerna-perola-do-rio-do.html.


sexta-feira, 3 de outubro de 2025

MEMORIAL DE LUZERNA, A PÉROLA DO RIO DO PEIXE - Por Félix Maier

Amigos leitores,

Abaixo, link para meu romance-memorialístico sobre Luzerna, uma homenagem aos meus antepassados teuto-brasileiros - avós e pais.

Sugiro baixar no notebook, para facilitar a leitura.

Há inúmeros links no corpo do e-book (vídeos, canções, textos), que não constarão no livro físico a ser impresso.

Se gostou do conteúdo, divulgue à vontade!

Abraços,

Félix Maier

MEMORIAL DE LUZERNA, A PÉROLA DO RIO DO PEIXE

Uma saga teuto-brasileira

Por Félix Maier

https://drive.google.com/file/d/1Py6a1t3tAQZppshia_zphvwor0PkO5YL/view